Estadão

Bolsonaro e Lula focam em troca de acusações em debate deixam propostas de lado

A pouco mais de 24 horas do início da votação em segundo turno, o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fizeram na noite desta sexta-feira, 28, o último debate da eleição, na TV Globo. O derradeiro confronto direto entre os presidenciáveis reforçou a temática agressiva da campanha, marcada pela prevalência das acusações mútuas e a carência de propostas. Planos para um futuro governo foram pontuais em discussões que em diversas oportunidades resultou em troca de ofensas.

No primeiro turno, Lula foi o mais votado com 48,4% dos votos. Bolsonaro teve 43,2%. A diferença entre os dois foi de pouco mais de 6,2 milhões de votos. Na maioria das pesquisas de intenção de voto no segundo turno, o petista mantém a liderança por margem apertada.

Os candidatos iniciaram o debate sem trocarem cumprimentos, olhares e visivelmente tensos.

No primeiro bloco, o candidato do PL levantou o tema salário mínimo, que causou desgaste à campanha do presidente no segundo turno. A informação de que o Ministério da Economia pretendia mudar a fórmula de reajuste do salário mínimo e dos benefícios previdenciários, reduzindo o índice de aumentos, foi bastante explorada pela campanha petista na reta final do segundo turno.

Lula acusou o presidente de não dar nenhum aumento real para o piso salarial no Brasil. Bolsonaro prometeu um valor de R$ 1,4 mil para o ano que vem se reeleito. Atualmente, o piso é de R$ 1,212 mil. "Ele fala para influenciar pessoas mais humildes, em especial algumas regiões do Brasil", disse Bolsonaro.

"Parece que meu adversário está descompensado. Ele é um samba de uma nota só", respondeu Lula, ao exaltar os programas de distribuição de renda criados durante os governos petistas. "É uma bobagem comparar o Bolsa Família com o Auxílio Brasil, porque era só um dos programas de distribuição de renda", disse, mencionando outros projetos petistas.

A discussão deslizou para o assunto corrupção, com troca de acusações muitas vezes desconexas e repetitivas. Bolsonaro chegou a chamar Lula de bandido, lembrou as condenações (depois anuladas) do petista na Lava Jato. Lula rebateu citando suspeitas que envolvem a família Bolsonaro na compra de imóveis com dinheiro vivo e rachadinhas.

O ex-presidente também dirigiu ataques ao ex-juiz e atual senador eleito Sérgio Moro (União Brasil), que acompanhava Bolsonaro no debate de ontem e foi responsável por sua prisão. "Fui acusado para permitir que você disputasse as eleições, fui julgado por um juiz mentiroso."

O presidente ironizou a defesa de Lula sobre as condenações na Justiça. "Só foi absolvido se foi pelo (jornalista e mediador do debate) William Bonner", disse o chefe do Executivo. A citação gerou uma manifestação de Bonner, que lembrou que o teor de sua pergunta na sabatina no Jornal Nacional foi com base em decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).

<b>Antigo aliados</b>

Em outro ponto de discussão sem propostas para o País, os dois candidatos citaram o episódio envolvendo o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB), que no domingo passado recebeu agentes da Polícia Federal que foram cumprir mandados de prisão com tiros de fuzil e granadas.

Bolsonaro questionou onde estava José Genonio, José Dirceu, Antonio Palocci, ex-ministros e ex-dirigente do PT, que foram alvo do mensalão e Lava Jato. "Lula, cadê o (Antonio) Palocci, cadê o Zé Dirceu, cadê o (Pedro) Barusco, cadê o Paulo Cesar", questionou o atual presidente. Lula respondeu, citando Jefferson. "Ele acabou de esconder Roberto Jefferson, o pistoleiro dele, o homem que atirou na PF", disse o petista.

"O Roberto Jefferson recebia mala de dinheiro para comprar apoio parlamentar. O Roberto Jefferson explodiu o seu governo com o mensalão. Mais de cem pessoas presas", rebateu Bolsonaro, fazendo referência à denúncia do ex-deputado que deflagrou o escândalo no primeiro mandato de Lula. O tema voltou à tona durante o terceiro bloco do debate, quando o petista voltou a mencionar Jefferson, depois de questionar a política de Bolsonaro sobre o aceso a armas de fogo.

