Estadão

Câmara atrasa votações por falta de acordo sobre comissões, cujas emendas serão turbinadas

Ainda com impasses na definição para as presidências das comissões da Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), abriu mão de pautar temas mais relevantes em plenário para resolver as divergências até o começo de março.

As mudanças passam tanto pela articulação do governo, que quer tirar os principais colegiados das mãos da oposição liderada pelo PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), quanto pelas emendas de comissão, que terão valor turbinado em 2024.

O Congresso aprovou o valor de R$ 16,6 bilhões para as emendas de comissão no Orçamento deste ano. Desse total, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou R$ 5,6 bilhões. Mesmo assim, o montante de R$ 11 bilhões é maior que os R$ 7,6 bilhões de 2023.

As emendas de comissão não são impositivas (de pagamento obrigatório), como as individuais, a que cada parlamentar tem direito, e as de bancada estadual. Mesmo assim, foram turbinadas como forma de suprir o fim do chamado orçamento secreto, que funcionava por meio das extintas emendas de relator. Pelo esquema, revelado pelo <b>Estadão</b> e posteriormente declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a cúpula do Congresso distribuía os recursos sem transparência e por critérios políticos.

Nessa nova configuração, a Comissão de Saúde, por exemplo, será dona do maior repasse e receberá R$ 4,5 bilhões (veja ranking abaixo). Por isso, é uma das mais visadas pelos partidos. Tanto o PT, quanto o PL pleiteiam a presidência do colegiado.

Comandar as principais comissões da Câmara também é sinal de prestígio político e influência interna dos partidos e dos parlamentares escolhidos para esses cargos. No total, há hoje 30 colegiados que analisam projetos antes de eles serem votados no plenário da Casa (veja a lista abaixo).

A mais importante de todas elas é a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Avalia-se nela a constitucionalidade de todos os projetos de lei e por lá também passam todas as Propostas de Emenda à Constituição (PEC).

Lá está o palco da principal disputa. Um acordo feito no ano passado garantiria que o PT e o PL revezariam cargos na CCJ e na Comissão Mista de Orçamento (CMO). Por isso, o PT ficou na presidência da CCJ, com Rui Falcão (SP), e o PL na relatoria da Orçamento, com Luiz Carlos Motta (SP).

Só que a troca não deverá acontecer em 2024. Como mostrou o <b>Estadão</b>, o governo trabalha com Lira para que o PL não fique com a CCJ, para evitar que a oposição paute temas polêmicos. Para isso, o PT abre mão de presidir a CMO.

A aposta inicial do PL para presidir a CCJ era a deputada bolsonarista Caroline de Toni (SC). Nos bastidores, contudo, Lira avaliou que a parlamentar é radical demais para comandar a principal comissão da Câmara, o que fez com que o partido recuasse da indicação. O líder do PL, Altineu Côrtes (RJ), afirmou ao Broadcast Político que a sigla não escolheu um nome.

Reservadamente, deputados do PL disseram que, em reunião nesta terça-feira, 26, Altineu já dava a entender que "por questões políticas", o PL não conseguiria ter o controle da CCJ.

O União Brasil entraria no lugar e já tem um nome para indicar à chefia do colegiado: Arthur Maia (BA). Ele é considerado mais moderado e tem a simpatia tanto de governistas como de oposicionistas. Em 2022, quando assumiu a CCJ, em pleno governo Bolsonaro, o deputado sinalizou que não pautaria projetos da agenda de costumes do então presidente.

No período em que esteve à frente da comissão, o parlamentar evitou colocar temas polêmicos em votação. Ele também foi presidente da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro e prometeu que pautaria temas de interesse de ambos os lados.

Um nome radical na CCJ iria contra o movimento que Lira tem feito de aproximação com o governo, após um início de ano turbulento na relação entre o Planalto e o deputado. Ele chegou a romper relações com o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, responsável pela articulação política do governo com o Congresso, por insatisfação com regras para a liberação de recursos da Saúde.

Antes do carnaval, contudo, Lula e Lira se reuniram e decidiram construir juntos uma candidatura à sucessão na Câmara – a eleição ocorrerá em fevereiro de 2025. O favorito de Lira para o posto é Elmar Nascimento, do União, que participou da tratativa para definir o nome para a CCJ.

Como a quebra do acordo do ano passado, o PT abre mão e deixa para que o PP de Lira presida a CMO. O rodízio anual entre as Casas do Legislativo concederá, neste ano, a relatoria do Orçamento na comissão para o Senado.

Partidos desejam indicar deputados para presidência de comissões ligadas aos seus ministérios, mas emendas de comissão provocam disputa entre eles.

O PSB, por exemplo, quer a Comissão de Indústria e Comércio, área relacionada à pasta do vice-presidente Geraldo Alckmin.

