Variedades

Com produção em alta, choro vive uma fase próspera

O argumento dos defensores da ideia às autoridades públicas que ainda discutiam se São Paulo deveria ou não ter um Clube do Choro foi indefensável. Afinal, como fica o berço de Garoto? Como se orgulhar de Izaías e Seus Chorões se sua terra não lhe dá uma casa? Clubes de choro são instituições reverenciadas de São Luis do Maranhão ao Japão, passando por Brasília, Madri, Rio de Janeiro, Santos, Paris e Israel. São Paulo ganhou o seu.

O Clube do Choro paulistano abre suas portas na época que tem sido chamada pelos mais otimistas da espécie como “o ano do choro”. A Virada Cultural de junho já havia dado sinais de uma erupção criativa arrebatadora. Pela primeira vez, o gênero teve um palco no evento, uma roda na Praça do Patriarca na qual tocaram por 24 horas e de forma ininterrupta 132 músicos com atuação em São Paulo.

O Clube já está com suas portas abertas no Teatro Municipal Arthur Azevedo, na Mooca. O prefeito Fernando Haddad, que tem dialogado de forma discreta e sistemática com coletivos de músicos pela cidade, cedeu o espaço e deixou a gestão nas mãos dos próprios contemplados. Uma comissão executiva de cinco integrantes promete uma administração democrática. “Essa comissão terá mandato até o final do ano. Vamos pensar nas atividades e deixar o esqueleto pronto”, diz Yves Finzetto, percussionista, um dos integrantes da comissão.

O pulo do gato pode estar na forma da condução do projeto. Para evitar que o espaço caia nas mãos de um único grupo de músicos e que a roda gire apenas para os amigos dos amigos do tal grupo, será eleita uma curadoria provisória que definirá a programação referente a apenas um mês, antes de ser dissolvida para que novos curadores assumam. “Vamos trabalhar também com educação, em parceria com escolas públicas da região”, diz.

O teatro não é uma casa exclusiva. O choro terá sua vez em horários nobres, nos primeiros finais de semana de cada mês. As rodas vão acontecer todos os sábados, das 18h às 20h.

Centro de estudos

Criados aos pés de Luizinho Sete Cordas, um dos principais nomes do violão de sete de São Paulo, descendente direto do obrigatório Dino Sete Cordas, dois chorões alinhados nas fileiras de uma linguagem mais tradicional, os violonistas Euclides Marques e Zé Garcez, uniram forças e espólios para construírem o que está se tornando o primeiro centro de estudos de choro e música brasileira (que eles chamam também de música acústica) em São Paulo. O Espaço Uirapuru, na Vila Mariana, é outro sinal de uma colheita ambiguamente próspera.

Ele funciona no andar térreo de um sobrado em que Euclides vive com a família, em uma rua calma e sem saída da zona sul. Algumas preocupações levaram ele e Garcez a investirem no empreendimento. “Vamos trabalhar com três públicos: aquele que quer tocar um instrumento, aquele que apenas gosta de ouvir música e que pode vir a tocar um instrumento e aqueles especializados em qualidade, fissurados em aparelhos de som audiófilos (com a resultado de reprodução no topo tecnológico). A ideia é juntar essas pessoas aqui”, diz Euclides Marques.

Algumas salas são reservadas para aulas de piano, violão de sete e seis, cavaco, clarinete, flauta, sax, percussão e canto, além de musicalização infantil e prática de conjunto. Um dos professores de violão é o próprio mestre dos sócios, Luizinho Sete Cordas, que catalogou e arquivou caprichosamente em um armário suas 1.100 partituras de choro para consulta dos alunos.
Uma sala maior, para até 40 pessoas, será reservada para pequenas apresentações, que poderão ser gravadas, e audições especiais comentadas de discos de vinil, escolhidos de uma coleção particular de Euclides que conta com três mil títulos.

Euclides Marques, defensor das raízes também das mídias, acredita que há muitos músicos que não sabem ouvir música. E que o ato de ouvir um som pode ser limitado ou não dependendo de onde ele sai. “Não dá para aprender a ouvir música sem o contato com o analógico (vinil). Ele te dá características que o digital não proporciona.”

Sobrevoo

Ao crescer em produção de forma intensa nos últimos anos – como aponta, por exemplo, a quantidade de CDs lançada por novos nomes – o choro cresce e suas fissuras aparecem. Não há um conflito de gerações nem guerra declarada de facções, mas suas extremidades têm posturas firmes e olhares ressabiados. O choro dos que defendem os traços saídos do esquadro de Pixinguinha se preocupam com a liberdade exagerada do improviso e com um eventual culto à agilidade esportiva dos instrumentistas. “Música é para ser ouvida, não vista. E há músicos mais preocupados em mostrar como suas mãos são rápidas”, diz Luizinho Sete Cordas. Por outro lado, o choro é uma música viva e, logo, aberta ao tempo de hoje. Ives o defende assim: “Manter a linguagem é fundamental, mas não podemos esquecer que o próprio Jacob do Bandolim promoveu mudanças importantes nas tradições do choro de seu tempo.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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