Estadão

Celebrações da Semana Santa voltam às ruas em cidades históricas de cinco Estados

Depois de dois anos de celebrações virtuais devido à pandemia de covid-19, tradições religiosas seculares voltam às ruas em cidades históricas do País durante a Semana Santa, de 10 a 17 deste mês. Os rituais que lembram a paixão e morte de Jesus de Nazaré mobilizam os fiéis católicos e movimentam também o turismo religioso em ao menos 11 cidades dos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Bahia, Goiás e Pernambuco.

A Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos da Igreja Católica divulgou documento recomendando que, mesmo em vista da diminuição da pandemia, sejam adotadas medidas de prudência durante os atos litúrgicos, evitando gestos e comportamentos que possam ser potencialmente arriscados.

No ano passado, ainda no auge da pandemia, a orientação dessa instituição papal foi no sentido de que as orações fossem dirigidas às vítimas da pandemia. Esse ano, o convite é para rezar "pedindo a Deus o dom da paz para a Ucrânia, para que cesse esta guerra repugnante", conforme o texto.

As seis cidades históricas de Minas Gerais que mantêm a tradição – Ouro Preto, Mariana, Congonhas, São João del Rei, Tiradentes e Sabará – devem receber, juntas, cerca de 150 mil visitantes durante toda a semana.

Em Ouro Preto, as paróquias de Nossa Senhora da Conceição e de Nossa Senhora do Pilar se alternam na organização da festa religiosa que, este ano, cabe à última. "As atividades voltam ao que eram antes da pandemia, mas com todos os cuidados", disse o padre Adilson Luiz Umbelino Couto, pároco da Basílica de Nossa Senhora do Pilar.

Como nas demais cidades históricas, Ouro Preto terá a celebração do Domingo de Ramos, dia 10, para lembrar a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém. Na quinta-feira, acontece a instituição da Eucaristia e a cerimônia do Lava-Pés na basílica do Pilar. "A Sexta-Feira da Paixão lembra a morte de Jesus e é o único dia em que as igrejas não rezam missas", disse o padre Adilson.

Já no dia 17, a festa da ressurreição de Cristo terá a tradicional procissão sobre os tapetes coloridos que enfeitam as ruas e ladeiras. A tradição é secular e virou patrimônio imaterial da cidade. Os enfeites irão da Basílica do Pilar ao Santuário de Nossa Senhora da Conceição, numa extensão de 4 quilômetros.

A prefeitura cede o material – serragem, borra de café, palha de arroz, flores – e cada morador enfeita a frente de sua casa. Conforme a secretaria municipal de Turismo, só Ouro Preto deve receber 50 mil visitantes.

Na cidade de Mariana, ainda devido à pandemia, a Arquidiocese aumentou o número de missas nas paróquias para distanciar os fiéis. A celebração continuará sendo transmitida pela internet.

Além dos tapetes coloridos, Mariana e as outras cidades mineiras mantêm as tradições dos altares cobertos de roxo na sexta-feira, dos cânticos em latim e das matracas de madeira substituindo o som dos sinos. A prefeitura espera ao menos 25 mil turistas durante os dias de celebrações.

Em Congonhas, as celebrações acontecem no Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, construído a partir de 1757 e declarado Patrimônio da Humanidade pela Unesco.

Em frente ao santuário, o turista pode apreciar os Passos da Paixão de Cristo, distribuídos em seis capelas, que abrigam 66 peças esculpidas em cedro por Francisco Antônio Lisboa, o Aleijadinho, e sua equipe, entre 1796 e 1799. No adro do santuário estão ainda os 12 profetas esculpidos em pedra-sabão por Aleijadinho e seus auxiliares.

As procissões e os sermões se estendem por todo o eixo histórico, que liga as igrejas de Nossa Senhora do Rosário, a Matriz de Nossa Senhora da Conceição, a Matriz de São José Operário e o santuário.

A prefeitura informou que apoia o evento, por ser de grande importância cultural, mas a maioria das ações é realizada pela própria população. Mais de mil pessoas contribuem como voluntárias para a realização da Semana Santa. O município prevê a passagem de 25 mil visitantes pela cidade durante o período.

Em Sabará, a expectativa é de ao menos mil visitantes por dia, durante os sete dias das "tradicionais e emocionantes solenidades da Paixão, Morte e Ressurreição" de Jesus Cristo, segundo o anúncio oficial dos eventos. Os hotéis estão com reservas esgotadas.

A cerimônia mais concorrida é a abertura do Santo Sepulcro, na quinta-feira, única no país que acontece nessa data. As procissões da Sexta-Feira da Paixão e da Páscoa também atraem muitos turistas. As celebrações foram declaradas patrimônio cultural da cidade.

O ponto alto em São João Del Rei é o Ofício das Trevas, celebrado na Catedral Basílica. Conforme o pároco, Geraldo Magela da Silva, o rito consiste em uma série de leituras de textos bíblicos e orações, acompanhadas de músicas dos séculos 18 e 19. "Essa é uma tradição muito antiga que caiu em desuso com o Concílio Vaticano II, mas em São João del Rei foi mantida na forma original", disse. A prefeitura espera receber 20 mil turistas durante a semana.

