A Comissão Justiça e Paz de São Paulo lançará nesta sexta-feira,11, uma campanha para pressionar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a doar parte dos R$ 17 milhões que recebeu em doações via Pix para crianças e adolescentes que ficaram órfãos durante a pandemia de covid-19. A ideia é que o ex-chefe do Executivo transfira para esses grupos o que sobrar após o pagamento das multas.
Ao <b>Estadão</b>, o presidente da Comissão Justiça e Paz de São Paulo, Antonio Funari, afirmou que a campanha é uma resposta à declaração feita pelo ex-presidente quanto ao valor restante do montante. "A ideia surgiu quando houve aquela manifestação do Bolsonaro de que o dinheiro que eles receberam dariam para pagar as multas e tomar garapa com pastel. A campanha é uma resposta ao escárnio que ele fez em relação a essa questão", disse.
Na última semana, ao confirmar que recebeu as doações via Pix, Bolsonaro afirmou que os recursos servirão para pagar suas contas e ainda ironizou ao dizer que com a sobra dará para comer "pastel com caldo de cana" com a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
"Obrigado a todos aqueles que colaboraram comigo no Pix há poucas semanas", afirmou. "Dá para pagar todas as minhas contas e ainda sobra dinheiro aqui para a gente tomar um caldo de cana e comer um pastel com a dona Michelle", disse o ex-presidente durante um encontro do PL Mulher em Santa Catarina em julho.
A iniciativa é organizada pelos integrantes da Campanha Contra a Criminalização dos Movimentos Sociais e será divulgada por meio de um abaixo-assinado para entidades e população em geral.
Funari defendeu que a reversão dessa quantia que sobrar em um fundo para auxiliar crianças e adolescentes órfãos durante a pandemia de covid-19 seria uma forma de "ressarcir" essas vítimas. "Se está sobrando dinheiro, depois deles pagarem as multas, seria interessante se eles destinasse esse dinheiro então para atendimento desses órfãos que são vítimas do próprio governo. Seria uma maneira dele ressarcir esse pessoal que foi vítima da covid-19 e vítima também do tratamento que foi dado à pandemia."
A campanha pretende ainda se relacionar com projetos de leis que têm o objetivo de criar auxílios para amparar esses órfãos. "A iniciativa é uma manifestação de apoio às iniciativas legislativas de projetos de lei de atendimento aos órfãos de covid-19. É uma maneira de chamar atenção para os casos dessas crianças que ficaram sem pais e sem mães", afirmou Funari.
A Câmara possui propostas legislativas com ideias de como lidar com esse cenário, como a criação de pensão especial aos órfãos da covid-19, a instalação do programas de proteção, atenção social e cuidado mental para as crianças e adolescentes nesta situação, entre outros.
Um desses projetos, também citado por Funari, é o da deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), que prevê a criação de um fundo especial destinado aos órfãos da covid-19, além de um programa de amparo com auxílio financeiro, cuidado psicológico pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e prioridade no atendimento de serviços públicos. Apresentado em maio de 2021, o Projeto de Lei 126/23 está parado na Mesa Diretora da Câmara desde março de 2023.
Criado pelo cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, nos anos 70, a Comissão Justiça e Paz de São Paulo se transformou em um símbolo de resistência contra as violações de direitos humanos durante a ditadura militar, além de ter amparado perseguidos políticos e familiares.
<b>Pix para Bolsonaro</b>
Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) mostrou que o ex-presidente recebeu R$ 17,1 milhões em suas contas por meio de transferências bancárias realizadas por Pix entre os dias 1º de janeiro e 4 de julho deste ano. O valor arrecadado corresponde à quase totalidade do valor que circulou nas contas de Bolsonaro em 2023: R$ 18.498.532. Os registros bancários feitos pelo Coaf ainda indicam que parte esses recursos teriam sido convertidos em aplicações financeiras.
Em junho, apoiadores de Bolsonaro promoveram uma vaquinha via Pix pelas redes sociais para o ex-presidente. O objetivo era arrecadar dinheiro para o pagamento de multas judiciais, sob a justificativa de que ele era vítima de "assédio judicial" e que precisava de ajuda para quitar "diversas multas em processos absurdos". Aliados de Bolsonaro publicaram nas redes sociais comprovantes de depósitos que iam de R$ 10 a R$ 1 mil.
Como mostrou o <b>Estadão</b>, o ex-presidente distribuiu diretamente para a própria família parte dos R$ 17,1 milhões que arrecadou via Pix. A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, a lotérica do irmão dele, Angelo, e a síndica do condomínio onde vive o filho Eduardo, em Brasília, receberam, juntos, R$ 148,3 mil, entre janeiro e julho deste ano.