O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deve encerrar, na próxima sexta-feira (7) o julgamento da desembargadora Maria do Carmo Cardoso, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Ela é suspeita de morosidade em um processo de pagamento de propina para a aprovação, na Assembleia Legislativa do Amapá, da transferência da concessão de uma estrada de ferro do Estado a uma mineradora.
O processo tramita sob segredo de Justiça e teve seu julgamento virtual iniciado em 29 de maio. O <b>Estadão</b> pediu mais informações ao CNJ e ao TRF-1, mas não obteve respostas até a publicação desta reportagem.
Maria do Carmo Cardoso é considerada amiga pessoal do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e já foi apontada como consultora informal da família Bolsonaro. Em novembro de 2023, o CNJ arquivou uma denúncia contra ela por elogiar, nas redes sociais, os acampamentos golpistas em torno de bases militares entre o fim de 2022 e o começo do ano passado. Antes de assumir o posto de desembargadora no TRF, ela atuava como advogada em Brasília. Entre seus clientes estavam as secretárias de Paulo César Farias, o tesoureiro de campanha do ex-presidente Fernando Collor. Ela cuidava da defesa das secretárias na época em que o Esquema PC foi alvo de investigação pela Polícia Federal e pelo Congresso.
O caso, que deve ser concluído nesta semana, começou quando o promotor aposentado do Ministério Público do Amapá Afonso Gomes Guimarães informou ao CNJ que havia atuado no inquérito que apura a suspeita de pagamento de propina. A investigação, de 2014, se deu na 4ª Promotoria de Justiça e Defesa do Patrimônio Público de Macapá (AP).
A mineradora suspeita teria subornado deputados estaduais com US$ 5 milhões, originados no exterior. As provas foram compartilhadas com a Polícia Federal (PF). Um dos investigados movimentou R$ 10,6 milhões em conta em 2014, e a origem suspeita do dinheiro chamou a atenção do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Segundo a denúncia de Guimarães, a estrada de ferro está dilapidada e, por isso, pediu que caso fosse acompanhado de perto. Em seguida, requisitou a nulidade da decisão da Assembleia Legislativa e a decretação do perdimento de bens obtidos por meio ilícito, em favor do Estado do Amapá. O promotor também solicitou que se pagasse R$ 22 milhões em dano moral coletivo e indenização de R$ 405,5 milhões por danos materiais.
Em julho de 2022, o processo foi extinto porque havia prescrito, segundo sentença da Justiça do Estado. No mesmo ano, o corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, analisou uma apelação da procuradoria-geral do Estado do Amapá. A alegação era de que a sentença violava a irretroatividade do novo regime prescricional, conforme o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) da Lei nº 14.230, de 2021.
Salomão pediu ao tribunal estadual informações sobre as ações. Também mandou que Maria do Carmo Cardoso, relatora do caso no TRF-1, prestasse esclarecimentos sobre o caso e sua prescrição, "sobretudo porque consta ter sido distribuído no ano de 2016 e ainda não ter sido finalizado".
O corregedor expediu ofícios ao Procurador-Geral da República, ao Defensor Público-Geral Federal e ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil. Cardoso sofreu 25 representações no CNJ, das quais 16 alegavam excesso de prazo. A maioria dos procedimentos foi arquivado.
Em 17 de abril deste ano, a Corregedoria Nacional de Justiça fez correição extraordinária no gabinete da desembargadora. A inspeção foi realizada na tarde do mesmo dia em que Salomão determinou a fiscalização das condutas da magistrada.