Variedades

Coração de Cachorro une recordações de infância sobre o presidente dos EUA

Há uma velha piada entre críticos sobre filmes com cães como personagens. Seriam obras para cinófilos ou para cinéfilos? A gracinha não se aplica a este Coração de Cachorro, da cineasta e multiartista Laurie Anderson.

Certo. Há cachorro no título e também na obra – trata-se da cadelinha Lolabelle, de Laurie. Mas tudo vai muito além de enredos enternecidos sobre pets, que, diga-se, fazem o maior sucesso hoje em dia, já que os irracionais despertam mais simpatia que seres humanos. Acontece que Laurie, a pretexto de falar da cadela, fala, de fato, de perdas. E de morte.

A obra é um sutil amálgama de lembranças, trechos de filmes antigos, desenhos e meditações sobre a vida, narradas pela própria autora. Aqui e ali, essas reflexões são temperadas pelo humor. Mas o tom predominante é um tanto aziago. Afinal, Laurie fala da infância, mas também do seu tempo contemporâneo. Tempo difícil, em especial nas transformações pelas quais passam os Estados Unidos após o 11 de setembro. Laurie testemunha como o país se torna controlador e insensível. Como, a pretexto de combater o terrorismo, os direitos individuais vão sendo ameaçados e a linha que separa o controle de atividades criminosas e a pura bisbilhotice se torna tênue.

Esse é um dos aspectos. Outro, as memórias de infância, quando Laurie se recorda, por exemplo, de um acidente, junto com os irmãos, que caíram na água quando a superfície gelada de um lago se rompeu. Conta que os salvou e foi elogiada pela mãe. “Nunca me senti tão próxima a ela”, diz. Fala, seguidamente, da doença da mãe e de como a acompanhou. Mas a piedade não a faz esquecer de todas as dificuldades de relacionamento. Laurie busca a emoção. Não deixa que a pieguice lhe embote o julgamento.

E, sim, há a trajetória da cadela Lolabelle, uma fox terrier. O caso, para quem tem cachorro é que eles, em média, vivem muito menos que humanos. Crescem, envelhecem e morrem mais rápido. De modo que a certa altura, Lolabelle está velhinha e doente. E Laurie é aconselhada, pelo veterinário, a sacrificá-la. Mas decide que a cadela tem direito a viver a sua morte, o que não deixa de ser um ato de respeito e de dignidade muito humano.

Esse painel multiforme proposto pelo filme será objeto do Cine Psique, no CineSesc (rua Augusta, 2.075). Às 19h20, o filme será exibido e, em seguida, haverá debate entre a pesquisadora de cinema Ilana Feldman e o psiquiatra Daniel Martins de Barros, mediado pelo crítico e cineasta Ricardo Calil. O tema é o cinema como criador de representações capazes de entender os distúrbios psíquicos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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