Estadão

Com tensão pré-Fed e fiscal, dólar volta a subir e já avança 10% no ano

O dólar abriu a semana em alta firme no mercado doméstico de câmbio, em dia de fortalecimento da moeda norte-americana no exterior e avanço das taxas dos Treasuries longos. Após o resultado expressivo de geração de emprego nos EUA em maio divulgado na sexta-feira, 7, investidores adotaram uma postura mais cautelosa à espera dos sinais do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) em sua decisão de política monetária na quarta-feira, 12. Por aqui, as preocupações com a política fiscal seguem no radar e contribuem para a busca de posições cambiais defensivas.

Na primeira hora de negócios, o dólar até experimentou uma queda momentânea, quando registrou a mínima da sessão, a R$ 5,3155. Em terreno positivo no restante do dia e com máxima a R$ 5,3891 pela manhã, a moeda encerrou o pregão em alta de 0,60%, cotada a R$ 5,3569 – ainda no maior valor de fechamento desde 5 de janeiro de 2023. Nos seis primeiros pregões de junho, o dólar avança 2,02%, passando a acumular valorização de dois dígitos em 2024 (10,37%).

No exterior, o índice DXY – termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes – voltou a superar os 105,000 pontos, com máxima aos 105,385 pontos. O euro caiu mais de 0,30%, após o avanço da extrema direita nas eleições para o Parlamento Europeu.

O dólar subiu na comparação com divisas emergentes. Entre as latino-americanas, destaque para a leve recuperação do peso mexicano, que ainda apresenta, contudo, perdas de mais de 7% em relação ao dólar.

O economista-chefe da Frente Corretora, Fabrizio Velloni, observa que o dólar ganhou força extra no exterior na sexta-feira e nesta segunda-feira após a divulgação de geração forte de empregos nos EUA em maio, que sugerem pouco espaço para o Federal Reserve reduzir juros neste ano. Monitoramento do CME Group mostra que as apostas majoritárias para corte inicial de juros pelo BC norte-americano se deslocaram nesta segunda-feira de setembro para novembro, com chances de mais de 60%.

Não há dúvida de que o BC norte-americano vai anunciar na quarta-feira manutenção da taxa básica na faixa entre 5,25% e 5,50%. As atenções se voltam à projeção de dirigentes do Fed para inflação e juros, no chamado gráfico de pontos, e à entrevista coletiva do chairman Jerome Powell. Em março, na última vez em que projeções foram divulgadas, a maioria dos dirigentes do Fed esperava três cortes de juros em 25 pontos-base neste ano.

Velloni ressalta que houve nesta segunda também uma deterioração adicional do euro com o temor de avanço da ultradireita na Europa, levando o presidente da França, Emmanuel Macron, a convocar no fim de semana eleições antecipadas para o legislativo francês.

"Além do exterior, com menor possibilidade de corte de juros menor nos EUA e a questão na Europa, o real ainda é pressionado basicamente pelo problema fiscal doméstico. Cada vez fica mais claro que há a estratégia de aumentar a arrecadação, sem corte de gastos, não vai funcionar", afirma Velloni, que vê também uma corrosão do capital político do governo no Congresso.

Na sexta-feira, houve estresse no mercado com vazamento de conversas de reunião fechada entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com expoentes do mercado financeiro. Na ocasião, Haddad disse que haveria contingenciamento em caso de aumento das despesas além do esperado. Ele teria revelado também que levaria a questão da indexação do Orçamento, que torna difícil o cumprimento das metas fiscais, ao presidente Lula, a quem caberia a última palavra sobre o tema.

Pulularam leituras e interpretações de frases de Haddad, como sinalização de avanço expressivos das despesas, admissão implícita de que o arcabouço seria inviável sem desindexação orçamentária e até de enfraquecimento político do ministro. O próprio Haddad na sexta-feira tentou esclarecer que deu apenas uma reposta óbvia ao falar da possibilidade de contingenciamento.

"O mercado já vinha com um sentimento de aversão ao risco e teve um episódio de pânico na sexta-feira com o vazamento do Haddad", afirma que o head de banking e câmbio da EQI Investimentos, Alexandre Viotto, que vê uma onda compradora de dólar capaz de levar a taxa de câmbio para o nível de R$ 5,50 no curto prazo. "Parece cada vez mais difícil o Fed cortar juros neste ano, o que deixa o dólar forte no mundo, e no Brasil só aumenta a descrença em torno da meta fiscal."

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