Mundo das Palavras

Cãozinho brincalhão. Cachorrão direitista

Simone de Beauvoir escreveu que o amor exagerado e restrito a animais é uma clara exibição de sentimento de desapreço aos seres humanos. Os livros da escritora esquerdista francesa exerceram grande influência sobre jovens brasileiros, nos anos 60, inconformados com a desumanidade do regime político autoritário, então, vigente no País.
 
Portanto, também em nosso país, não surpreende certo desprezo manifestado por parte de quem se alinha politicamente à esquerda em relação ao cultivo deste sentimento dedicado exclusivamente aos bichos. Como se tornou claríssimo na década de 80, quando a música “Rock da Cachorra”, gravada por Eduardo Dusek, fez sucesso. Composta por Léo Jaime, sua letra trouxe estes trechos: “Troque seu cachorro por uma criança pobre, sem parentes, sem carinho, sem rango, e, sem cobre. Deixe na história de sua vida uma notícia nobre. Tem muita gente por aí que está querendo levar uma vida de cão pastor alemão. Seja mais humano. Seja menos canino. Dê guarida para o cachorro, mas também dê para o menino pobre”.
 
Há poucos dias, o conselho irreverente dado por Leo Jaime pareceu oportuno mais uma vez. Foi quando nas redes sociais o absurdo extermínio de um cão num supermercado provocou ampla e indignada reação nas redes sociais. Enquanto nelas permaneceu um espantoso silêncio diante da revelação, feita pelo IBGE, quase ao mesmo tempo, de que 18 milhões e 200 mil crianças são mantidas numa situação de pobreza, no Brasil. E, outras 5 milhões e 200 mil crianças, ainda em condições piores. Nas de extrema pobreza. 
 
Sabe-se, no entanto, que, pelo menos, um quarto destas crianças – aproximadamente 5,5 milhões – seriam poupadas destas terríveis degradações humanas, se, apenas no Estado de São Paulo, ocorresse o milagre proposto por Léo Jaime. Cinco milhões e meio de cachorros eram criados só em São Paulo, no ano de 2015, também segundo o IBGE. Um número, com certeza, hoje, consideravelmente aumentado devido ao agravamento contínuo da insegurança nas cidades. Para perceber isto, basta transitar pelas ruas da capital. Nas quais os pedestres a todo instante são atormentados por latidos altos de cachorro grandes, contidos pelos portões das casas.
 
Adoção de cachorros e tendência política mantém uma relação. Isto foi descoberto por pesquisadores do campo da Psicologia Social. Como vem divulgando, no Brasil, Luiz Alberto Hanns, autor de obras sobre Psicanálise e Psicologia Aplicada. Estas pesquisas mostraram: quem gosta de animais pequenos, frágeis, brincalhões e amistosos na presença de estranhos, tende a votar em candidatos esquerdistas. Diferentemente de quem elege políticos direitistas. Estas pessoas gostam mesmo é de cachorros grandes, ameaçadores diante de quem não pertença ao clã do seu dono. A quem eles obedecem cegamente. 
 
Para lembrar: há poucos dias, o presidente eleito chamou seu filho aniversariante de “Meu pit bull”.
 
(Ilustração: Desenho da Pinterest, rede social de compartilhamento de imagens)

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