O ajuste de rota das startups após um período relativamente longo de bonança vem para solidificar no ecossistema brasileiro de tecnologia uma noção que parece ter sido esquecida: passada a fase da chegada de um grande investimento, os negócios em fase inicial são, por si, uma aposta arriscada. Essa é a visão do influenciador Alberto Brandão, conhecido como Startup da Real nas redes sociais e que se dedica a desmistificar mitos do empreendedorismo. Ele alerta: o risco de novas demissões é grande.
Além disso, o cenário macroeconômico deve elevar o exame de investidores sobre as contas e as estratégias desses negócios. "A pressão está muito maior nas grandes startups, até mesmo porque o retorno esperado para elas não é tão grande como era em anos anteriores", diz Arthur Mesnik, sócio e responsável pelo braço de venture capital da Trígono.
É por isso que o nome do jogo atualmente é eficiência. "Não vou continuar a 300 quilômetros por hora em uma estrada onde posso bater em todo mundo. É um momento de preservar capital", diz Gabriel Braga, CEO do QuintoAndar. Após fazer demissões, a empresa olha para outros gastos, como em marketing e na busca de novos segmentos de atuação. "Antes, na pressa, pensávamos que precisaríamos de 120 pessoas para fazer algo e, agora, percebemos que dá para fazer com 30, por exemplo."
Outras empresas estão no mesmo caminho, segundo Dan Yamamura, sócio do fundo de investimento de risco Fuse Capital. Ele ressalta, porém, que não vê risco de uma "quebradeira". "Certamente isso não vai acontecer, pois temos um ecossistema forte, com startups com fundamentos excelentes, e com capital para isso. Mas a margem diminuiu."
Alguns casos, no entanto, assustam. O atacado digital Facily, por exemplo, demitiu cerca de 200 funcionários quatro meses após receber um aporte que o elevou ao status de "unicórnio", apelido dado a startups que valem mais de US$ 1 bilhão. Segundo relatos de ex-funcionários, a empresa não tinha estrutura para atender ao fluxo de vendas ou para fazer o atendimento aos clientes, o que resultou em recorde de reclamações no Procon em 2021.
A startup justificou os cortes como parte da estratégia para melhorar sua eficiência. A Facily afirmou, por nota, que sempre vai "priorizar o que de fato faz a diferença no impulsionamento do nosso negócio. Para preservar nossas pessoas preferimos não comentar sobre processos internos, que tratamos de forma sigilosa e respeitosa".
<b>VOLTA POR CIMA</b>
Mas já há casos de companhias que conseguiram se recuperar de uma fase de dificuldades. Uma delas é a Gympass, unicórnio que precisou mudar o modelo de negócios quatro vezes e quase faliu duas vezes – a startup chegou a ter apenas R$ 1 mil na conta e também precisou demitir grande parte dos funcionários.
Foi então que decidiu pelo formato de venda de diárias e mensalidades de academias para empresas em vez do consumidor final. "Criar uma empresa é uma maratona, e não uma prova de 100 metros", afirma João Barbosa, cofundador e líder global de parcerias do Gympass, hoje presente em 11 países.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>