Blindados cercaram por algumas horas nesta quarta-feira, 26, a Praça Murillo, sede do governo da Bolívia, com o chefe do Exército, general Juan José Zúñiga, pressionando o presidente Luis Arce, de esquerda, a fazer trocas em sua equipe, em meio a uma crise política instaurada entre o militar e o ex-presidente Evo Morales (no poder entre 2006 e 2019). Há semanas, o general vinha criticando as tentativas de Evo de retornar à presidência nas eleições de 2025.
Em resposta ao cerco, Arce denunciou uma tentativa de golpe de Estado contra seu governo e trocou toda a cúpula militar. Horas depois, os blindados e soldados que estavam cercando a sede do Executivo se desmobilizaram. O general foi preso pela polícia. A Procuradoria-Geral anunciou que abriu uma "investigação criminal" contra Zúñiga e todos os militares que participaram na mobilização "irregular".
O cerco não teve apoio nem da oposição de direita e foi rapidamente condenado pela comunidade internacional. Aliados do presidente convocaram greve geral e bloqueio de estradas em protestos contra os militares. Manifestantes pró-governo cercaram o palácio presidencial.
<b>Ultimato</b>
Durante a ação militar, um dos veículos militares tentou derrubar a porta de entrada do palácio presidencial. O general entrou no prédio e teve uma discussão ríspida com Arce.
Antes, Zúñiga pressionou por trocas de ministros. "Tenho certeza que em breve teremos um novo gabinete. O nosso país e o nosso Estado não podem continuar assim", disse o general, afirmando que ainda reconhecia Arce como comandante-chefe. Ele disse que o objetivo dos militares era "reestruturar a democracia" na Bolívia e também exigia a liberação de opositores presos.
Registros da TV boliviana da cena mostram trechos da conversa entre o presidente e o general. "Eu (Arce) sou seu comandante e ordeno que retire seus soldados. Não permitirei essa insubordinação", disse o presidente.
Após o recuo dos militares, Arce apareceu no balcão do palácio diante de apoiadores. "Ninguém pode nos tirar a democracia que conquistamos. Estamos certos de que vamos continuar e vamos seguir trabalhando", disse, em tom vitorioso.
Segundo a imprensa boliviana, a tensão entre Arce e a cúpula do Exército aumentou nos últimos dias depois de críticas de Zúñiga a Evo. Em uma entrevista na segunda-feira, o chefe do Exército disse que prenderia Evo se ele insistisse em concorrer à presidência em 2025, após ter sido desqualificado pela Justiça eleitoral. "Legalmente, ele está desqualificado, não pode mais ser presidente deste país", disse.
Evo foi deposto por militares em novembro de 2019 após conquistar, no mês anterior, um quarto mandato sem precedentes em uma eleição marcada por alegações de fraude. No ano passado, ele disse que seria candidato novamente.
Evo busca a indicação como candidato presidencial do Movimento ao Socialismo (MAS), enquanto Arce, no poder desde 2020, ainda não comentou se tentará a reeleição.
Segundo o site de notícias Infobae, o ex-presidente acusou o general de elaborar um plano contra ele e teria pedido a Arce para demiti-lo. O presidente, segundo o site, convocou uma reunião e destituiu o general. Zúñiga, porém, negou os rumores e, ontem de manhã, participou de um evento oficial. Depois, liderou unidades militares rumo à Praça Murillo.
<b>Oposição</b>
A oposição não apoiou a mobilização dos militares. A ex-presidente Jeanine Añez condenou o cerco. "Repudio totalmente a tentativa de destruir a ordem constitucional", disse. Jeanine se autoproclamou presidente interina em 2019 e está presa desde 2021 acusada de conspiração e terrorismo. "Arce e Evo devem deixar o poder pelas urnas. Os bolivianos defenderão a democracia", disse ela.
Outro importante líder da oposição, Luis Fernando Camacho, também rejeitou a tentativa de golpe. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>