Economia

Brasil precisa de menos Estado e mais livre economia, diz presidente do Boticário

A única forma de o Brasil entrar no caminho do crescimento econômico de longo prazo é com reformas estruturais e com a redução do tamanho do Estado, afirma o presidente do Grupo Boticário, Artur Grynbaum. Com 3.760 lojas, a rede é a maior operação de franquia do País.

Segundo o empresário, caso venha a assumir o governo na próxima semana, o vice-presidente Michel Temer precisa dar um recado rápido para os consumidores: a de que ele assume o cargo para dar novo rumo à economia. Nesse contexto, Grynbaum avalia que o ajuste das contas governamentais é essencial. “Meu desejo é que esse ajuste venha com o viés de enxugamento de despesas, e não com alta de impostos, como feito até agora.”

A seguir, os principais trechos da entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.

Estamos diante de uma provável mudança de governo na próxima semana. O sr. vê alguma chance de recuperação na economia em 2017?

Acho que pode ter alguma melhora, mas a mudança de verdade só vem em 2018. Agora, com a troca, há uma retomada da expectativa de que algo de diferente aconteça na economia. Isso traz um novo ar, para que as pessoas e as empresas retomem seus planos e olhem de forma mais produtiva para o futuro. Mas acho que a mudança de agora ainda não traz um novo ambiente de negócios. Ainda assim, ela já será benéfica para trazer esse ar mais fresco sobre o futuro.

O sr. sempre defendeu o ajuste das contas do governo. Ele continua a ser importante?

O ajuste fiscal é essencial para que algo aconteça na economia. Meu desejo é que esse ajuste venha pelo viés do enxugamento de despesas, e não com o aumento de impostos, como feito até agora. E o argumento era de que a alta de tributos era a única solução. Aumentar impostos só serve como um ajuste de curtíssimo prazo, não traz benefícios perenes. Todo o empresariado quer uma contrapartida importante do ponto de vista do corte de despesas do governo. E parece que o plano dele (Michel Temer) é olhar para as despesas públicas de maneira mais intensa.

Qual sua opinião sobre o documento “Uma Ponte para o Futuro”, que representa o ideário do PMDB para a economia?

Gosto muito da ideia de um Estado menor. Acho que não deve ser uma solução só para este momento, mas uma linha de pensamento para o futuro, no longo prazo. A verdade é: o mercado se ajusta. Sempre vai haver uma pessoa querendo comprar e outra querendo vender. Já se foi o tempo em que o Estado precisava intervir e estabelecer proteção para uma série de setores. Tivemos exemplos recentes de intervenções do Estado que não tiveram êxito. O Brasil precisa de menos Estado e de mais livre economia.

O que o sr. acha da estratégia adotada pelo governo do PT, que elegeu setores para receber benefícios pontuais?

Acho que ficou provado que essas benesses individualizadas não ajudam a economia. Mais uma vez, trata-se de uma solução de efeito de curto prazo: você consegue alívio, algum fôlego adicional, mas não estabelece condições estruturais de crescimento e desenvolvimento. É preciso entender que a maneira mais efetiva de gerar riqueza é com a criação de oportunidades, de empregos. Só assim o desenvolvimento se perpetuará.

Os empresários ainda pedem incentivos ao governo. Em sua opinião, qual é a melhor alavanca para o consumo?

Sem dúvida, são dois fatores: o emprego e a segurança que a pessoa tem de que vai continuar a ter um trabalho. Hoje, o humor do País está muito ruim, pois há uma massa de más notícias. Mas o fato é: as pessoas continuam levantando, tomando café, tomando banho e se vestindo. Só aí são movimentados alguns setores da economia: vestuário, alimentação e higiene. Então, embora haja uma retração atual por causa do ambiente econômico, um indicador de mudança pode induzir algumas melhorias.

Caso Temer venha mesmo a assumir, ele precisa agir rápido para que esse humor mude?

O cenário precisa mudar primeiro para o humor mudar depois. Uma coisa é decorrência da outra. É necessário que se criem condições para dar uma sinalização para a sociedade de que o País vai buscar as correções que são necessárias.

Ajuda agora o fato de que Temer está, pelo menos no discurso, realmente comprometido com o ajuste fiscal?

Ajuda muito. Pelo menos tudo agora está apontando na mesma direção.

Além do ajuste, há reformas estruturais que há muito tempo são adiadas. O País pode ter crescimento sustentável sem elas?

Essas reformas precisam acontecer, e a gente se pergunta quando elas vão acontecer. Elas só vão ser feitas quando todo mundo se conscientizar de que se trata de uma questão de sobrevivência do Brasil. Eu posso até ser contra algumas coisas aqui na empresa, do ponto de vista pessoal. Mas, se eu entendo que é bom para a empresa, vou fazer. Vale o mesmo para o País.

