A Câmara rejeitou na noite desta segunda feira ontem alterações feitas pelo Senado na chamada “lei da biodiversidade” que protegeriam povos indígenas e populações tradicionais como quilombolas e ribeirinhos. Segundo ruralistas, as rejeições protegem cadeias produtivas nacionais. O texto que segue para sanção da presidente Dilma Rousseff facilita o acesso de empresas e pesquisadores ao patrimônio genético brasileiro, beneficiando principalmente as indústrias farmacêuticas e de cosméticos.
O principal objetivo do projeto é “desafogar” o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente que concentra os pedidos para que pesquisadores façam estudos com material genético nacional. A “lei da biodiversidade” cria um banco nacional de registros para pesquisas que dependam de extração de recursos genéticos. Mas, para agilizar o processo, os estudos sem fins comerciais deixam de depender do aval do CGen, sendo necessário apenas um cadastro no Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação.
O Senado havia ampliado a lista de elementos agregadores de valor ao produto final sujeitos à tributação. A Câmara restabeleceu a palavra “principal”. Ou seja, apenas o principal elemento do produto será taxado. Por exemplo, a carnaúba utilizada para revestimento da drágea do comprimido de paracetamol, não seria taxada.
“Se a mera presença da carnaúba num produto que em nada se relaciona com a biodiversidade ou eventual conhecimento tradicional for obrigado a pagar 1% da receita líquida anual do produto acabado para efeito de repatriação de benefícios porque a carnaúba contribuiu no produto, há uma grande possibilidade deste insumo da biodiversidade brasileira ser substituído por outro de base sintética, impactando diretamente nas atividades e renda das cadeias produtivas que trabalham com a carnaúba”, afirmou o relator do projeto na Câmara, Alceu Moreira (PMDB-RS).
Indústrias e pesquisadores terão que pagar sobre o produto principal até 1% da receita líquida anual obtida com a exploração econômica ao Fundo Nacional de Repartição de Benefícios. Até metade deste porcentual será destinado aos povos detentores do conhecimento.
Para a deputada Luciana Santos (PC do B-PE), favorável às mudanças derrotadas, o retorno ao texto original da Câmara deixa nas mãos dos exploradores o critério de definir que elementos estão sujeitos a tributação. “É como se fosse a raposa tomando conta do galinheiro porque é ele quem vai determinar quais são os elementos do produto acabado que agregam ou não valor”, afirmou a parlamentar.
Os deputados isentaram da repartição de benefícios quem, a partir da entrada em vigor da lei, explorar economicamente produtos resultantes de patrimônio genético acessado antes de 29 de junho de 2000. A preocupação dos defensores do texto do Senado é que exploradores fraudem a documentação que comprova a data a que tiveram acesso a plantas ou animais nacionais.
Parlamentares derrubaram também a emenda que determinava que benfeitorias fossem executadas em unidades de conservação públicas, terras indígenas e territórios indígenas. Os deputados optaram pelo texto que permite que os exploradores determinem onde farão a compensação.
Pontos polêmicos, como a anistia a empresas que haviam sido multadas por levar adiante pesquisas sem autorização do órgão competente, não foram alterados.