Setenta e cinco anos nesta segunda-feira, 7. Caetano Veloso chega à marca da serenidade com projetos que incluem a família e uma revisão e ampliação das próprias percepções da história que testemunhou e ajudou a escrever. O primeiro refere-se a uma volta aos palcos, agora, em conjunto com seus três filhos, Moreno (44 anos), Zeca (25) e Tom (20). Foi a mulher Paula Lavigne quem deu a informação em seu Twitter. O segundo diz respeito ao relançamento, 20 anos depois, do livro Verdade Tropical. Caetano amplia o conteúdo, esticando-o de 1997 até os dias atuais.
Caetano foi tema, este ano, de uma biografia. Não autorizado, embora o artista estivesse ciente o tempo todo de sua feitura, o livro é uma pesquisa profunda, feita por mais de 10 anos pelos autores Carlos Eduardo Drummond e Marcio Nolasco. O artista não se opôs a nenhuma das informações do livro, mas o atacou com uma frase constrangedora aos autores: segundo seu entendimento, ele seria de “baixa qualidade literária”.
Ele poderia também agradecer uma leitura possível de ser feita nessas páginas. Sua formação de abrangência elástica e diálogo entre mundos se dá primeiro com os filmes franceses e italianos exibidos nos cinemas de Santo Amaro da Purificação, com a aproximação das artes plásticas e, só então, com a música. Centrifugada por um pensamento de inquietudes, esta combinação lhe garantiu uma vantajosa condição para a criação assim que o artista se viu pronto para devolver ao mundo tudo aquilo que colheu.
O espírito tropicalista pode ser melhor definido em Caetano. Ao contrário dos especialistas, os entendidos que gostam de separar o que serve do que não serve para entrar pelos ouvidos humanos, esses tropicalistas costumam enxergar verdades e qualidades mesmo nas manifestações descartadas pela academia como mundanas. Nós, imprensa, gostamos de dizer que eles só fazem isso para rejuvenescer suas plateias e reafirmar suas condições cardeais, abençoando a nova era. São tolices das quais precisamos pedir perdão.
A diferença de um especialista para um tropicalista está no conceito do que é “bom”. O especialista parte do pensamento da comparação para reforçar seus valores. John Cage é música, Michel Teló não é. O tropicalista não elimina uns para a existência de outros, e essa não é prerrogativa criativa de um movimento musical, mas uma lição de vida. Gil, Tom Zé, Jorge Mautner e Caetano Veloso são assim. Luiz Melodia era assim. Caetano deve à sua formação multidisciplinar o fato de poder cantar Peninha com o mesmo interesse com que grava Cole Porter. A verdade existe nos dois.
No dia de seus 75 anos, separamos algumas das frases de destaque ditas por Caetano Veloso em entrevistas ou músicas:
1 “Eu nunca fui a nenhum país comunista, nem mesmo a Cuba, por no fundo ter uma dificuldade natural de aceitar a ideia de que um país possa ter um jornal só e que esse jornal pertença ao governo. Isso para mim é uma coisa intolerável”, Caetano no Roda Viva, em 1997.
2. “Se nós tivéssemos talvez chegados ao socialismo, não me interessa tanto saber o que o socialismo faria de nós, mas o que o Brasil faria do socialismo” (ao mesmo Roda Viva)
3. “Minha mãe me deu ao mundo de maneira singular me dizendo uma sentença: pra eu sempre pedir licença, mas nunca deixar entrar” (na música Tudo de Novo)
4. “Às vezes, a separação é a única confirmação possível daquilo que é mais valioso numa união”, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo
5. “O tempo não para e no entanto ele nunca envelhece” (em Força Estranha)
6. “Enquanto os homens exercem seus podres poderes, morrer e matar de fome, de raiva e de sede são tantas vezes gestos naturais” (em Podres Poderes)
7. “Você diz a verdade, a verdade é o seu dom de iludir. Como pode querer que a mulher vá viver sem mentir” (em Dom de Iludir)
8. “O bispo Macedo pode ter várias mansões e um jato maior do que o de Roberto Marinho, o que eu já constatei de perto, mas a maioria esmagadora dos fiéis é cuidadosa, honesta, organizada e trabalhadora” (em entrevista ao Estadão)
9. “Música é bom e eu gostaria de ter mais talento só para aumentar o prazer. Muitas vezes, percebo a imensidão do prazer de Djavan, de Milton, de Guinga” (em entrevista ao Estadão)
10. “Adoro quem é antirreligioso convicto, como Antônio Cícero. E também as pessoas que, tendo sido criadas sem religião, não sentem nem necessidade disso nem atração por isso. Mas não é o meu caso. Tendo a ser supersticioso. Mas não respeito muito as minhas próprias superstições” (em entrevista ao jornal A Tarde, de 2014)
11. “Os anos 1970 foram para mim um período com canções que se tornaram sucesso, algumas até tardiamente. Quando surgiu, Terra não tocava no rádio porque era longa e alguns diziam ser chata. Sampa não tocava quando saiu. Leãozinho é chavão de canção querida, mas teve muita reação contrária. Odara teve mais ainda. Elis Regina ridicularizou a música Gente, por decisão dos diretores do show que ela fazia, mas ela me pediu desculpas”, em entrevista ao Estadão, em 2012
12. “Você quer que alguma coisa me enerve? Sabe que há um tempo um cara de um outro jornal chegou com um negócio escrito em um telex, em Salvador, no verão, enquanto eu lhe dava uma entrevista com uma preguiça, uma calma. E ele tentando tudo para me deixar nervoso. Depois, ele me mostrou o telex e disse: Olha aqui o que me mandaram da redação: “Tentar irritá-lo ao máximo.”, na mesma entrevista, ao Estadão
13. “O funk carioca e sertanejo universitário são a nova Tropicália”, em entrevista à rádio londrina BBC.