Pedro Castillo assume nesta quarta-feira, 28, a presidência do Peru em um cenário de incertezas e preocupações das classes política e empresarial sobre qual será o governo formado pelo ex-professor e líder sindical. Nas últimas semanas, Castillo enviou sinais confusos sobre qual linha vai adotar, em alguns momentos sinalizando para sua base eleitoral e, em outros, para investidores.
Quando Martín Vizcarra assumiu a presidência em 2018, após a renúncia de Pedro Pablo Kuczynski, a formação de seu governo levou um tempo para ser anunciada, mas esta é a primeira vez que um presidente peruano eleito chega ao dia da posse sem fazer esse anúncio. Isso, segundo analistas, aumenta a instabilidade do novo governo e indica dificuldades para Castillo no comando do Executivo.
"Ele é um presidente da minoria, fará o juramento já debilitado, não apenas porque não tem a maioria no Congresso, mas também porque, internamente, Vladimir Cerrón – que é o chefe do partido (Peru Livre), mas não fará parte do governo por acusações de corrupção – está impondo condições. Castillo assume sem poder tomar certas posições", afirma o analista político e professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Peru Fernando Tuesta.
Enquanto os peruanos ouvem as mensagens contraditórias sobre o governo que se inicia, ficam sem saber diretamente de seu novo presidente sobre os planos de combate à covid-19 e, principalmente, as medidas para frear a instabilidade política no país, que teve quatro presidentes desde 2018. Castillo não concede entrevistas e pouco falou em público até agora. Diante desse cenário, aumenta o receio de uma nova aventura política no Peru.
Para o cientista político peruano Carlos Meléndez, a demora em definir a equipe de governo é reflexo do amadorismo político de Castillo e pode ter impactos negativos na retomada do crescimento econômico e na administração da saúde pública. "Castillo é um novato político. Os peruanos terão de sofrer os custos do aprendizado dele."
Com 51 anos, Castillo foi a grande surpresa da eleição. Nascido na região de Cajamarca, o professor primário e ativista venceu a disputa representando a extrema esquerda e prometendo políticas marxistas e leninistas, ao mesmo tempo que mantém uma visão conservadora sobre alguns temas.
Sem experiência em cargos políticos, Castillo ganhou notoriedade nacional ao liderar uma greve de professores pelo país em 2017 pedindo aumento de salários. Ele nega ser chavista. Na economia, defende um papel ativo do Estado.
Nas últimas semanas, Castillo quis mostrar que não será o político radical que sua oponente Keiko Fujimori e outros políticos peruanos disseram que ele seria e se aproximou de nomes moderados para equilibrar as promessas de campanha.
"No Peru, ninguém governa fazendo exatamente o que disse durante a campanha, geralmente porque são governos de minoria e não podem impor algo que não seja aprovado pelo Congresso", explica Tuesta.
A grande promessa de campanha do novo presidente é a reforma total da Constituição. Meléndez acredita que Castillo será fiel a boa parte do que prometeu, mas essa mudança não deve ocorrer de imediato. "O timing será importante para projetar uma imagem de moderação", diz.
<b>Eleição conturbada</b>
Castillo foi proclamado presidente há dez dias pelo júri eleitoral, que levou um mês e meio para analisar as contestações e os recursos apresentados por Keiko, candidata de direita que saiu derrotada do segundo turno. Os analistas políticos peruanos têm sido enfáticos em dizer que o impacto dessa eleição conturbada será alto, principalmente porque boa parte da população "comprou facilmente a versão de fraude" que foi apresentada.
"Estamos vivendo cinco anos de instabilidade e incertezas políticas e esta era a oportunidade de redirecionar isso. Mas este governo nasce de uma eleição complexa, com a opositora (Keiko) não reconhecendo a vitória de Castillo e (com seu partido) sendo a segunda força no Congresso. Os tempos difíceis continuarão. Cinco anos é um mandato longo para um presidente que carece de apoios duradouros", afirma Tuesta.
Meléndez segue a mesma linha. "A tensão política vai continuar, sobretudo com uma oposição que controla o Congresso e um setor dela, a ultradireita, conectada com a mobilização social de direita, o que é novo e complexo no cenário político peruano", explica o cientista político, se referindo ao fato de que essa ala da oposição conseguiu mobilizar boa parte da população que saiu às ruas repetindo as denúncias de fraude. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>