Internacional

Com visita a Israel, Bolsonaro acena a evangélicos, Trump e Netanyahu

O presidente Jair Bolsonaro inicia no domingo, 31, em Israel uma viagem de caráter político e religioso. Com uma mão, Bolsonaro pretende afagar a bancada evangélica, crucial para o avanço de sua agenda no Congresso. Com a outra, ele joga o peso do Brasil na campanha do premiê israelense, Binyamin Netanyahu, que corre risco de perder o cargo nas eleições locais do dia 9.

A primeira missão deve ser cumprida sem muito esforço, mesmo que Bolsonaro anuncie apenas a instalação de um escritório de negócios em Jerusalém, em vez da mudança da embaixada, como havia prometido. Na última semana, o deputado Marco Feliciano (Podemos-SP) afirmou que a decisão seria uma solução provisória, até o Brasil “conseguir apoio da comunidade árabe”.

Nas últimas semanas, a bancada evangélica voltou a chiar. Nos bastidores, eles cobraram a transferência da embaixada e ficaram insatisfeitos com a declaração à Rádio Gaúcha do chanceler Ernesto Araújo de que não há nada definido sobre a mudança. O governo espera que as imagens de Bolsonaro em locais sagrados, como a Basílica do Santo Sepulcro e o Muro das Lamentações, em Jerusalém, sirvam para acalmar a tropa.

Para entender a simpatia dos evangélicos por Israel é preciso voltar no tempo. Doutrinas apocalípticas sempre existiram. A Bíblia, segundo movimentos pentecostais e neopentecostais, não é apenas um amontoado de acontecimentos do passado e um guia de boas maneiras para o presente, é também um plano de Deus para o futuro.

Muitos evangélicos creem que um segundo Cristo chegará à Terra Santa e estabelecerá o reino de Deus na Terra. Forças do mal que jogam contra são anticristos que querem a destruição de Israel. Eles podem ter várias formas: o rei da Assíria, os persas, Hitler, a União Soviética ou Mahmoud Ahmadinejad, ex-presidente do Irã.

Netanyahu e o elo com evangélicos americanos

Proteger Israel é, portanto, uma profecia. Segundo Donald Wagner, professor de religião da North Park University, de Chicago, grupos ligados ao lobby judaico nos EUA e o governo de Israel há muito tempo perceberam o potencial político dos evangélicos e se aproximaram de televangelistas americanos como Jimmy Swaggert, Pat Robertson e Jerry Falwell.

Poucos souberam explorar essa coalizão tão bem quanto Netanyahu, que se tornou premiê pela primeira vez em 1996 e percebeu rápido que os judeus dos EUA caminhavam para a esquerda – mais de 75% dos judeus americanos votaram em candidatos democratas em 2018.

“Segundo Bibi, os jovens serão assimilados em breve e perderão o elo com Israel”, disse Wagner. “Para ele, os evangélicos são uma forma de compensar a perda. Eles formam um lobby poderoso capaz de mudar a política externa americana.”

“Com o tempo, esta lógica foi sendo importada pelas igrejas evangélicas brasileiras, principalmente as Assembleias de Deus e a Igreja Universal”, afirma Guilherme Casarões, historiador da FGV. No Brasil dos anos 2000, foram formadas frentes parlamentares e grupos de apoio a Israel. “Hoje, os evangélicos são uma força dentro dos governos de Trump e de Bolsonaro.”

Arie Kacowicz, professor de relações internacionais da Universidade Hebraica de Jerusalém, reconhece a importância da base religiosa, mas acredita que a visita de Bolsonaro a Israel foi feita para um outro espectador: Trump. “Os líderes da América Latina querem atrair apoio americano. Israel não é o foco principal. O objetivo é os EUA”, disse.

Visita ocorre em reta final de campanha
A segunda missão do presidente brasileiro é mais complicada. É incomum embarcar em uma visita de Estado a um país na véspera de um conturbado processo eleitoral. Mas Netanyahu insistiu na data. Segundo a programação oficial, ele posará para fotos ao lado do presidente brasileiro em três dos quatro dias da viagem.

Para Bolsonaro, não parece ser um problema. Em março, nos EUA, ele já havia declarado apoio à reeleição de Trump. “O prejuízo da diplomacia pessoal é que o Brasil pode ficar sem aliados em pouco tempo”, disse Casarões, que cita o risco de vitória democrata, em 2020, e de Netanyahu perder a eleição.

Pode acontecer

Segundo pesquisas, o Partido Azul e Branco, do ex-comandante das Forças Armadas Benny Gantz, teria hoje 32 cadeiras das 120 do Parlamento, à frente do Likud, de Netanyahu, que ficaria com 28. Ainda é incerto quem teria mais apoio de partidos menores, mas Gantz pode ter a prerrogativa de montar o governo e acabar com o reinado de Bibi.

Em entrevista ao jornal The New York Times, em março, Yair Lapid, um dos líderes do Partido Azul e Branco, afirmou que “se Netanyahu preferiu se aliar a populistas de direita como Bolsonaro”, talvez seja melhor a oposição israelense “buscar aliados em governos liberais”.

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