Um dia após adotar um discurso mais ameno em relação à pandemia do coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro voltou a subir o tom contra governadores e prefeitos no Twitter, criticando medidas restritivas para comércio e circulação de pessoas. Bolsonaro publicou um vídeo de um homem que apontava o desabastecimento no Ceasa, em Belo Horizonte, dizendo que "a culpa é dos governadores", que, segundo ele, querem "ganhar nome e projeção política a custa do sofrimento da população."
"Não é um desentendimento entre o Presidente e ALGUNS governadores e ALGUNS prefeitos. São fatos e realidades que devem ser mostradas. Depois da destruição não interessa mostrar culpados", escreveu Bolsonaro.
A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, tem afirmado que não há risco de desabastecimento. O ministro Tarcísio de Freitas, da Infraestrutura, disse na Segunda-feira (30) que a logística e o abastecimento estão funcionando.
No vídeo, gravado na terça-feira, 31, o homem saiu em defesa do presidente. "Quem não tem dinheiro passa fome. Mas quem tem dinheiro mas não tem o que comprar também passa fome. E não vamos esquecer não, a culpa disso aqui é dos governadores, viu?", afirmou, mostrando imagens de um galpão quase vazio. "O presidente da República tá brigando incessantemente para que haja uma paralisação responsável. Não paralisar todos os setores, quem não é do grupo de risco voltar a trabalhar, ok?"
Desde a semana passada, Bolsonaro tem feito críticas a governadores e prefeitos que adotaram medidas como fechamento de escolas, comércio e shoppings. O argumento do presidente é de que os efeitos na economia da redução de circulação de pessoas pode causar danos maiores que a doença em si.
As restrições impostas nos Estados, porém, seguem orientação da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do próprio Ministério da Saúde para estimular o isolamento social, considerado a forma mais eficaz de se evitar a propagação do vírus.
Sob pressão de seus ministros mais próximos, Bolsonaro baixou o tom nesta terça em pronunciamento em cadeia nacional de TV e rádio e colocou a preocupação com a "vida" no mesmo patamar que o "emprego". Pediu, ainda, a união do Parlamento, Judiciário, governadores e prefeitos para enfrentar a pandemia. Diferentemente do pronunciamento feito na semana passada, porém, Bolsonaro não defendeu explicitamente o fim do isolamento social.
O discurso anterior em cadeia nacional de rádio e televisão, que foi ao ar há uma semana, teve a participação na elaboração do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente, e foi considerado um "desastre" pelos principais auxiliares do governo. Na ocasião, Bolsonaro chamou a covid-19 de "gripezinha" e defendeu que as pessoas voltassem à "normalidade" em suas rotinas.
Como revelou o jornal <b>O Estado de S. Paulo</b>, a mudança no tom no mesmo dia em que Carlos Bolsonaro ganhou uma sala no terceiro andar no Planalto foi considerada uma vitória para os auxiliares da ala mais moderada.
Apesar disso, este grupo receia que a virulência nas redes seguirá sob o comando de Carlos, considerado o mais radical dos filhos do presidente. O vereador é o responsável pelo chamado "gabinete do ódio", que controla os perfis do presidente na internet, e tem estado presente em reuniões sobre a covid-19.