Marina Person começou a fazer as primeiras anotações para o que virou Califórnia, seu longa de ficção que estreou nesta quinta, 3, em 2004. Há 11 anos… “Pegava meu caderninho e ia anotando tudo. Conversava com amigas de escola. Duas foram muito importantes no processo de resgatar histórias que haviam acontecido com a gente, ou com pessoas que conhecíamos.” O objetivo nunca foi fazer um filme autobiográfico. “Se fosse, teria de mudar o título. Sonhava com Londres, não com a Califórnia.”
Em 2006/2007, o roteiro ficou pronto e ela iniciou a captação. O orçamento ideal era de R$ 3,5 milhões, mas numa primeira etapa ela conseguiu menos que a metade. Não conseguiu mais nada. Em 2012, com seus parceiros produtores, desistiu de tentar captar mais. “Adequamos o roteiro ao dinheiro que tínhamos. Queria filmar de qualquer jeito.” Por que um filme sobre a adolescência? “A minha foi muito difícil, sofrida. Ao mesmo tempo, foi um período incrível da própria vida brasileira. Havia o movimento por Diretas-Já. Pertenço a uma geração que identificava a figura do presidente com os militares. Com as diretas e a promessa de redemocratização, houve uma revitalização da cena rock. Titãs, Paralamas, o rock como protesto. Vivi tudo isso intensamente, e queria que viesse para o filme.”
Pessoal, mas não autobiográfico. “Nunca tive um tio aidético, mas pertenço a uma geração que descobriu o sexo com essa carga. Ao mesmo tempo que queríamos a liberdade, e a liberdade do sexo, era preciso puxar o freio de mão. Só conheci gente que morreu de aids muito tempo depois. A doença era discriminatória, associada à promiscuidade. As pessoas, e as famílias, tinham vergonha de assumir.” Há todo esse lado, digamos, ficcional em Califórnia, mas há também o fundo de verdade. “Era louca pelo rock londrino, punk. Amava o Cure. Mas o meu preferido, como o da Estela (protagonista do filme), era o David Bowie. O quarto dela é inspirado no meu quarto. E eu também gostava daquele tipo de garoto por quem ela é atraída no filme. Misteriosos, delicados. O MP é uma soma de vários garotos que conheci e também uma idealização.”
Califórnia estreia em 18 salas de São Paulo, Rio, Brasília, Curitiba e Porto Alegre. “Sempre tive claro que queria fazer um filme sobre adolescentes, não para adolescentes. E quando me perguntam para quem fiz o filme, tenho a maior dificuldade para responder. Sou quase egoísta. Acho que fiz para mim. Mas tenho tido uma resposta boa. Califórnia recebeu o prêmio de melhor ator coadjuvante no Festival do Rio (para Caio Horowicz). Clara Gallo, que faz Estela, foi melhor atriz no Mix Brasil. Pessoas que viveram os anos 1980 vieram me dizer que gostaram. Outros que só ouviram falar também gostaram. Fui fiel a detalhes importantes, como a trilha da época, mas creio que a força de Califórnia independe do período. As questões essenciais da juventude (“Quem sou? Qual o meu lugar no mundo?) são perenes, não mudam tanto conforme a geração.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.