Lindsey Troy suspira, aliviada, ao telefone, quando ouve, do lado de cá, que a entrevista com a reportagem iria fugir das perguntas padrões a respeito do fato do Deap Vally ser composto por garotas e comparações com outros duos do rock famosos, como White Stripes, Black Keys e Royal Blood. “Ainda bem”, brinca a vocalista e guitarrista da dupla californiana. “A gente imaginava que esse tipo de tópico fosse esquecido depois do nosso segundo disco (Femejism, de 2016), porque o assunto ficaria velho. Mas isso ainda acontece, as pessoas ainda querem falar sobre o fato de sermos uma banda de mulheres, quando o que importa deveria ser a música que produzimos.”
O papo foi conduzido poucos dias antes do embarque dela e de Julie Edwards (bateria) para São Paulo, onde elas farão sua estreia nos palcos do País. A Deap Vally é a atração principal do Festival Jägermeister Grounds 2017 – um projeto itinerante que passou por outras capitais do Brasil, como Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Florianópolis. A versão paulistana tem entrada gratuita e ocorre no Espaço Pro Magno, na zona norte, a partir das 14h deste domingo, 3.
O duo Deap Vally encerra as atividades do festival, com apresentação marcada para às 21h. Antes delas, apresentam-se as brasileiras Combover, Color for Shane, Sky Down, Devilish, The Last Station, Beach Combers, Lava Divers e Dead Fish.
De modo geral, a curadoria do Jägermeister Grounds, assinada por Deborah Babilônia, a vocalista da ruidosa banda Deb and the Mentals, buscou a guitarra como inspiração, como a força que leva as bandas selecionadas para frente. No caso da Deap Vally, isso é ainda mais pungente. Foi a fúria, aliada à química com Julie, que convenceu Lindsey voltar ao universo da música.
É difícil de imaginar quando se testemunha tamanha euforia de Lindsey no palco, mas até 2010, a artista não se via dentro do music business mais uma vez. Tudo culpa de um trauma na infância. Quando tinha 15 anos, em 2002, Lindsey assinou um contrato com a gravadora Electra Records como integrante da banda The Troys, formada com a irmã, vocalista e guitarrista da então banda. “Mas eles queriam nos transformar em algo pop”, lembra.
O disco do The Troys nunca chegou às prateleiras, mas segundo a artista a gravadora deve ter os fonogramas – ela, mesma, tem uma cópia do álbum produzido. Em 2006, Lindsey e a irmã Anna, lançaram suas tentativas de carreira solo, com um disco e um EP, respectivamente embora nenhuma delas tenha se destacou. “Quando conheci Julie, a música ainda era uma questão para mim. Pensava em qual seria o projeto que iria me pegar de jeito e me fazer mergulhar”, conta. “E assim que nós conversamos percebi que havia algo de especial. Era uma alquimia.”
E o Deap Vally segue a cartilha dos principais fundamentos para ser uma dupla roqueira de sucesso. O principal é não tentar soar como mais de duas pessoas – somente o Royal Blood foi capaz de fazer isso de forma aceitável. A captação de som precisa ser lo-fi, para evidenciar as imperfeições e deixar a guitarra soar mais musculosa. Se o com da guitarra e da bateria interferirem nos microfones alheios durante a captação, melhor ainda. Por fim, deixe a impetuosidade carregar a voz para paisagens áridas e quentes.
Quando adolescente, por exemplo, Lindsey ouvia ao disco Californication, do Red Hot Chili Peppers sem parar – um disco sobre uma Califórnia em transformação. Hoje, ela é a nova voz californiana: seu discurso de poder do feminino é fundamental e seu impacto vem como uma lufada de vento quente vindo do deserto. “Ser californiana também me influenciou.”
JÄGERMEISTER GROUNDS
Espaço Pro Magno.
R. Samaritá, 230, Casa Verde. Domingo (3), a partir das 14h.
Entrada gratuita.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.