Em Tiradentes, na quarta-feira, será encenada a Via Sacra na capela do Senhor Bom Jesus da Pobreza. A expectativa da prefeitura é receber 15 mil turistas, o mesmo número de turistas de antes da pandemia. Os hotéis estão com 90% de reservas. "Como todos os eventos religiosos estão confirmados, esperamos que a lotação atinja 100% durante a Semana Santa", disse o secretário de Turismo, Christian Silveira. A Matriz de Santo Antônio, que concentrará as celebrações internas, tem trabalhos de Aleijadinho.

<b>São Paulo volta a receber peregrinações</b>

Após dois anos de ausência, os peregrinos voltam a se dirigir em romarias, a partir de domingo, 10, a Pirapora do Bom Jesus, na região metropolitana de São Paulo. A tradição remonta a 1725, quando pescadores acharam uma imagem de Jesus no Rio Tietê. A prefeitura prevê a chegada de ao menos 50 mil peregrinos e cerca de 300 cruzes de médio e grande porte.

"A chegada dos romeiros começa na segunda-feira, 11, após o Domingo de Ramos, e segue até sexta-feira Santa, que é ponto alto da peregrinação. Como 90% vêm a pé, estamos com um grande esquema de apoio para eles, inclusive nas principais estradas de acesso à cidade", disse o secretário de Cultura e Turismo, Vitor dos Santos.

As cruzes são deixadas em frente ao Santuário do Bom Jesus, no Largo da Matriz. As caravanas vêm de cidades situadas em um raio de até 100 km, segundo o secretário. "Temos a chegada de uma romaria com mil pessoas agendada para as 4 horas da manhã do sábado de Aleluia", disse. Os peregrinos se revezam na condução das cruzes – algumas chegam a 30 m de comprimento. "Ver a fé desses peregrinos renova a nossa própria fé. É um período de muita emoção para os moradores de Pirapora", disse Santos.

Em Itu, no interior de São Paulo, a expectativa é da cidade lotada, com 90% de ocupação hoteleira, além de excursões de turismo regional. Entre o domingo de Ramos e a Páscoa, a cidade recebe 50 mil visitantes, segundo a prefeitura. O coreto da Praça Padre Miguel, em frente à matriz, terá decoração especial com personagens pascais. O tradicional estouro do Judas, no domingo, 17, será substituído este ano pela queima de Judas, já que lei estadual proíbe o uso de fogos com estampido.

As celebrações religiosas, repetidas há mais de 200 anos, serão distribuídas entre as igrejas históricas da cidade. Um dos destaques será a Procissão dos Passos, realizada desde 1785 de forma ininterrupta, na Igreja do Carmo, com acompanhamento do Coral Vozes de Itu, interpretando o Canto da Verônica. Durante os ritos, o coral vai apresentar obras compostas ao longo do século 19 por Elias Logo, Tristão Mariano da Costa e Padre Jesuíno do Monte Carmelo.

Em Aparecida, os eventos da Semana Santa serão realizados no Santuário Nacional, maior templo católico do país, e na Basílica Histórica. As celebrações começam com a bênção e procissão dos ramos no domingo, às 8 horas, e se encerram com a procissão da ressurreição, às 6h30. Desde novembro do ano passado, o santuário retomou as missas sem restrição na ocupação na basílica.

Conforme a assessoria, as celebrações da Semana Santa vão seguir a dinâmica do que já vem sendo feito nos últimos meses, com a acolhida no tempo sem limitação de fiéis e uso optativo de máscara. "Em relação ao número de visitantes esperados, não há uma previsão neste sentido, já que a presença de devotos ainda está impactada pela pandemia", disse.

<b>Encenações e procissões ocorrem em outros Estados</b>

A encenação da Paixão de Cristo em Nova Jerusalém, no município de Brejo da Madre de Deus (PE), que combina religião com dramaturgia, volta a acontecer este ano, depois da interrupção de dois anos pela pandemia. O espetáculo reúne atores famosos e personalidades e acontece do dia 9 ao dia 16, a partir das 8 horas. Os ingressos custam R$ 100 (meia entrada) e R$ 200. A expectativa é de que 60 mil pessoas vejam as apresentações que reúnem 450 artistas, incluindo atores principais e figurantes.

No município de Goiás (GO), após a pausa da pandemia, será realizada a Procissão do Fogaréu, nas primeiras horas da quinta-feira, 14. O ritual é realizado desde 1745 e se tornou patrimônio imaterial do estado. Na encenação, que simboliza a prisão de Jesus Cristo, os 40 homens que representam os farricocos – pessoas vestindo hábitos escuros, com as cabeças cobertas com capuz – caminham pelas ruas com tochas acesas, entoando cantos em latim.

O cortejo sai da frente da Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte e percorre as ruas do centro histórico, que tem as luzes apagadas. Apenas a procissão deve atrair 5 mil visitantes, segundo o município.

As celebrações voltam a acontecer também em Bom Jesus da Lapa, no interior da Bahia. Uma das atrações é a Procissão do Encontro, na noite de quarta-feira, 13, quando a imagem de Nossa Senhora das Dores é levada nos ombros das mulheres devotas para o encontro com a imagem do Senhor dos Passos, carregada pelos homens. Em outro ritual, a Procissão Luminosa, quando o círio pascal é aceso em uma fogueira e os fiéis levam velas acesas, marca o início da Páscoa. A prefeitura espera caravanas de fiéis de toda a região, como acontecia antes da pandemia.

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