Um consultor do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) faturou ao menos R$ 2,4 milhões para facilitar o recebimento de verbas por prefeituras do Maranhão. Com acesso livre aos sistemas internos da instituição, que funciona como uma espécie de "banco" do Ministério da Educação (MEC), o engenheiro civil Darwin Einstein de Arruda Nogueira Lima é ao mesmo tempo dono de uma empresa de engenharia que fechou contratos de centenas de milhares de reais com as prefeituras atendidas pelo FNDE.
Desde fevereiro de 2019, a Nogueira Lima Serviços e Construções fechou contratos com pelo menos 15 prefeituras maranhenses, que somaram empenhos de R$ 10,5 milhões do FNDE.
Loteado pelo Centrão, o fundo é presidido por Marcelo Ponte, um apadrinhado do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira. Em uma série de reportagens, o <b>Estadão</b> revelou que os recursos do FNDE são distribuídos por um esquema montado pelo ministro e que envolve não apenas políticos ligados ao seu partido, o Progressistas, mas também ao PL, legenda do presidente Jair Bolsonaro, e ao Republicanos.
No Instagram de Darwin Lima, eram comuns fotos com Marcelo Ponte e outros dirigentes do fundo. Uma das imagens mostra Darwin com o diretor de Ações Educacionais do FNDE, Garigham Amarante, e outros servidores em frente a um avião da Força Aérea Brasileira (FAB), em 14 de agosto passado. "Time top!", elogiou Marcelo Ponte. Recentemente, o engenheiro apagou a conta na rede social.
Além de Garigham Amarante, apadrinhado do PL de Valdemar Costa Neto, Darwin Einstein é ligado também a outro diretor do FNDE, Gabriel Vilar, indicado pelo Republicanos. No começo deste mês, o Estadão mostrou como Amarante e Marcelo Ponte atuaram para inflar o preço máximo de um pregão para a compra de ônibus escolares rurais em R$ 732 milhões. O engenheiro ainda tem vínculo estreito com o deputado federal Josimar Maranhãozinho (PLMA), investigado pela Polícia Federal por crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
As cidades maranhenses de Raposa, Cachoeira Grande, Santa Luzia, Cândido Mendes, Brejo de Areia, Pedro do Rosário, Alto Parnaíba, Dom Pedro, Nova Iorque, Pastos Bons, Paraibano e Penalva somaram empenhos de R$ 10,5 milhões do FNDE desde 2019.
Todas contrataram a empresa de Darwin. Já o município de Gonçalves Dias (MA) não teve novos empenhos, mas conseguiu receber R$ 161,7 mil que estavam nos chamados "restos apagar ". O empenho é a primeira etapa da execução orçamentária e é oque permite à prefeitura contratar uma empreiteira e dar início a uma obra, por exemplo.
<b>AUDIÊNCIAS.</b> Na última terça-feira, a Comissão de Educação do Senado aprovou um convite a Darwin Lima, Garigham Amarante, Gabriel Vilar e mais cinco pessoas relacionadas aos indícios de corrupção no Ministério da Educação (MEC) e no FNDE. As audiências devem acontecer no fim de abril e no começo de maio, mas os convidados não são obrigados a comparecer.
Darwin Lima trabalhou para o FNDE pela primeira vez de junho de 2009 a dezembro de 2012. A última temporada de trabalho como consultor do fundo começou em 2020, e durou pelo menos até março deste ano.
Na avaliação do advogado Mauro Menezes, a situação configura um "conflito de interesses". "Uma vez comprovado ( o vínculo com o FNDE e a empresa), nós temos aí sim um conflito de interesses rematado, com a vinculação indevida do interesse público a um interesse privado", disse ele, que presidiu a Comissão de Ética Pública da Presidência da República. "Temos uma espécie de advocacia administrativa, em benefício de interesses privados próprios. Uma exploração de prestígio ou tráfico de influência."
<b>ACESSO.</b> O <b>Estadão</b> obteve imagens mostrando acessos de Darwin Lima aos sistemas internos do MEC e do FNDE usados para gerir a liberação de verbas para as prefeituras. Ele tinha até mesmo uma vaga na garagem da sede – uma Land Rover e uma Mercedes C250 estavam autorizadas a usá-las.
Com o fundo nas mãos de políticos do Centrão, Darwin Lima passou a rodar o País ao lado de Garigham Amarante e Gabriel Vilar apresentando os projetos da autarquia a prefeitos. Nos últimos 12 meses, o FNDE gastou ao menos R$ 81,6 mil em 25 viagens dele, segundo dados do Portal da Transparência. Foi em uma dessas viagens que Darwin Lima postou uma foto na frente de um avião da FAB.
Os municípios que fecharam contratos com a empresa de Darwin Lima possuem uma característica em comum: todos estão na esfera de influência do deputado Josimar Maranhãozinho. Em publicações nas redes sociais, o engenheiro se refere ao deputado como "chefe".
"Reunião com meu deputado mais bem votado da história do Maranhão, o moral da BR, Josimar Maranhãozinho!!! O chefee!!!", escreveu Lima num post no Instagram no dia 19 de fevereiro de 2020.
O engenheiro também usou o mesmo termo para se referir à deputada estadual maranhense Maria Deusdete Lima Cunha Rodrigues, a Detinha (PL), mulher de Maranhãozinho. "Nossa futura prefeita de São Luís! Minha chefa!!!", diz uma postagem dele no Facebook em 4 de março de 2020.
<b>ORÇAMENTO SECRETO.</b> Dos R$ 10,5 milhões empenhados pelo FNDE para as prefeituras que contrataram a empresa de Darwin Lima, R$ 7,04 milhões, ou seja 66,5%, foram de verbas do orçamento secreto, esquema criado pelo governo de Jair Bolsonaro para garantir apoio político ao Executivo no Congresso. Em março deste ano, Josimar Maranhãozinho foi alvo de uma operação da Polícia Federal por suspeitas de desviar verbas de emendas parlamentares – ele nega irregularidades.
Ao mesmo tempo em que atuava dentro do FNDE, Darwin Lima se reunia com os prefeitos que contratavam sua empresa de engenharia. No dia 9 de abril de 2021, a Nogueira Lima Serviços foi contratada pela prefeitura de Cachoeira Grande (MA), cidade de 9,4 mil habitantes a 98 quilômetros de São Luís, por R$ 271,8 mil.
Pouco depois, em 23 de junho passado, o prefeito da cidade, Cesar Castro (PL), se reuniu com Darwin em Brasília. O FNDE empenhou R$ 160,5 mil para a cidade no ano passado. Em 2020, já tinha empenhado outros R$ 290,9 mil.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>