Os três jovens querem se profissionalizar na área da criação de narrativas não ficcionais, dentro do Jornalismo. Eduardo Coutinho, Júlio Carvalho, e, Márcio Evandro escolheram uma forma de atuação profissional que só se tornou conhecida em todo o Brasil no final dos anos de 1960. Naquele período, com histórias reais, repórteres da Revista Realidade, como Roberto Freire, começaram a conquistar prêmios Esso, o mais importante do Jornalismo nacional.
Esta forma de atuação profissional, havia sido explorada, naquela década, por um escritor norte-americano, Truman Capote. No livro de grande tiragem e repercussão mundial, intitulado “A sangue Frio”, Capote reconstituiu o extermínio de uma família de Holcomb, cidade de somente 270 moradores, no Kansas, Estados Unidos. Assim como a prisão, o julgamento e o enforcamento dos dois assassinos, posteriores.
A possibilidade de se criar profissionalmente narrativas extraídas apenas da vivência de pessoas, no entanto, já havia sido demonstrada, no início de 1900, por um jornalista carioca, João do Rio.
Tem, portanto, uma longa tradição a carreira de quem tenta prender nas palavras – utilizadas cuidadosa e organizadamente – a fluída e única experiência de viver, das outras pessoas e a sua própria, às vezes. Uma experiência ocorrida sempre nas vizinhas do universo do maravilhoso, por mais céticos que sejamos. Mesmo quando empobrecida pela força poderosa da ganância e do preconceito, numa sociedade costumeiramente perversa como a nossa.
O texto com o qual Eduardo, Júlio e Márcio pretendem entrar na vida profissional se alimentou de histórias de brasileiros habitantes de uma região plena de encantos naturais: o Pantanal Sul-matogrossense. Ali eles encontraram pessoas surpreendentes por não se deixarem marcar pela enganosa sabedoria dos cidadãos urbanos.
Uma destas pessoas, um senhor, tem como companheiro de sobrevivência no Pantanal, uma entidade só encontrada por nós nos livros infantis, o Saci. Este senhor diante dos três jovens comentou: ”Na cidade, vocês não sabem de nada porque têm o padre. Mas a gente, no campo, não tem nada para se apegar e pedir proteção. Então meu pai sempre me disse: ‘seja fiel ao Saci’”. O senhor prosseguiu: “Gosto do Saci, é meu protetor. Ele não vai à minha casa porque eu casei. O Saci não gosta de mulher. Nem na zona (do meretrício) eu podia ir antigamente (por causa dele)”.
Já outro senhor, também ouvido pelos jovens, revelou amplo conhecimento da maneira como cobras e jacarés raciocinam. E agem. Não foi à toa que no Pantanal surgiu Manoel de Barros. O poeta escreveu: “Há histórias tão verdadeiras que às vezes parece que são inventadas”.
O contato com habitantes do Pantanal permitiu a Eduardo, Júlio e Márcio preparar o trabalho deles de conclusão de faculdade de Jornalismo, na área específica da narrativa não ficcional.
Aos três esta coluna deseja que seja sempre tão encantador como foi para João do Rio, Truman Capote, e, Roberto Freire, a observação do modo como as pessoas inventam a si mesmas, para poderem existir.
Quanto ao gorro vermelho de Fredric Brown, infelizmente, não sabemos se ele garantia a concentração do escritor. Nem se amenizava as dificuldades de convívio de Brown com a mulher dele.
Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP