Nas sucessivas entrevistas que tem dado para promover Amazônia – O Despertar da Florestania, Christiane Torloni fala sempre do afeto como diferencial. Ela chega a dizer que, para sua estreia como diretora, foi empurrada pela expedicionária e pela atriz, que assumiram a defesa da Amazônia quase como um dever sagrado. Em busca da sua paisagem, e dos seus personagens, ela percorreu rios, embrenhou-se na floresta. Conheceu pessoas que a encantaram. Mostrou o material que havia colhido para o amigo Miguel Przewodowski e ele foi o primeiro a lhe dizer que ali havia um filme. Construíram-no juntos, mas o olhar, a autoria, é de Christiane. “Essa história de amor tinha de ser contada amorosamente, senão seria só mais um documentário um pouco técnico sobre um assunto apaixonante.”
De cara, Christiane lembra seu engajamento na campanha das diretas já. Em plena ditadura, ela aparece muito jovem, num palanque, perante um milhão de pessoas, saudando os partidos que sustentavam aquela mobilização. Defende o engajamento. Como cidadão, o artista deve lutar pelo que acredita. Das diretas, a ponte abarca agora o movimento ambientalista – a florestania, essa cidadania da floresta, tão necessária no Brasil atual. Se se trata de uma história de amor, quando começou a de Christiane pela Amazônia? “Há mais de 30 anos, nos anos 1980, tive o privilégio de reinaugurar o Teatro Amazonas. Como filha da arte, do teatro, vivi aquele momento e depois voltei repetidas vezes. Conheci o Amazonas, o rio, e a Amazônia, a floresta. Conheci as pessoas que lutam pela preservação de tudo aquilo, e todas me falavam o diálogo do afeto que atravessa o filme.”
Christiane queria muito que o filme ficasse pronto há dois anos, mas agora acha que o destino interveio, com suas regras e mistérios. “No ano passado, o Brasil não estava só polarizado, estava bitolado. Era aquele ódio dividindo as pessoas, famílias. Tenho feito debates sobre a Amazônia. Na quinta estava em Belo Horizonte, debatendo com Ailton Krenak e com Ronaldo Fraga, estilista que tem toda uma preocupação com a sustentabilidade. Ele estava na plateia e o chamei para debater. O que sinto, nesses encontros, é que o País começa a viver outro momento, como na época das diretas, quando todos nos unimos na esperança de um Brasil maior e melhor. Agora mesmo, ex-ministros do Meio Ambiente se reuniram para conversar, e para fazer frente a essa cruzada evangelo-ruralista que ameaça conquistas importantes no Congresso. Não podemos ser governados por essa frente boi-bala-Bíblia. Crescer por crescer, a célula cancerígena também cresce. O que nós precisamos é de um retorno ao humanismo, ao diálogo. Sustentabilidade é a solução.”
Krenak define a florestania, quem senão ele, que representou o ponto de vista do índio na Constituinte? Bem no começo, ouve-se uma voz narrando trechos de uma entrevista do ex-ministro de Lula, Cristóvão Buarque. Ele fala sobre a internacionalização da Amazônia e diz que até a defenderia, para preservar o pulmão do planeta, se o mundo não o considerasse brasileiro, então ele defende a Amazônia como patrimônio do Brasil, e da humanidade. “Antônio Abujamra dramatizou essas palavras, e é o que coloco no filme. Porque se Amazônia dá voz ao indígena e a vários especialistas que discutem o meio ambiente, o aquecimento global, o desmatamento, os riscos acarretados pela destruição da grande floresta, a voz de Abujamra está ali para lembrar que o espaço do filme é o da arte, e do afeto, para construir a nova esperança.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.