Em dia de agenda mais acomodada – com destaque para as vendas do varejo, divulgada de manhã pelo IBGE -, o Ibovespa colou na inércia que se impôs desde o início de agosto e emendou a sétima perda diária nesta quarta-feira, ainda sem experimentar o sabor de ganhos no mês. O grau de ajuste, contudo, mantém-se relativamente contido, com recuos sempre abaixo da marca de 1% a cada sessão, de forma que, no mês, o Ibovespa acumula agora perda de 2,90%, vindo de uma sequência vencedora, sem rupturas, entre abril e julho – com destaque para o avanço de 9% em junho. No ano, o Ibovespa ainda sobe 7,90%, contabilizando baixa, até aqui, de 0,92% na semana.
Nesta quarta, em dia de cautela moderada também em Nova York (Dow Jones -0,54%, S&P 500 -0,70%, Nasdaq -1,17%), o Ibovespa oscilou dos 117.901,04 aos 119.089,61 pontos, e fechou em baixa de 0,57%, aos 118.408,77, com giro a R$ 23,2 bilhões. As boas exceções ficaram por conta de Petrobras (ON +1,15%, PN +0,79%) – acompanhando alta do petróleo nesta quarta-feira – e do setor elétrico, com destaque para Eletrobras (ON +0,43%, PNB +0,70%), além de Copel (PNB +0,46%) e Cemig (PN +1,08%).
Na ponta do Ibovespa, Via (+3,28%), São Martinho (+3,22%) e Rumo (+2,32%), com CVC (-7,99%), Petz (-6,97%) e Azul (-5,36%) no lado oposto.
Na B3, com preocupações sobre a economia chinesa ainda no radar, o dia foi mais uma vez negativo para Vale (ON -0,90%) e o setor metálico (Gerdau PN -4,04%, CSN ON -1,18%), com exposição ao país. Por sua vez, o setor de bancos seguiu em correção (Santander Unit -1,27%, Bradesco ON -0,72%, Itaú PN -0,36%), o que reforça o movimento defensivo no Ibovespa – o setor financeiro é o de maior peso no índice.
Além dos receios associados à China, a cautela que deu o tom aos negócios nesta quarta-feira, aqui e no exterior, decorreu também da expectativa para os dados de inflação ao consumidor dos Estados Unidos, a serem divulgados na quinta-feira, observa Rachel de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos, após "certo mau humor" do mercado diante da leitura sobre inflação divulgada no início do dia na China.
"A economia asiática se recupera muito lentamente – com o ritmo dos preços ao consumidor registrando queda no mês de julho. O movimento impactou negativamente nossa moeda, e o real operou em baixa nesta quarta-feira", acrescenta Rachel de Sá.
A fraca demanda dos consumidores e as crescentes preocupações econômicas colocaram a China em território deflacionário pela primeira vez em dois anos, o que tende a aumentar a pressão sobre o governo chinês para que atue com mais firmeza para impedir o agravamento das dificuldades, adotando estímulos que induzam a retomada do nível de atividade, apontam especialistas.
No contexto atual, menos propício à demanda doméstica na segunda maior economia do globo, a maior penetração de aço importado no Brasil, com parcela relevante vinda exatamente da China, causa preocupação à Gerdau, tendo afetado o resultado da companhia no segundo trimestre. O CEO da companhia, Gustavo Werneck, defendeu nesta quarta que medidas sejam adotadas pelas autoridades para que, em sua definição, a competição seja justa.
Assim, ponderando fatores externos e domésticos, o apetite por ativos de risco segue contido neste começo de mês, no Brasil.
"Mais um dia de queda para o Ibovespa, a sétima seguida, algo não visto desde junho de 2022. O suporte dos 116,7 mil pontos é importante, e se vier a ser perdido, abre espaço para uma queda maior do índice, o que o levaria a buscar a região dos 110,5 mil – ou seja, mais de 6 mil pontos abaixo do nível de suporte a que nos referimos", diz Stefany Oliveira, head de análise de trade da Toro Investimentos. "Mas, a menos que venha a aparecer um catalisador significativo, o suporte dos 116,7 mil tende a se manter", acrescenta.
"A variação dos estoques nos Estados Unidos contribuiu para que os preços do petróleo subissem na sessão, induzindo movimento comprador nas ações de Petrobras, o que moderou o sinal negativo do Ibovespa, pelo peso desses papéis no índice", diz Stefany.
Segundo o Departamento de Energia (DoE, na sigla em inglês), os estoques de gasolina e de destilados tiveram queda além do esperado nos Estados Unidos na última semana, mas tal variação se fez acompanhar por avanço acima do projetado para os de petróleo.
"O Ibovespa tem se mostrado lateralizado, um comportamento que tem predominado há mais de um mês, o que o mantém, em geral, na faixa dos 118 aos 120 mil pontos. Os agentes têm mostrado cautela também com relação à temporada de resultados trimestrais, mistos. Há empresas reportando queda de lucro, queda de margem, o que é um reflexo ainda do cenário restritivo de política monetária", diz Felipe Moura, sócio e analista da Finacap Investimentos, referindo-se ao efeito defasado entre o momento de elevação de juros e a sua transmissão para a atividade econômica.
"A queda de juros em curso vai demorar ainda um pouco para se refletir no balanço das companhias", acrescenta. Assim, "o mercado começa a se voltar para uma agenda mais micro, os fundamentos das empresas, após o movimento de recuperação do Ibovespa ter sido muito pautado por diminuição de percepção de risco, tanto político como macro e fiscal", diz Moura. "Isso ajuda a entender a cautela. O momento não é o de subir em bloco: algumas ações vão subir, outras não, muito em função das particularidades, dos fundamentos de cada empresa", conclui o analista.
Destaque da agenda econômica doméstica nesta quarta-feira, as vendas do varejo ficaram estáveis em junho na série com ajustes sazonais, após quedas nos dois meses anteriores. No primeiro semestre, as vendas tiveram alta de 1,3%, conforme a Pesquisa Mensal do Comércio, do IBGE.
"O resultado indica a tendência de arrefecimento do comércio varejista após o forte crescimento no início do ano, e é mais um dado a mostrar atividade econômica mais fraca nesse segundo trimestre", observa em nota o economista Rafael Perez, da Suno Research. "O cenário doméstico ainda desafiador deve impedir retomada mais robusta do setor, já que a perda de dinamismo do mercado de trabalho, e o elevado endividamento e inadimplência, tende a afetar o consumo e a demanda por crédito das famílias", acrescenta o economista, ressalvando que "o início do ciclo de queda das taxas de juros e a melhora na confiança dos consumidores podem beneficiar o varejo."