Enquanto isso, o PDT mira a Comissão de Desenvolvimento Regional, dona do segundo maior repasse de emendas de comissão, com R$ 1,2 milhão. Se conseguir, a sigla indicará Josenildo (AP), nome próximo ao ministro do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes.

O PSD deseja a comissão de Agricultura. Na Esplanada, o ministro do tema é o pessedista Carlos Fávaro. O colegiado é dono do quarto maior repasse de emendas. Serão 356,1 milhões destinados neste ano.

A sigla também tem o controle do ministério de Minas e Energia, chefiado por Alexandre Silveira, e, por isso, também deseja a Comissão de Minas e Energia (CME).

Há, neste momento, resistência de dois partidos: o União Brasil e o PL. Caso um dos dois triunfe, o União Brasil poderá indicar Danilo Forte (CE) e o PL deverá indicar Joaquim Passarinho (PA) para a CME.

Ainda que não tenha nenhuma emenda de comissão até o momento, a CME tratará da transição energética, pauta considerada prioritária para a Câmara e para o governo. Por isso deverão surgir projetos importantes sobre o tema ao longo do ano.

Caso o Congresso derrube o veto de Lula ao Orçamento, porém, a CME terá R$ 237,5 milhões em emendas para poder usar.

<b>PT e PL disputam presidências de comissões controversas</b>

O PT e PL digladiam-se para assumir comissões que deverão ser palco de controvérsias ao longo do ano. Uma delas é a Comissão de Segurança Pública, espaço em que a oposição exerceu maior pressão sobre o governo em 2023. O PT quer disputar a presidência com o PL.

Foi esse colegiado que fez sucessivas convocações ao ex-ministro da Justiça Flávio Dino, agora integrante do STF, forçando-o a justificar ausência por questões de "insegurança" e mobilizou grande agenda legislativa armamentista.

Antes mesmo de Ricardo Lewandowski assumir o ministério da Justiça, o presidente da comissão em 2023, Sanderson (PL-RS), já iria submeter requerimento para o convidá-lo.

Ambas as siglas também deverão disputar a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional. A oposição fortalece a pressão sobre Lula na política externa, principalmente após o presidente comparar a ofensiva de Israel ao Hamas em Gaza com o Holocausto. A fala rendeu um pedido de impeachment com a adesão de mais de 140 deputados.

O PL quer indicar Alberto Fraga (DF), presidente da bancada da bala, para a presidência da Comissão. O PT resiste.

Em reunião de líderes da base aliada nesta terça-feira, 27, o governo pediu para os deputados tentarem formar maioria governista na composição das comissões, para blindar o Palácio do Planalto de desgastes. Os colegiados podem, por exemplo, aprovar convocação de ministros de Estado.

O Executivo também quer evitar o avanço de pautas de costumes do campo conservador, como aconteceu no ano passado com a aprovação de um projeto de lei que proíbe a união estável entre pessoas do mesmo sexo na Comissão da Família.

O PT tem maior interesse nas comissões de Saúde, Educação, Relações Exteriores, Meio Ambiente e Segurança Pública.

Já o PL dará prioridade aos colegiados de Constituição e Justiça, Relações Exteriores, Saúde, Minas e Energia, Viação e Transporte e Segurança Pública.

Veja os colegiados da Câmara que receberão mais dinheiro de emendas de comissão:

– Comissão de Saúde – R$ 4,5 bilhões

– Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional – R$ 1,2 bilhão

– Comissão de Esporte – R$ 650 milhões

– Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural – R$ 356 milhões

– Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – R$ 200 milhões

– Comissão de Educação – R$ 180 milhões

– Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher – R$ 154 milhões

– Comissão de Viação e Transportes – R$ 104 milhões

– Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional – R$ 32 milhões

– Comissão de Desenvolvimento Urbano – R$ 20 milhões

<b>Quais são todas as comissões da Câmara?</b>

– Comissão de Administração e Serviço Público

– Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural

– Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação

– Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais

– Comissão de Comunicação

– Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania

– Comissão de Cultura

– Comissão de Defesa do Consumidor

– Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher

– Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa

– Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência

– Comissão de Desenvolvimento Econômico

– Comissão de Desenvolvimento Urbano

– Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial

– Comissão de Educação

– Comissão do Esporte

– Comissão de Finanças e Tributação

– Comissão de Fiscalização Financeira e Controle

– Comissão de Indústria, Comércio e Serviços

– Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional

– Comissão de Legislação Participativa

– Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável

– Comissão de Minas e Energia

– Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família

– Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional

– Comissão de Saúde

– Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado

– Comissão de Trabalho

– Comissão de Turismo

– Comissão de Viação e Transportes

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