Quem se liga em tênis sabe tudo sobre aquela final em Wimbledon – o sueco Bjorn Borg disputava seu quinto título, mas o norte-americano John McEnroe estava melhor na fita. Foram cinco match points e a vitória no tie break e, assim mesmo, McEnroe não chegou lá. Para o público que já transformou o filme em cartaz num sucesso, a pergunta inevitável é – como fazer suspense sobre um desfecho conhecido?
Há controvérsia, claro, mas Borg Vs. McEnroe é um dos grandes filmes recentes sobre esporte, e não apenas tênis. Para cinéfilos, a rivalidade entre o sueco e o norte-americano talvez faça lembrar a traçada em Rush – No Limite da Emoção, de Ron Howard. O inglês James Hunt e o austríaco Niki Lauda fazendo história nas pistas da Fórmula 1. À maneira de McEnroe e Borg, eram fogo e gelo. Hunt, o hedonista, interpretado por Chris Hemsworth. Lauda, o racional, Daniel Bruhl. Howard, um diretor comercial de sucesso, é um grande realizador e eventualmente um autor. Seus dois filmes com o astro de Thor – o outro é No Coração do Mar – são os maiores de sua carreira e, em ambos, Howard reencena o embate clássico entre John Wayne e James Stewart na obra-prima de John Ford, O Homem Que Matou o Facínora.
Janus Metz é o diretor de Borg Vs. McEnroe e ele embasa seu suspense num estudo de personagens. Borg, na infância, era um menino rebelde. Foi resgatado por seu instrutor, Lennart Bergelin. McEnroe era um geniozinho da matemática, mas dá para sentir a pressão que sofre do pai. Podem o gelo e o fogo se equiparar? Na versão de Metz, sim. Borg faz um pacto com seu mentor. Por dentro, ele pode estar ardendo, se consumindo, mas aprende a se controlar. O vulcão torna-se gelado. McEnroe, inversamente, exterioriza tudo – tudo o que McEnroe contém. Essa história é muito bem conduzida e interpretada, de ambos os lados. É o que permite a Metz construir o suspense.
Borg é competitivo. Quer ser o melhor – quer o quinto título. As provocações de McEnroe o desestabilizam e, pela primeira vez, ele perde o (auto) controle na quadra. Começa a errar, a entregar o jogo. Um, dois, quatro, cinco match points de mão beijada para o oponente. Entre o público, a noiva e o instrutor veem o grande Borg desmoronar. Tudo isso cria a tensão. O suspense vem com a virada, quando Borg, de novo, passa a controlar suas emoções. A partir daí, Metz é senhor da sua narrativa e faz um grande filme – emocionante.
Mas ele deve muito a seus atores. Sverrir Gudnason pode ter sido escolhido por sua semelhança com Borg, mas ele tem também possui o temperamento. Shia LaBeouf não se assemelha em nada ao biografado, mas você vai jurar que ele nasceu para fazer esse papel. Nos últimos anos, Shia se transformou num dos mais controvertidos atores de Hollywood. O imprevisível. Suas coletivas são sempre tensas, porque ele responde às provocações com agressão – como McEnroe. A coletiva do personagem anterior ao grande jogo é decisiva – “Podemos voltar ao jogo?”, cobra McEnroe. A imprensa o acua. É McEnroe ou é o próprio Shia LaBeouf.
Em princípio, o tênis não parece um esporte muito cinematográfico. Bolas para lá, para cá. Alfred Hitchcock, no clássico Pacto Sinistro, fez a filmagem que parece definitiva. O olhar do público segue a bola. Lá e cá. Bate e volta. O único que não segue o ritmo é… o assassino! Janus Metz reencena a final de Wimbledon com brilho. Um suspense infernal. Como o instrutor de Borg, Stellan Skarsgaard pode até não ser indicado para o Oscar de coadjuvante, mas não só deveria ser como teria de ganhar. É genial.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.