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Congresso e Moraes marcam posição sobre cassação e elegibilidade de Silveira

Representantes da cúpula do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) delimitaram publicamente ontem a atuação de cada um dos dois Poderes no caso do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), após o presidente Jair Bolsonaro perdoá-lo de condenação imposta pela Corte. Presidentes do Senado e da Câmara, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL) disseram que cabe ao Legislativo a palavra final sobre cassações. Em despacho na ação penal contra o parlamentar, o ministro-relator, Alexandre de Moraes, afirmou que Silveira, apesar do ato presidencial, está inelegível.

As manifestações refletem uma negociação iniciada entre os chefes das Casas Legislativas e ministros do STF para buscar uma solução à crise institucional. Ela passa por um entendimento acerca da prerrogativa da Câmara de avaliar a manutenção do mandato do deputado, enquanto seria mantida a decisão do STF de torná-lo inelegível. A Corte reconheceria a prerrogativa de Bolsonaro de conceder o perdão, deixando-o livre da cadeia.

O primeiro a defender ontem o protagonismo do Congresso no caso foi Pacheco. Segundo ele, a cassação de Silveira precisa passar pela análise da Câmara. "(Em) Uma situação de decretação de perda de mandato por parte do Judiciário, há a necessidade de se submeter à Casa Legislativa, para que a Casa Legislativa decida sobre isso", disse o presidente do Senado a jornalistas após participar de seminário do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília.

No dia em que Bolsonaro publicou perdão à pena de oito anos e nove meses de prisão de Silveira, Pacheco afirmou, em nota, que o ato não poderia ser revogado, mas deputado não poderia se candidatar. A declaração vai ao encontro do posicionamento de Moraes, que tratou do assunto no despacho em que mandou anexar o decreto presidencial à ação penal na qual o parlamentar foi condenado por incitar a violência contras ministros do STF e atacar a democracia.

A Corte mandou também a Câmara cassar Silveira – há questionamentos se a decisão deve ser automaticamente cumprida ou submetida ao plenário, e se o perdão atinge as punições além da pena de prisão. Por se tratar de condenação em órgão colegiado, o deputado não poderia se candidatar, de acordo com a Lei da Ficha Limpa. Bolsonaro concedeu ao aliado a chamada graça, com perdão irrestrito, e disse que a medida será cumprida.

De acordo com Pacheco, "a melhor inteligência da Constituição" indica que a apreciação de cassação cabe a "maioria dos pares" no Legislativo. "Mandato outorgado pelo voto popular só pode ser retirado pela própria Casa Legislativa através da votação de seus pares", afirmou Pacheco.

<b>Prerrogativa</b>

Cinco dias após Bolsonaro conceder o perdão, Lira se manifestou sobre o caso do colega. O presidente da Câmara disse que cassação é prerrogativa do Congresso. Enquanto o STF julgava Silveira, Lira recorria para que o Legislativo tenha a palavra final após decisões da Corte, que tem defendido que o Congresso Nacional tem apenas de cumpri-las.

"O recurso que nós fizemos não se trata, absolutamente, de nenhum caso específico, é para que a gente ratifique, claramente, o entendimento que as duas Casas (Câmara e Senado) têm. Em detrimento de condenação, a cassação do mandato parlamentar só pelo Congresso Nacional", disse Lira, ao ressaltar que a Casa "não abre mão" dessa prerrogativa constitucional.

Segundo ele, o entendimento da assessoria jurídica da Câmara dos Deputados é de que o Supremo tem a competência para julgar, o presidente da República tem a prerrogativa de conceder o perdão e o Congresso é que tem de decidir sobre mandato parlamentar.

No seu despacho, Moraes afirma que o decreto em favor de Silveira não alcança a inelegibilidade, conforme entendimento pacificado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ele escreve que o ato foi anexado para analisar se o perdão pode ser concedido antes do trânsito em julgado – antes de esgotados todos os recursos da defesa e da acusação – e para definição dos efeitos secundários, como não poder se candidatar.

A decisão de Alexandre não tem relação com a análise da constitucionalidade do decreto, a qual será feita pelos ministros da Corte durante o julgamento de ações que questionam o perdão concedido e estão sob relatoria da ministra Rosa Weber. A magistrada deu dez dias para que o Planalto se manifeste. Ainda não há data para que o Plenário da Corte analise o caso.

<b>Respeito</b>

No entanto, Moraes escreve que, apesar de a concessão da graça ser ato discricionário e privativo do chefe do Poder Executivo, ela "não constitui ato imune ao absoluto respeito à Constituição Federal". Dessa forma, o decreto é passível de controle pelo Judiciário, que se incumbe de analisar se as normas contidas na medida "estão vinculadas ao império constitucional".

O ministro ainda intimou a defesa de Silveira a se manifestar, em 48 horas, sobre o perdão e também o descumprimento de medidas cautelares por parte do deputado. Como mostrou o <b>Estadão</b>, a Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal informou ao Supremo anteontem que a tornozeleira eletrônica do deputado está descarregada desde 17 de abril, domingo de Páscoa. Ontem, ele foi ao Congresso e disse que estava sem o equipamento. Após a manifestação da defesa, a Procuradoria-Geral da República terá 48 horas para se manifestar sobre o assunto.

<b>Tensão</b>

Bolsonaro manteve a tensão elevada no embate com o Judiciário. Ontem, ele fez novas críticas ao Supremo, sem citar explicitamente o caso de Silveira. "Não podemos admitir que alguns de nós, que podem ter certos poderes, interfiram no destino da nossa Nação", afirmou o presidente ao participar da abertura da 23.ª Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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