O diagnóstico de um câncer nunca é uma notícia fácil e sempre vem acompanhada de preocupações. Isso porque, além de ter atenção com os riscos da doença, os pacientes precisam lidar com o tratamento forte e outros problemas na saúde que podem vir em consequência disso, como as cardiopatias.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças cardiovasculares e oncológicas são as que mais matam no mundo, juntas elas são responsáveis por 27 milhões de óbitos no ano. Apesar das duas condições não compartilharem a mesma origem e sintomas, elas possuem uma relação delicada e interferem diretamente na evolução uma da outra.
Para garantir o melhor cuidado dos pacientes oncológicos, a junção da cardiologia clínica e da oncologia tem se tornado cada vez mais comum. A chamada cardio-oncologia é uma abordagem interdisciplinar que une o conhecimento das duas áreas, buscando uma melhora na qualidade de vida dos pacientes.
Relação entre câncer e doenças cardiovasculares
Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), quando um câncer é diagnosticado, o comprometimento do coração pode chegar a 20%, dependendo do caso. Isso ocorre devido ao uso de alguns medicamentos utilizados para enfraquecer as células cancerígenas no organismo durante o tratamento do câncer de colon e reto e de outros tipos de neoplasias.
A SBC explica que componentes dessas medicações são capazes de aumentar o risco de toxicidade do coração, propiciando o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. As antraciclinas, por exemplo, tiveram uma incidência de 14% de toxicidade em um ensaio clínico brasileiro de prevenção a cardiotoxicidade.
No caso do câncer de mama, pesquisas científicas também relacionam os medicamentos com problemas cardíacos. Estudo publicado nos Arquivos Brasileiros de Cardiologia (ABC Cardiol) destacou que um grupo com câncer de mama apresentou níveis mais elevados de biomarcadores cardiovasculares, ferramenta importante para o diagnóstico de insuficiência cardíaca aguda.
Em entrevista para a imprensa, a médica cardio-oncologista e vice-presidente do Grupo de Estudos de Cardio-Oncologia da SBC, Ariane Vieira, destaca que todo o sistema cardiovascular pode ser impactado não somente pelo tipo de terapia utilizada no tratamento, como também pelo próprio câncer, devido ao processo inflamatório da doença.
A profissional reforça que os cardiopatas também requerem cuidados especiais durante o tratamento oncológico, uma vez que as terapias indicadas podem agravar as condições cardiovasculares.
Importância da cardio-oncologia
Ainda de acordo com a SBC, os dados que relacionam as duas condições não devem alarmar a população quanto ao tratamento contra o câncer e, sim, conscientizar sobre a importância da interação entre a cardiologia e a oncologia. Ao se unirem, as duas áreas podem traçar estratégias de prevenção para evitar complicações cardiovasculares e garantir o bem-estar do paciente.
De acordo com o cardiologista com especialização em cardio-oncologia Elias Yunes, em entrevista para a imprensa, muitas complicações relacionadas às duas doenças podem ser assintomáticas inicialmente ou só se manifestarem quando já estão em estágios avançados. Por esse motivo o trabalho da cardio-oncologia se torna importante, para fazer um monitoramento contínuo e mitigar as complicações cardiológicas que possam surgir com o uso dos medicamentos.
Ariane Vieira destaca que, com o avanço da ciência, hoje é possível monitorar os pacientes de maior risco para cardiotoxicidade e, com uma atuação preventiva, evitar complicações. Além disso, seria possível reverter a disfunção cardíaca que se desenvolve, garantindo a continuidade do tratamento oncológico.
Elias reforça ser importante uma comunicação aberta e honesta sobre a saúde e o histórico cardiovascular do paciente durante o acompanhamento médico regular para o tratamento de câncer. Sabendo que há qualquer relação com possíveis cardiotoxicidades, a equipe médica pode identificar precocemente as alterações na saúde do coração e traçar estratégias adequadas.
Por fim, o profissional aponta ser necessário buscar um estilo de vida saudável, com uma dieta equilibrada, exercícios regulares, controle de peso, moderação no consumo de álcool, abstenção de tabagismo e redução do estresse. A atenção a esses detalhes, de acordo com Elias, pode ajudar a reduzir o risco de problemas cardiovasculares e melhorar a saúde geral durante o tratamento.