"Porque se fosse um negro de uma favela, você tinha mandado matar. Mas agora, como foi o seu amigo Roberto Jefferson, você fez questão de ficar nervoso e dizer ele é bandido , mas você sabia que ele era, porque era seu amigo", disse o petista, mencionando o ministro da Justiça Anderson Torres, escalado para interceder em meio às negociações para rendição de Jefferson no domingo.

Em determinado, Lula voltou a chamar o ex-presidente Michel Temer (MDB) de "golpista", ao comentar que Bolsonaro herdou do emedebista o último governo. "Ele se esquece que herdou a Presidência do Brasil de um golpista, que foi dado o golpe junto com ele. Não foi da presidente Dilma", afirmou Lula. Temer faz parte do partido da senadora e candidata derrotada no primeiro turno Simone Tebet (MDB), que declarou apoio e se engajou na campanha petista durante as últimas semanas.

No segundo bloco, quando o tema passou a ser respeito pela Constituição, Bolsonaro acusou Lula de apoiar invasões de terra. Depois, de ter apoiado a censura à mídia – ele citou o caso da Jovem Pan, que foi alvo de decisão do Tribunal Superior Eleitoral em razão de ações movidas pela campanha petista. Lula negou a censura. Afirmou que busca a isonomia.

Ao responder à acusação de que incentivava a invasões de terra, Lula disse que defendia a agricultura familiar. O petista, na sequência, leu um trecho de um discurso de Bolsonaro no qual o então deputado defendia pílula de aborto. "O Lula, você é abortista. E defendeu a ideologia de gênero."

No bloco seguinte, o petista criticou a condução da pandemia durante o governo Bolsonaro. "Quando ele foi comprar vacina, São Paulo e vários países do mundo já estavam dando a vacina", mencionou o petista. O chefe do Executivo rebateu a fala criticando os gastos do governo Lula em infraestrutura para a Copa do Mundo. "Médicos pelo Brasil, Connect SUS, incorporamos o Farmácia Popular, ampliamos o teste do pezinho", destacou Bolsonaro, exaltando medidas tomadas pelo governo na área da saúde.

Lula ainda criticou a gestão do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, durante a crise da covid. Bolsonaro se esquivou, afirmando que Pazuello foi o deputado mais votado no Rio de Janeiro. "Então, isso é passado", declarou o chefe do Executivo.

<b>Economia e meio ambiente</b>

No quarto bloco, Bolsonaro rebateu dados de sua gestão na Economia e afirmou que, caso reeleito, o Brasil deve ter crescimento maior do que o da China. "Tudo acertado para decolarmos e a Economia está sendo carro-chefe. Uma das melhores Economia do mundo. Vamos crescer mais do que a China. Temos a inflação menor do que a Europa e Estados Unidos", disse o atual presidente.

Na sequência, Lula afirmou que, caso eleito, irá trabalhar junto de prefeitos e governadores para estabelecer propostas e obras prioritárias de desenvolvimento nas áreas da Saúde e Educação. "Esse é o papel de um Presidente da República. É harmonizar a sociedade, fazer o pacto federativo e trabalhar junto", afirmou. Ao falar sobre o meio ambiente, o ex-presidente questionou Bolsonaro sobre os índices de desmatamento durante o atual governo e foi rebatido pelo candidato do PL , que comparou os números atuais em relação ao do período petista. Lula ainda exaltou medidas de incentivo a energias renováveis durante os governos de seu partido.

No mesmo bloco, o ex-presidente voltou a administrar mal o tempo de resposta e deixou dois minutos para o presidente Jair Bolsonaro falar sozinho. Algo parecido havia ocorrido no último debate entre os dois, promovido pela TV Band, em pool com outros veículos. Na ocasião, Lula deixou cinco minutos para Bolsonaro no último bloco.

Durante as considerações finais, o candidato petista destacou feitos das gestões do partido e pediu para que os eleitores compareçam às urnas. "Eu espero que tenha merecido a sua consideração e peço para você votar no 13", afirmou, fazendo um aceno a eleitores indecisos e possíveis abstenções, que podem decidir o resultado do pleito no próximo domingo.

Já Bolsonaro mencionou temas ideológicos, como liberdade, aborto e liberação de drogas, além de mencionar o atentado que sofreu durante a disputa à Presidência em 2018. "Tenho certeza que no próximo domingo venceremos as eleições, vamos lá, o Brasil é nosso, até a vitória", afirmou, sem mencionar o número 22, sigla do partido.

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