Estadão

Contas para crianças ganham fôlego no País e viram novo filão para bancos

Para dar mais autonomia ao filho Arthur, de 11 anos, a funcionária pública Lígia da Costa decidiu abrir para ele uma conta bancária. Um ano depois, avalia que sua decisão foi acertada: hoje vê o filho arriscar alguns investimentos, falar com o gerente de sua conta, pagar sozinho jogos e recarregar seu celular. E um ponto que a tranquilizou foi o fato de que só são permitidas transações à vista, com o saldo que ele tem em conta (proveniente dos depósitos que ela faz). Além disso, é avisada sobre qualquer movimentação que o filho faça. "Criança também pode investir, criança também é gente", diz Arthur.

A conta de Arthur é uma das cerca de 10 milhões hoje no Brasil para menores de idade, conforme projeção das instituições financeiras. É um dos nichos que mais têm crescido no País, com bancos tradicionais e fintechs passando a olhar cada vez com mais interesse para o filão. Conforme os dados mais recentes do Banco Central, são 23 milhões de contas abertas entre jovens de 15 a 24 anos – crescimento de 50% na última década.

Essa expansão reflete o novo olhar das instituições financeiras para o público. Além do interesse de iniciar o relacionamento bancário cada vez mais cedo com seus clientes, e assim driblar um ambiente cada vez mais competitivo, o passo foi obrigatório para ir ao encontro das necessidades de um mundo cada vez mais digital.

"No passado, as crianças simplesmente recebiam dinheiro para fazer transações e comprar o que precisavam, mas em um mundo digital elas precisam de uma carteira ou conta bancária que permita transações no mundo digital e físico. Isso significa que as antigas regras que restringem contas bancárias a adultos são impraticáveis e excludentes", afirmou Brett King, autor do livro Bancos 4.0, que foi consultor de políticas de fintechs no governo de Barack Obama.

<b>Para bebês</b>

Pelas regras do BC, menores de idade podem ser titulares de contas, desde que representados pelos pais, quando menores de 16 anos. Nesse caso, apenas os responsáveis assinam o contrato de abertura. Entre 16 anos e a maioridade, pai e filho assinam o contrato. Outra mudança de regra que ampliou esse mercado foi de documentação: hoje, o número do CPF já está na certidão de nascimento. Assim, até mesmo um recém-nascido pode ter conta no País.

O responsável pelo desenvolvimento da área de negócios do Next, banco digital do Bradesco, Ricardo Urada, afirma que o produto da casa, batizado Next Joy, lançado em 2020, mais do que dobrou de um ano para outro. A decisão foi de oferecer esse tipo de conta aos pais e responsáveis que já têm conta no banco digital. Com as contas conectadas, um pai pode programar mesadas aos filhos ou estabelecer missões, como fazer a lição de casa em troca de recompensas.

"É uma forma de começar o relacionamento. Os bancos estão jogando a rede cada vez mais longe e ampliando seu mercado. Estamos pensando no caminho de longo prazo, em começar a entender esse cliente agora para lá na frente colher os frutos", diz Urada. No Next, há uma parceria com a Disney. A ideia é de que o uso dos personagens torne a experiência lúdica para as crianças.

O banco digital C6, por sua vez, lançou a conta Yellow como forma de tornar sua prateleira de produtos mais completa, diz o responsável de produtos e pessoa física do C6, Maxnaun Gutierrez. Os responsáveis também precisam ter conta no banco, interligada à da criança ou do adolescente.

"A estratégia de ser um banco completo e concentrar o relacionamento dentro da nossa plataforma passa por estar dentro da família", afirma Gutierrez. Um efeito já notado quando um pai abre uma conta para o filho é que seu engajamento aumenta, já que acaba entrando mais no aplicativo do banco.

<b>Objetivos</b>

O filho de Gutierrez, Teo, de oito anos, tem sua conta Yellow. Ele diz que o C6 permite que os pequenos estabeleçam uma meta financeira: no caso de Teo, o objetivo é a compra de um computador até o fim de 2023. Mensalmente, o executivo deposita R$ 150, que Teo investe em um CDB do próprio banco. O investimento pode começar em R$ 10. A criança pode escolher ter seu próprio nome ou um apelido impresso no cartão. Fã do anime Naruto, Teo elegeu o sobrenome do personagem: Teo Uzumaki.

O Itaú lançou, em março, uma conta voltada ao mundo gamer, batizada Player s Bank, inicialmente restrita a maiores de 18 anos. "Tão logo lançamos houve uma demanda para diminuir a barra", conta Ricardo Scussel, responsável pela área de produtos do Itaú Unibanco. Foi assim que a conta Start foi lançada em agosto, com 100 mil solicitações de abertura. "A comunidade gamer é muito grande e conseguimos abrir uma conexão", comenta. Não é necessário que o pai seja correntista do Itaú.

Toda essa personalização para atrair as crianças tem razão de ser, de acordo com o especialista em inovação bancária Bruno Diniz. Segundo ele, a interface do banco, projetada para o público adulto, não tinha atrativo para os mais jovens, e foi identificado que era necessário deixar o produto mais com a cara do novo público-alvo. "Depois disso, esse cliente poderá evoluir internamente dentro da instituição."

A planejadora financeira Wanessa Guimarães afirma que abrir uma conta financeira para o menor de idade pode ser uma forma de estimular a poupança e o controle de gasto. "É uma oportunidade para se estimular a poupar uma parte do que se ganha, da mesada creditada e até estimular investimentos." Wanessa dá ainda uma dica aos pais que querem ver os filhos administrando bem os recursos: dar um bônus, que pode ser anual, em relação ao saldo total poupado.

<b>QUEM JÁ OFERECE</b>

<b>Next Joy</b>

Taxa de manutenção: gratuita
Saque: gratuitos e ilimitados
TED/DOC: gratuitos e ilimitados. Faz Pix, permite programação de depósito da mesada e personalização do aplicativo com personagens da Disney. Possui cartão de débito. É obrigatório que o responsável tenha conta Next

<b>C6 Yellow</b>

Taxa de manutenção: gratuita
Saques: gratuitos e ilimitados
TED/DOC: gratuitos e ilimitados. Faz Pix e tem cartão de débito personalizável. Permite cadastrar mesada e criar metas para o uso futuro do dinheiro. Aplicativo envia SMS dos gastos realizados. Responsável precisa ter conta no banco digital. Oferece investimento em CDB

<b>Player s Bank</b>

Taxa de manutenção: gratuita
Saques: gratuitos e ilimitados
TED/DOC: gratuitos e ilimitados. Faz Pix. Saldo tem rendimento de 100% do CDI. Acesso a descontos em videogames. Tem cashback e cartão que pode ser personalizado. A partir 14 anos

<b>Inter Kids</b>

Taxa de manutenção: gratuita
Saques: gratuitos e ilimitados
TED/DOC: gratuitos e ilimitados. Faz Pix. Permite acompanhamento do responsável, que não precisa ter conta na instituição. Oferece investimentos de baixo risco, como CDBs. Possui cartão de débito

<b>Nu Kids/Nu teens</b>

Taxa de manutenção: gratuita
Saques: gratuitos e ilimitados
TED/DOC: gratuitos e ilimitados. Faz Pix. Permite acompanhamento do responsável, por meio de conta ligada à conta principal. É possível programar mesada. Oferece investimentos de baixo risco, como CDBs. Possui cartão de débito.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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