Variedades

Bruxas: mas que elas existem, existem

Bem diferente dos contos de fadas que povoaram nossa imaginação nos tempos de crianças, as bruxas do terceiro milênio mantêm viva uma tradição que se sustenta há séculos

Três asas de morcego, um punhado de pó de chifre de veado, um olho de salamandra, duas patas de aranha, quatro dedos de um morto, uma barriga de sapo, rabo de escorpião, patas de urubu, fibras de coração de dragão e cabelos à vontade.  Estes ingredientes tão difundidos nos contos infantis como os mais utilizados pelas bruxas para preparar poções mágicas, geralmente voltadas para o mal, são coisas do passado.

Hoje, as novas bruxas não são verdes, muito menos têm verruga no nariz e nem voam de vassouras. Elas são bonitas, empresárias ou profissionais liberais, usam computadores e cultuam, no dia-a-dia, a tradição secular da Wicca (lê-se Uica) e da Bruxaria Tradicional.

Em São Paulo, são encontradas por todos os cantos. Durante o dia, passam despercebidas, mas nas noites de reuniões e rituais se transformam com suas roupas escuras com capuzes e pinturas sombrias nas faces. Estão sempre rodeadas de incensos, velas e símbolos mágicos, como o pentagrama, o caldeirão e a vassoura.

"As bruxas do século 21 não são como mostra a literatura; elas são bonitas e independentes e seu papel é entender os problemas das pessoas e usar as energias da natureza para trazer o bem-estar a quem nos procura", explicou Wind, nome mágico de Márcia Sanção, de 46 anos, há 23 na Wicca (antiga religião dos celtas – povos que dominaram o oeste da Europa no primeiro milênio antes de Cristo).

Wind, que mantém o espaço Templo de Bruxas, uma escola de bruxaria na Penha, zona leste de São Paulo, explicou que a bruxaria se modernizou, mas o ritual é secular – as bruxas continuam fazendo poções e utilizando ervas, velas, frutas, cajados, adagas, vassoura e o caldeirão. Aliás, uma bruxa sem caldeirão não convence.

Na Bruxaria Natural, considerada pelos seus adeptos como a forma mais antiga de cultuar a natureza, "o grande lance é você estar bem consigo mesma", enfatizou a bruxa Athena, nome ritualístico de Meya Leme da Silva, 47. Segundo ela, o maior pecado de um bruxo é não ser feliz.

"As bruxas mantêm a sensualidade como a sua maior característica. E ser sensual é estar de bem com a vida, com o próprio corpo. Dentro da bruxaria não existe nenhum tipo de preconceito, seja social, sexual ou racial", completou Luciana Farias, 33, a bruxa Inanna, que faz parte do Espaço Despertar.

As reuniões das bruxas, geralmente, são semanais. Antes do ritual, é aberto um círculo de energia, fechado no término. Neste círculo, a vassoura – cujo cabo representa a figura masculina e a parte aberta, a figura feminina – é a porta de entrada e saída.

A Revista Free São Paulo participou de duas destas reuniões e conheceu mulheres que, utilizando a bruxaria como filosofia de vida ou como religião, têm um só objetivo: ser feliz, respeitando o próximo e a natureza.

Serviço:
Templo de Bruxas
Telefones: (11) 2849-9643 e 3422-1061
www.templodebruxas.com.br
 

Espaço Despertar
Telefone: (11) 2843-9546
www.espacodespertar.com.br
www.magiaemsuavida.blogspot.com

O ritual das sacerdotisas

Treze sacerdotisas, todas de preto, com capuzes, foram consagradas pelo Templo de Bruxas após três anos de estudos. Elas sabem que a egrégora (energia) do nome "bruxa" é muito forte e carregada de preconceito. Por este motivo, algumas delas pediram para não ser identificadas e nem fotografadas por conta de suas atividades no dia-a-dia, como a bruxa Zathtz, de 48 anos, bióloga e professora de uma tradicional escola católica de São Paulo.

Durante o curso de bruxaria, as futuras sacerdotisas estudam a Wicca (que no Brasil ainda não é reconhecida como religião), as magias, os rituais, as poções e, inclusive, o hebraico. Alias, é do hebraico que surgem os seus nomes mágicos, por meio da cabala.

Depois de formadas, elas passam a formar um Coven, também conhecido como Conciliábulo, nome dado a um grupo de bruxas ou bruxos, que se unem num laço mágico, físico e emocional, sob o objetivo de louvar a deusa e o deus, tendo em comum um juramento de fidelidade à arte e ao grupo.

Masephack tem 39 anos. Disse que, no dia-a-dia, os ensinamentos da bruxaria lhe ajudam a manter o equilíbrio dos sentimentos e ações. "Temos maior discernimento do que é certo ou errado. Nossa grande luta é atingir o equilíbrio e aprendermos a controlar os sentimentos negativos", explicou. Já Kora, 40, sabe que sua missão como bruxa está somente começando. "Vamos desmistificar a bruxaria, tão deturpada por histórias fantasiosas".

Bruxa até no sobrenome

A empresária Luciana Custódio, 37, uma das novas sacerdotisas, já incorporou o nome ritualístico Thadaph até no sobrenome. Em seu cartão de visita está escrito Luciana Thadaph. "Hoje, no meu cotidiano, todos sabem que estão lidando com uma bruxa. Aliás, ninguém paga minhas contas", afirmou bem-humorada.

