Com pandemia, incertezas do Campeonato Italiano afetam clubes e jogadores

"Il pallone è fermo". A frase, em italiano, enfatiza que a bola está parada. Exatamente como deve ser, em meio à pandemia da covid-19. Qual pode ser o futuro próximo do Campeonato Italiano? As incertezas são muitas. Alguns clubes como o Brescia (time da cidade homônima que vive situação dramática, com a perda de inúmeras vidas e uma grande incidência de contágios) pedem o encerramento da competição. Outros, como o Torino, se preparam para voltar aos gramados no começo de junho, caso isso seja possível.

Urbano Cairo, que desde 2015 é proprietário do time de Turim, acredita ser necessário salvar a competição e os torneios europeus. "Creio, porém, que não podemos ultrapassar a data de 30 de junho. Isso criaria um enorme problema para o início da próxima temporada", explicou. "Caso o campeonato acabe no final de julho, teríamos de iniciar a temporada seguinte em outubro e isso, sim, complicaria ainda mais a temporada do ano seguinte", continuou o presidente do Torino.

E não só as datas para o recomeço do Campeonato Italiano preocupam os clubes. Há muito mais. Os salários dos jogadores e da comissão técnica também são temas de debate em meio à pandemia. "É preciso que haja um sacrifício de ambas as partes. É notório que grande parte dos times do futebol italiano está endividada, mas agora estamos diante de uma crise mundial e as dívidas já existiam muito antes. Temos de resolver a situação atual", observou Cairo.

O período de interrupção das partidas representa um importante baque nas finanças dos clubes que não podem contar com as entradas da venda de ingressos. Empregos paralelos também são interrompidos. Além disso, caso não seja retomada a temporada 2019/2020, teme-se que a parcela de 430 milhões de euros (quase R$ 2,5 bilhões) pelo direitos de transmissão televisiva não seja repassada, fora o risco de "fuga" de patrocinadores. O desfalque total na receita poderia chegar a 700 milhões de euros (R$ 4 bilhões). Nada grande na Itália está funcionando a não ser os hospitais. Nem a Santa Igreja tem suas portas abertas. Os italianos foram duramente atingidos pela doença.

Alguns clubes de futebol estão adotando medidas para reduzir o impacto econômico. Esta semana, a líder Juventus foi pioneira ao anunciar uma medida: o astro Cristiano Ronaldo e seus colegas de equipe – parados desde o dia 8 de março quando jogaram contra a Inter de Milão – aceitaram uma redução superior a 30% dos salários dos meses de março a junho. Uma economia de 90 milhões de euros (cerca de R$ 500 milhões).

Mas nem todas os clubes tomaram alguma decisão a respeito. Uma fonte do Milan informou que o clube ainda não assumiu nenhuma posição particular sobre o pagamento de salários e que a evolução da situação geral está sendo acompanhada atentamente.

"Para nós, a saúde e a segurança dos associados, funcionários e apoiadores são prioridades", afirmou. E, sobre o reinício do campeonato, completou: "Somos um time de futebol, gostaríamos de entrar em campo novamente o mais rapidamente possível. Quando isso será possível? Somente quando o governo e as autoridades de saúde autorizarem". No dia 21 de março, o Milan comunicou que o ídolo e atual diretor técnico do clube, Paolo Maldini, e seu filho e jogador do time, Daniel Maldini, testaram positivo para o coronavírus, mas estavam em boas condições.

O ministro do Esporte, Vincenzo Spadafora, comunicou através de um vídeo no Facebook que o governo italiano está trabalhando na elaboração de um grande plano para a recuperação de todo o setor parado há um mês. No caso do futebol, seria mais do que bem-vindo. Conduzida pelo jornal Gazzetta dello Sport, uma análise do último balanço financeiro dos 20 clubes que integram o Campeonato Italiano estima um débito geral de 2,5 bilhões de euros (cerca de R$ 14 bilhões). É verdade que a receita aumentou na temporada 2018/2019 e alcança hoje 2,7 bilhões de euros (R$ 15,5 bilhões), mas as despesas também sofreram um incremento (de 3 a 3,5 bilhões de euros). Quando observadas conjuntamente, as perdas das cinco temporadas mais recentes superaram os 44%.

Se os times italianos da primeira divisão vivem dificuldades, o que dizer das outras divisões? A Associação de Futebolistas Italianos (AIC, na sigla em italiano) propõe um fundo formado por diversos integrantes para ajudar seja outras divisões profissionais, o futebol feminino e o futebol amador. "É um momento delicado. Há dias estamos conversando com as várias federações para entender a quanto valem as negociações estabelecidas. Infelizmente, também discutimos a hipótese de que a temporada seja cancelada", comentou por telefone o presidente da AIC, o ex-jogador da Roma Damiano Tommasi. "A proposta é que jogadores e clubes se sacrifiquem. Nossa esperança é que se volte a jogar em maio ou junho e assim se possa garantir os salários dos jogadores de divisões inferiores", espera ele.

Enquanto os atletas de elite se colocam à disposição de seus clubes, os colegas da segunda e terceira divisão correm o risco de não receber os salários nos próximos meses. O brasileiro Claiton dos Santos, de 36 anos, zagueiro da Cremonese, tem um contrato até junho deste ano com o time da Série B. "Sei que no próximo dia 15 irão quitar março, mas já avisaram que os pagamentos referentes aos meses de abril, maio e junho podem não ser efetuados", disse ele, que este ano já havia pensando em se aposentar. "Eu fiz meu pé de meia, mas muitos jogadores em início de carreira ainda dependem desse rendimento mensal. Espero que a AIC e as federações possam chegar a uma acordo".

A incerteza sobre o futuro do Campeonato Italiano, assim como do Inglês, Francês, Espanhol, Alemão e de outros países europeus, pode afetar as competições organizadas pela Uefa. Procurado pela reportagem do <b>Estado</b>, o vice-presidente da entidade, Michele Uva, não quis se pronunciar sobre a situação atual. O dirigente ratificou, porém, a proposta da Uefa em dar continuidade às competições europeias em agosto.

Em entrevista ao jornal Gazzetta dello Sport, Uva disse que não cabe à entidade determinar as datas para início e encerramento dos campeonatos locais, decisão que deve ser tomada pelas federações. O vice-presidente também acrescentou que o importante seria o retorno aos estádio, mesmo sem a presença dos torcedores.

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