Economia

Corporações utilizam Holanda e Luxemburgo como ponte para investir no País

Em busca de vantagens tributárias, corporações globais têm utilizado economias menores da Europa, como Holanda e Luxemburgo, como interposto para investimentos produtivos no Brasil. Dados do Banco Central mostram que no ano passado US$ 10,524 bilhões vieram da Holanda para o Brasil e foram aplicados em participação em empresas locais. No caso de Luxemburgo, foram US$ 7,395 bilhões.

A Holanda lidera o ranking do BC de Investimento Direto no País (IDP) há quatro anos, à frente até mesmo dos EUA, que possui dezenas de companhias com atuação global. Luxemburgo aparece há anos nas primeiras posições. Mas boa parte destes recursos não tem origem nos dois países.

Especialistas ouvidos pelo Broadcast (serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado) explicam que isso é consequência direta da globalização financeira, que faz o capital migrar para países onde a tributação é menor.

“A Holanda funciona hoje como um paraíso fiscal. Suas condições de tributação, principalmente sobre o lucro, são extremamente interessantes quando comparadas com outros países dentro do continente europeu”, explica Otto Nogami, professor de economia do MBA Insper. “A empresa nem precisa ter uma subsidiária produtiva dentro da Holanda, basta ter um escritório. É este escritório que vai receber os recursos e aplicar em outros mercados, como o Brasil.”

O presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), Luis Afonso Lima, explica que as facilidades são usadas, por exemplo, por investidores norte-americanos. “A Holanda investe aqui porque é passagem de capitais e tem muitos acordos comerciais com outros países. Muitos capitais americanos, por exemplo, preferem passar pela Holanda para depois irem ao destino final”, diz.

Em 2016, o investimento direto dos EUA em participação no capital de empresas foi de US$ 6,544 bilhões – abaixo do valor vinculado a Holanda e Luxemburgo. No entanto, a cifra americana seria muito maior, já que estes números do BC levam em conta o fluxo de recursos e apenas o investidor imediato – e não o investidor original.

No caso específico da Holanda, uma boa parcela dos aportes produtivos no Brasil está, de fato, vinculada a companhias holandesas. Nogami lembra que gigantes globais como C&A (varejo), Shell (energia), ING (setor financeiro), Heineken (bebidas) e Philips (eletrônicos) possuem negócios consolidados no País, que demandam investimentos constantes.

“Mas é difícil alguém citar alguma empresa de Luxemburgo presente no Brasil”, diz Lima. Segundo ele, Holanda e Luxemburgo são países importantes nesta triangulação de recursos para o Brasil, mas não são os únicos. Pelos dados do Banco Central, lugares como Ilhas Virgens Britânicas (US$ 1,637 bilhão), Ilhas Cayman (US$ 364 milhões), Bermudas (US$ 266 milhões) e Bahamas (US$ 125 milhões) investiram recursos em empresas no Brasil em 2016. Provavelmente, a maior parte do capital teve origem em outros países, como os EUA.

Anualmente, o Banco Central realiza o Censo de Capitais Estrangeiros, que busca avaliar não o fluxo (dinheiro que entra), mas sim o estoque (capital estrangeiro que permanece investido no País). Por meio dele, é possível verificar qual é realmente a origem do dinheiro que vem para o Brasil – e não apenas o país que é o investidor imediato.

Os dados mais recentes, de 2014, mostram que, de um total de US$ 523,579 bilhões de capital estrangeiro investido no Brasil, US$ 111,715 bilhões (ou 21,34%) tiveram origem nos EUA. Outros US$ 71,352 bilhões (13,63%) vieram originalmente da Holanda e apenas US$ 14,223 bilhões (2,72%) de Luxemburgo. Estados Unidos, Holanda, Espanha, Reino Unido, França, Japão e Alemanha são os países que mais mantém recursos produtivos no Brasil, considerando a origem do dinheiro.

Potencial

Em 2016, o interesse das companhias pelo Brasil levou o IDP total aos US$ 78,929 bilhões. O número leva em conta tanto o investimento em empresas quanto as operações de empréstimos intercompanhias. O bom resultado – mais do que suficiente para compensar o déficit em conta corrente de US$ 23,507 bilhões do País – ocorreu a despeito da crise econômica.

A explicação para isso é o potencial consumidor do País. “Que interesse uma empresa tem de entrar em um mercado com 20 milhões, 30 milhões de habitantes? Nenhum”, pontua Nogami. “Mas não podemos nos esquecer de que nossa economia é formada por mais de 200 milhões de consumidores em potencial. É um mercado que você não encontra facilmente mundo afora.”

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