Quatro policiais militares foram condenados pelo Tribunal do Júri a 275 anos e 11 meses de prisão cada um pela participação em 11 assassinatos no episódio conhecido como "Chacina do Curió", em Fortaleza, no Ceará. A sentença foi anunciada na madrugada deste domingo, 25, após mais de 60 horas de julgamento.
O cumprimento das penas que, somadas, chegam a 1.103 anos e 8 meses, é imediato. Os réus perderam o cargo de policiais. A defesa anunciou que vai entrar com recursos.
Os réus Antônio José de Abreu Vidal Filho, Marcus Vinicius Sousa da Costa, Wellington Veras Chagas e Ideraldo Amâncio foram considerados culpados de 11 homicídios qualificados, três tentativas de homicídio com qualificadoras, três crimes de tortura física e um de tortura mental.
Um dos réus, Antônio Vidal Filho, mora nos Estados Unidos e deverá ser extraditado para o Brasil. Outros 30 réus acusados pelos mesmos crimes ainda serão julgados. O julgamento de outros oito réus está marcado para o dia 29 de agosto. Outra sessão com o mesmo número de réus se inicia em 12 de setembro. A Justiça cearense ainda vai definir as datas dos júris dos demais acusados.
<b> Esquadrão da morte </b>
A chacina aconteceu em um período de seis horas, entre a noite do dia 11 e a madrugada do dia 12 de novembro de 2015. De acordo o Ministério Público do Ceará (MPCE), os acusados se organizaram em uma espécie de esquadrão da morte para, supostamente, vingar o assassinato do policial Valtemberg Chaves Serpa, de 32 anos, morto ao defender a namorada durante um assalto, no mesmo dia 11.
As vítimas, todas do sexo masculino, nove delas com idades entre 16 e 19 anos, eram moradoras dos bairros Messejana, Curió, São Miguel e Lagoa Redonda, na periferia de Fortaleza. Apenas três vítimas tinham passagem pela polícia, mas por delitos considerados leves.
A chacina é considerada a maior da história da capital cearense e causou grande repercussão. No dia 8 de novembro, centenas de pessoas realizaram uma manifestação no Conjunto Curió pedindo justiça. As mães das vítimas formaram um grupo para lutar por justiça.
A investigação apurou que os PMs se comunicaram por mensagens de celular antes de se reunirem para os crimes. Os policiais usaram viaturas descaracterizadas e veículos com placas adulteradas – alguns estavam encapuzados. As vítimas foram mortas com tiros na cabeça.
O MP cearense denunciou 45 agentes, mas a justiça excluiu um comandante, acusado de omissão. Outros 10 foram excluídos do processo por falta de provas. Com a sentença condenatória, os acusados estão presos no 5º Batalhão da Polícia Militar, em Fortaleza, mas serão transferidos para presídios comuns.
Em nota, o procurador-geral de Justiça do Ceará, Manuel Pinheiro, disse que o resultado do julgamento se baseou na prova bem fundamentada dos autos. "É a resposta civilizada para a barbárie que foi a Chacina do Curió. A justiça não apaga a dor dessas famílias, mas ela traz paz no presente e paz no futuro para essas comunidades que viveram tanto tempo sob os signos da incerteza e do medo", disse.
O Movimento Mães do Curió Lutam por Justiça, formado pelas mães das vítimas, comemorou o resultado do primeiro julgamento dos acusados. "Essa vitória é da nossa periferia, é do nosso povo periférico, é dos nossos jovens. É libertar os jovens das mortes", postou Edna Carla Souza Cavalcante, mãe do jovem Álef Souza Cavalcante, de 17 anos, uma das vítimas, na página do movimento em rede social.
Na chacina, além de Álef, foram assassinados Antônio Alisson Inácio Cardoso, de 17 anos, Francisco Enildo Pereira Chagas, de 41, Jandson Alexandre de Sousa, 19, Jardel Lima dos Santos, 17, José Gilvan Pinto Barbosa, 41, Marcelo da Silva Mendes, 17, Patrício João Pinho Leite, 16, Pedro Alcântara Barroso, 18, Renaylson Girão da Silva, 17, e Valmir Ferreira da Conceição, 37.
Nesta segunda-feira, 26, o governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT) disse que o Estado irá procurar as famílias das vítimas para fazer um acordo de indenização. Depois do indiciamento dos policiais, a Defensoria Pública do Estado entrou com ações indenizatórias em nome das famílias das vítimas.
Logo após o julgamento, a defesa dos quatro policiais militares anunciou que entrará com recurso contra a decisão do júri.