Ao se iniciar na bruxaria, a funcionária de uma empresa de telefonia, Verônica Santos, 37, recebeu o nome mágico de Khoka. Ela entrou na Wicca após viver um momento conturbado na vida. "Passei então por uma busca interior e hoje estou muito feliz", afirmou.

A analista documental Soraya Sá, 44, é a bruxa Mamabashitz. Está na Wicca há três anos e garantiu que a religião lhe trouxe muito mais liberdade, com responsabilidade dos seus anos.

Poções e seus ingredientes

As bruxas mais tradicionais mantêm um "dicionário secreto" quase nunca utilizado nos dias atuais. Na verdade, era uma forma de burlar a Santa Inquisição, na Idade Média, e evitar que mais bruxas fossem queimadas vivas. No dicionário continha códigos secretos, geralmente passados de mãe para filha.

"Por exemplo, tínhamos os cabelos de dama, que nada mais eram que a erva-cidreira", explicou Márcia Sanção, a Wind. "As tão famosas asas de morcego são, simplesmente, as folhas de louros. Aí, enganávamos muita gente", disse Athena, da Bruxaria Natural.

As poções são misturas de ervas e são sempre preparadas de acordo com a fase da lua. As poções são utilizadas para banhos, lavar a casa, entre outras utilidades. Elas podem ser de sedução, de limpeza, de prosperidade, do amor etc.

Código secreto

Asa de morcego – folha de louro
Olho de coruja – pimenta do reino
Coração de boi – tomate
Barriga de sapo – pepino
Gordura de criança não batizada – toucinho de porco
Rabo de escorpião – salsa ou coentro
Sangue de moça virgem – vinho tinto
Unhas de pé – amêndoas
Ovas de sapo – ervilha
Terra de túmulo – chocolate
Ossos moídos – farinha de trigo
Teia de aranha – algodão doce
Lágrimas de moça – cebola
Beijo de sereia – sal
Olho de agamotto – cravo da índia
Patas de urubu – mandioca
Pernas de aranha – alecrim
Dedos de mortos – orquídea

A temível Lei Tríplice

As bruxas não são do mal, muito menos "comem" criancinhas. Todas elas, as mais remotas e as atuais temem a Lei Tríplice, onde tudo o que se faz volta três vezes para você, e nesta encarnação. "O que existe é o propósito do que você faz. Respeitamos muito o livre arbítrio de cada uma", afirmou Wind.

"Não podemos sacrificar animais, temos a obrigação de respeitar a natureza e não fazemos nada que prejudique alguém ou algo, pois isso retorna três vezes mais", assegurou Athena, da Bruxaria Natural.

"O poder está dentro de cada um de nós"

Não raro, alguém procura a Bruxaria Natural para aprender a ter poder e para fazer magias. "Pouca gente sabe que o poder está dentro de cada um de nós, que, a partir de nós próprias, podemos mudar o mundo para melhor. Este é o verdadeiro poder", explicou Ana Paula Santoro, 27, a bruxa Freya. "Ser mago ou bruxa é ter o destino nas próprias mãos", filosofou Athenas, apoiada pelo colega bruxa Neftis.

As bruxas também se casam e, ano a ano, fortalecem o laço. "É um tipo de renovação feita todos os anos", explicou Inanna. A cerimônia pagã de casamento dos bruxos é conhecida como handfasting.

Bruxas vão realizar o Beltane em maio 

As bruxas acreditam na roda do ano, que se inicia no dia 21 de dezembro com o nascimento do deus. Este período é chamado de Yule, o Ano Novo. Em fevereiro tem início o Imbolc, quando o deus tem uma ligação mais forte com a deusa. No hemisfério norte é quando a terra está se recuperando do inverno, e o Sol se fortalecendo para a primavera.

No período de Páscoa o jovem deus está apaixonado pela deusa e, em maio, período chamado de Beltane, os dois se casam. "É um momento de muita fertilidade", explicou Athenas.

E será neste período que será realizado, em uma chácara em Ibiúna, interior paulista, o Festival de Beltane – Trilhando o Caminho do Sagrado, evento organizado pelas bruxas da Bruxaria Natural.

"Nos dias 18 a 20 de maio teremos palestras, oficinas de máscaras, dança do Sol, jogos, brincadeiras, celebrações, cozinha mágica e até o Mastro de Bel, que seria o falo do deus", explicou Inanna. Informações sobre o festival, raramente realizado no Brasil, no http://www.magiaemsuavida.blogspot.com/ ou no telefone 2843-9546.

Aprenda a fazer o vinho do amor 

O Vinho de Beltane é também chamado de o "vinho do amor".  É uma receita milenar das bruxas para conquistar os bruxos.

Ingredientes

1 garrafa de vinho suave tinto
1 maçã bem vermelha
3 morangos
1 pau de canela
1 colher chá  de mel
1 rosa vermelha (apenas as pétalas)
10 sementes de cardamomo

Modo de preparo

Higienize a maçã, os morangos e as pétalas de rosa. Esmague o cardamomo de forma que as sementes possam sair do invólucro. Parta a maçã em 4 pedaços, retire as sementes e o cabo e coloque em  um recipiente onde você possa fechar  bem depois. Junte os morangos inteiros, o pau de canela, a colher de mel, as pétalas de rosa e o cardamomo. Finalize jogando o vinho por cima. Feche bem, Leve à geladeira e espere por pelo  menos 3 dias até  tomar o primeiro cálice. Faça isso na lua cheia.

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