O presidente Jair Bolsonaro confirmou na noite desta sexta-feira, 28, em entrevista coletiva, que baixou o tom na reunião dos BRICs ao falar sobre a Venezuela. “Nós sabemos que quem decide o futuro do mundo são as potências nucleares, então, da minha parte, não quis polemizar com o senhor (Vladimir) Putin, uma potência nuclear, e tocamos o barco”, justificou Bolsonaro. Um rascunho do discurso do presidente obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo previa uma cobrança pela ajuda dos países do grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul na pressão pela transição de governo na Venezuela, o que seria um recado a russos e chineses. No momento da fala, no entanto, Bolsonaro fez uma breve menção à crise no país vizinho sem pedir apoio para o fim do regime de Nicolás Maduro.
“Foi en passant (menção à Venezuela). Eu estava na presença do nosso presidente da Rússia, está certo? E vi que não era o momento de ser mais agressivo nessa questão”, disse Bolsonaro. “Alguns aviões militares (da Rússia) têm passado pela Venezuela, está bastante complicada a situação, uma presença muito forte de aproximadamente 60 mil cubanos lá dentro. Cuba recebe ainda grande quantidade de petróleo da Venezuela, Hezbollah tem célula lá dentro, tem as milícias, tem um exército cuja cúpula são generais narcotraficantes. Essa série de interesses na Venezuela e tendo em vista a fraqueza de Maduro, temos uma ditadura bastante forte lá. Então eu não atingiria meu objetivo um posicionamento meu nesse sentido”, emendou.
Ainda ao justificar a falta de cobrança de uma posição da Rússia alinhada aos interesses do Grupo de Lima na região, Bolsonaro afirmou que, como presidente, precisa se preocupar com os interesses do Brasil para que uma “venezualização” do País não ocorra no futuro e voltou a criticar a possibilidade de Cristina Kirchner voltar ao poder na Argentina – a ex-presidente é vice em chapa que concorre às eleições neste ano.
Nesta sexta-feira, Bolsonaro falou com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre Venezuela. Um dos tópicos abordados foi a maneira de asfixiar economicamente o regime de Maduro – o que os EUA já vêm tentando fazer através da imposição de sanções. Os dois falaram sobre desidratar economicamente Cuba, um dos países que ainda dá sustentação ao regime chavista.
Bolsonaro disse a jornalistas que seria favorável à imposição de sanções, pelo Brasil, a países que compactuam com Maduro. Ele não deu informações, no entanto, de como o País poderia adotar esse tipo de medida. “Eu tenho minha posição a respeito disso, ouviria não só o ministro das Relações Exteriores bem como o ministro da Defesa e também ouviria o Conselho de Defesa, mas adianto para você, eu seria favorável a isso, mas é a maioria que decide uma medida nesse sentido. Eu, particularmente, concordo com medidas dessa natureza, de embargos contra países que estão alinhados com a Venezuela e não tem qualquer compromisso com a democracia e a liberdade”, afirmou o presidente.
Questionado sobre o motivo de falar em sanções a Cuba e não à Rússia ou China, Bolsonaro afirmou que esse é um “outro nível”. “Tudo tem hierarquia, não vejo chineses dentro da Venezuela, não vejo russos, a não ser alguns punhados de militares lá dentro, e nós sabemos que esses 60 mil cubanos estão lá de maneira parecida como estavam os 10 mil ditos médicos cubanos no Brasil”, disse. A afirmação contraria a análise da Casa Branca, que tem enfatizado que o governo de Maduro só permanece em pé diante do apoio, inclusive com presença de investimentos tropas na região, de chineses e russos.
Grupo de Lima
Bolsonaro faltou ao encontro do Grupo de Lima, bloco de países que se reúnem para fazer pressão pela transição de governo na Venezuela, previsto para acontecer na manhã deste sábado (no horário do Japão), em Osaka, onde os líderes se encontram para a cúpula do G-20.
O presidente substituiu a reunião pela entrevista à imprensa brasileira, convocada para falar da cúpula e do acordo entre União Europeia e Mercosul, fechado nesta sexta-feira (28). Nos bastidores, integrantes do governo comentam que as atitudes do bloco já têm eficácia reduzida, pois não há como endurecer mais o posicionamento contra Nicolás Maduro no campo diplomático – e não está em debate o uso da força. A avaliação é de que, enquanto os militares que dão sustentação ao regime chavista não desertarem, vai ser difícil confiar na transição de governo.