E quais as reformas o sr. vê como necessárias?

Há vários pontos a serem alterados. Há a flexibilização das leis do trabalho, para dar mais oportunidades às pessoas. Tem a questão tributária, pois hoje existe um aumento de carga, tanto federal quanto estadual. É só olhar nossa vizinha, a Argentina, e entender que dá para mudar isso – e rápido. O presidente argentino (Mauricio Macri) chegou a diminuir impostos para que a economia girasse mais rapidamente. Então, são três pilares: melhorar as condições trabalhistas, a carga tributária e readequar o tamanho da máquina do Estado.

O brasileiro passou por um período em que consumiu muito, talvez até de forma excessiva, segundo economistas. Agora, mesmo que a crise seja superada, passaremos a viver uma nova realidade?

Eu não acho que foi (excessivo). O brasileiro assumiu níveis de endividamento considerados saudáveis em outras economias. Mas está claro que só estimular o consumo via crédito não dá mais, já conquistamos espaço considerável com essa ferramenta. Não adianta fazer isso agora, porque não vai fazer sentido para as pessoas num momento em que elas estão preocupadas se vão ter ou não emprego. É por isso que precisamos de boas cabeças no Ministério da Fazenda, para que a gente ache outras alternativas para estimular o consumo. E o melhor estímulo é fazer a economia girar, criar oportunidades.

Hoje, o Brasil vive uma das maiores recessões da história. Em seus 39 anos, há quanto tempo o Grupo Boticário não registrava queda nas vendas?

Vamos deixar uma coisa clara: nós tivemos uma queda, neste primeiro trimestre, em volume, mas vamos continuar a brigar para ficarmos no terreno positivo em valor financeiro. Temos crescido acima do mercado. No ano passado, avançamos 8,8% em um mercado que caiu 6%. Foi um excelente resultado.

O setor de cosméticos teve queda no ano passado. Se a economia se recuperar, ele acaba voltando mais rápido?

Se houver uma melhora de renda disponível, sim. Hoje, por mais que estejamos em crise, há uma cesta básica de cosméticos que as pessoas não vão deixar de comprar. Ninguém hoje sai mais de casa sem desodorante, toda mulher quer usar batom. Não são mais itens supérfluos. E o cosmético também tem o papel de melhorar, com um desembolso relativamente pequeno, a autoestima das pessoas. É o que as pessoas chamam do “efeito batom”, com o qual a gente estava contando este ano. Mas nem ele aconteceu.

Com a crise, há notícias de que o Grupo Boticário tenha assumido pelo menos três operações de franqueados, no Rio, em São Paulo e em Minas Gerais. A crise tem tido um efeito sobre esses empreendedores?

A rede O Boticário é grande, mas é formada por pequenos negócios. Com os nossos parceiros, a gente sempre tenta ter o foco na atuação deles à frente do negócio, de sua responsabilidade na gestão. Esses três casos são tópicos em um universo de 900 parceiros.

Quais são as pressões que a crise econômica exerce sobre os franqueados?

Os franqueados vivem certas pressões, como a alta do custo com aluguel e mão de obra. Elas existem, mas é possível adequá-las dentro do nosso modelo. Geralmente, quando você tem uma operação que não funciona bem, existe uma mistura de caixas. Isso pode significar uma mistura do caixa da franquia com as contas pessoais do franqueado ou com outro negócio que ele mantenha. Há também o distanciamento do dono da franquia do dia a dia do negócio. Nós sempre recomendamos que o franqueado esteja à frente da gestão do caixa, do estoque, da equipe. Se pregamos isso mesmo em momentos bons, imagine agora.

Ou seja: não é meta do grupo assumir lojas e ter mais unidades próprias?

Pelo contrário. Hoje, temos 3.760 lojas e só cerca de 240 são próprias.

Hoje, o Brasil ainda vive uma espécie de limbo econômico, onde não se sabe exatamente o que vai acontecer. Nesse cenário, como a empresa mantém a equipe motivada?

Nós tentamos ser claros com nossos colaboradores. Sempre fazemos ajustes, mas não houve necessidade de grandes cortes. Apesar do repertório de notícias ruins atualmente, somos uma empresa de 39 anos que está crescendo, apesar de tudo. Temos confiança de que continuaremos a saber lidar com as dificuldades. Independentemente da situação externa, temos de fazer a lição de casa, que é estar perto do nosso consumidor, dos franqueados e das revendedoras (da operação de venda direta).

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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