Com investimento de R$ 1,2 bilhão, antiga fábrica da Ford vira centro logístico

Com investimento de R$ 1,2 bilhão o grupo comprador da antiga fábrica da Ford em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, iniciará até junho as obras para transformar em um moderno centro logístico a área que abrigou a linha de montagem de veículos da marca por 52 anos.

Desse valor, R$ 550 milhões foram para a aquisição do complexo de 1 milhão de metros quadrados fechado em outubro de 2019. No mês passado a Ford também decidiu fechar as três fábricas restantes em Taubaté (SP), Camaçari (BA) e Horizonte (CE), que podem ter destino igual a do ABC e trocar a vocação industrial para serviços.

A área de São Bernardo terá 13 galpões modulares em 460 metros quadrados de área construída, com dimensões variadas e possibilidade de serem adaptados às necessidades do locador. Também vai abrigar uma área com praça de alimentação, mercado e academia aberta aos funcionários e à população. A intenção é que metade dos galpões fiquem prontos em maio de 2022 e os demais em outubro de 2023.

Mauro Silvestri calcula que serão gerados entre 4 mil e 4,5 mil empregos quando o complexo estiver todo ocupado. Ele é sócio-fundador da Construtora São José, compradora da área em parceria com a Áurea Asset Management, que tem entre os investidores os fundos do BTG e do Credit Suisse. "A Ford empregava 2,8 mil pessoas", compara.

Para o prefeito de São Bernardo, Orlando Morando (PSDB), "a expectativa dos proprietários é gerar mais de 3 mil empregos e, neste momento em que o País atinge um dos maiores índices de desemprego da história, isso é o mais importante".

Já há interessados na locação de galpões, entre eles empresas metalúrgicas, sistemistas (fornecem kits de peças para montadoras), e-commerce (para entregas na chamada last mile – última etapa da entrega), de alimentos refrigerados e data centers, informa Carlos Carbone, um dos sócios da Pib Incorporadora, empresa que assessora o consórcio. "Será um dos maiores centros logísticos do Brasil."

Especializada em empreendimentos imobiliários e comerciais de alto padrão, a São José atua no setor há 40 anos. Iniciou atividades no próprio ABC construindo galpões industriais, mas saiu do segmento. Diante da oportunidade surgida com a área da Ford, voltou a atuar nesse ramo de negócio.

"É a melhor localização no Brasil para um centro logístico com foco na last mile pois temos o abastecimento da população do Grande ABC, da Baixada Santista e estamos a 10 ou 12 km do centro de São Paulo", afirma Carbone. "Um grande empreendimento dentro de São Paulo como este será muito difícil de acontecer novamente."

Entre os projetos da construtora está o Shopping Plaza Mooca, aberto em 2012 coincidentemente na área que abrigou a fábrica da Ford no Bairro Ipiranga, em São Paulo. Lá eram produzidos caminhões antes da linha ser transferida para o ABC, onde eram feitos automóveis.

<b>Disputa</b>

Com dois empreendimentos em áreas adquiridas da Ford, Silvestri não descarta entrar na disputa pelo terceiro, em Taubaté, onde a montadora fabricava motores. "O futuro a Deus pertence", brinca o executivo. "A gente olha, e se identificarmos oportunidade podemos estudar", diz. Há alguns anos o grupo fez um loteamento residencial ao lado da fábrica.

No ABC, a Ford conseguiu um comprador mais de um ano depois de anunciar o fechamento e após o grupo automotivo Caoa desistir do negócio. Alguns equipamentos vendidos a terceiros ainda estão sendo retirados. Os novos donos aguardam aval da prefeitura para iniciar as obras.

Morando afirma que a saída da Ford "resultou em impacto significativo na arrecadação de ISS e ICMS, porém, com a chegada do novo empreendimento acreditamos na recuperação, com acréscimo de ISS".

Segundo ele, a cidade tem programa de incentivo fiscal para atração de novas empresas e manutenção das atuais. A Lei de Incentivo Fiscal criada em 2017 prevê a redução do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) em até 30% para empresas que gerarem novos empregos.

<b>Shopping</b>

Com capacidade instalada para produzir entre 4,5 e 4,7 milhões de veículos, mas operando abaixo da metade desse volume, o setor automotivo corre riscos de ver outras fábricas serem fechadas no País. "Há grupos que operam em melhores condições, mas outros usam 30% da capacidade", diz Cássio Pagliarini, da Bright Consulting.

Ele vê as áreas de logística e de shopping centers como principais candidatas a ocupar instalações hoje dedicadas à produção industrial, em especial aquelas próximas a centros urbanos.

Pagliarini lembra que outra área onde funcionou uma fábrica de fundição de peças da Ford em Osasco, na Grande São Paulo, também é ocupada hoje por uma empresa de logística.

"Não acredito que instalações usadas por montadoras que eventualmente encerrem a produção sejam ocupadas por outra indústria automobilística", diz o consultor. Ele ressalta ainda que empregos no setor de logística exigem menos qualificação, menos escolaridade e os salários são menores em relação aos pagos por montadoras.

O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Wagner Santana, compartilha da opinião. "Esperamos que, de fato, o novo empreendimento gere milhares de empregos, mas temos certeza de que jamais terão a qualidade que uma montadora pode oferecer." O sindicalista cita que, em média, o setor de serviços paga salários 40% inferiores aos empregos industriais em montadoras. Na área logística, diz ele, a qualidade do emprego pode ser ainda menor em razão de serviços inferiores como plano médico e refeições.

"Por isso insistimos tanto na manutenção de um parque industrial no local, de preferência com outra montadora", afirma Santana. "Menos qualidade do emprego, menores salários e tipo de contratação – temporária ou pela nova CLT – confirmam o que não queríamos, que é o empobrecimento da nossa região."

<b>Instalações</b>

Os novos donos do terreno da Ford no ABC afirmam que vão reaproveitar boa parte das instalações que serão adaptadas para receber os galpões que serão alocados. O prédio onde eram fabricados motores vai abrigar a área de apoio e a praça de alimentação.

O edifício administrativo construído pela Willys – que foi incorporada à Ford em 1967 – será um centro tecnológico direcionado à operações de data center. "Vamos aproveitar também a infraestrutura de instalações, o sistema elétrico que é de grande capacidade, o sistema de combate a incêndio, as vias internas e o sistema de tratamento de esgoto e efluentes – que vai nos ajudar a obter o certificado ambiental com galpões Triple A", afirma Mauro Silvestri, da Construtora São José.

Essa é a classificação mais alta no mercado imobiliário em termos de qualidade, padrão, tecnologia e sustentabilidade.

No prédio da Willys, um mural externo feito pelo artista Clóvis Graciano nos anos 60 também será mantido e restaurado, avisa Silvestri. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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