A economia era o grande trunfo de Donald Trump na campanha à reeleição, e parecia guiar o republicano por um caminho fácil para mais quatro anos na Casa Branca, até que a pandemia de coronavírus colocou os Estados Unidos em uma recessão comparável apenas à Grande Depressão.
O presidente é bem avaliado pela condução econômica, mas a falta de estratégia contra o coronavírus atingiu sua maior vantagem: salários e empregos. A retomada dá sinais de melhora, mas a incerteza paira no ar de um país pressionado pela segunda onda de contágio, com 90 mil novos casos diários.
"A economia dos EUA tem se recuperado de forma constante, mas agora temos outra onda bastante séria de casos de coronavírus", afirma Barry Eichengreen, economista e professor da Universidade da Califórnia em Berkeley. "Há sinais de redução da confiança do consumidor, fato que o mercado de ações parece ter reconhecido. Já deveríamos ter aprendido que você só se sai bem economicamente se controlar a propagação do vírus. E os EUA estão falhando nesse aspecto."
Trump exagera ao dizer que propiciou a "melhor economia da história", mas tem bons dados para exibir. Joe Biden diz que o tombo não teria sido tão grande se ele tivesse controlado o vírus e garante que usará a experiência da vice-presidência na crise de 2008 para devolver o esplendor econômico aos americanos. Trump rebate que o democrata vai impor quarentenas para controlar a covid e ameaçar a recuperação.
Há razões para Trump se apegar à economia. A taxa de desemprego era a mais baixa do último meio século nos EUA, no patamar de 3,5%, antes da pandemia. Em fevereiro, pesquisa Gallup mostrou que quase 60% dos americanos diziam estar melhor financeiramente do que no ano anterior. Trump pegou a economia em crescimento, com ápice da criação de empregos no segundo mandato de Obama.
Os democratas dizem que Trump herdou um caminho já pavimentado para os bons índices. O desemprego vinha caindo desde 2011 e, no mês de sua posse, já era baixo: 4,8%. Mas Trump pode colocar na sua conta indicadores que deslancharam, como o aumento médio nos salários da classe média. O mercado de trabalho superaquecido também diminuiu o desemprego de minorias, como negros e latinos, e a confiança do consumidor cresceu. Tudo foi por água abaixo. No auge das medidas de isolamento, a proporção de desempregados explodiu para quase 20%. Mais de 14 milhões de pessoas perderam empregos. As boas notícias da economia, segundo Trump, são mérito de seu governo. As ruins, culpa do "vírus da China".
<b>China</b>
Trump prometeu trazer empregos da indústria de volta e reduzir o déficit comercial com a China. O déficit, no entanto, aumentou. "A abordagem atual de unilateralismo e de tarifas falha em cada uma das dimensões de cooperação e interconectividade de cadeias de valor, redução de barreiras comerciais e, inclusive, negligencia os próprios trabalhadores americanos. Todos perderam", afirma Renata Amaral, professora na American University e fundadora da rede Women Inside Trade.
A dívida pública, que já estava alta, explodiu para o tamanho do PIB e deve chegar ao pior patamar desde a 2.ª Guerra. Eichengreen diz que Trump mesclou aspectos de uma economia populista com pontos da política econômica tradicional dos republicanos. "Mas ele não tem sido fiel a nenhuma das duas abordagens." Entre as medidas populistas, ele destaca o desrespeito às regras fiscais e o socorro a grupos determinados, como fazendeiros, prejudicados pela queda de braço travada com a China.
Eichengreen menciona ainda o corte de impostos "especialmente para os ricos" e a agenda de desregulamentação econômica. "Um populista não seguiria políticas que favorecessem tanto os ricos e um verdadeiro membro do Partido Republicano não mostraria tanto desprezo pelos déficits. Trump é único e está lutando por si mesmo."
<b>Mercados esperam estímulos para acelerar economia</b>
O otimismo superou a preocupação e os mercados reagiram com confiança no dia da eleição para a Presidência dos Estados Unidos. Nesta terça, 3, o índice Dow Jones, da Bolsa de Nova York, o Ibovespa, no Brasil, e as principais bolsas da Europa e da Ásia fecharam os pregões em alta.
Apesar de terem simpatia pelo republicano Donald Trump, os investidores ponderaram que uma vitória de Joe Biden pode significar um pacote maior de estímulos do governo para acelerar a recuperação da economia do país após os efeitos da covid-19.
Ainda sem o resultado da eleição, os mercados consideraram probabilidades sólidas de uma onda azul, "o que implica em estímulo fiscal e emissão de dívida em 2021 significativos", segundo analistas do banco de investimentos Brown Brothers Harriman, em referência ao cenário em que os democratas estariam no controle da Casa Branca, da Câmara e do Senado norte-americano.
Além de uma batalha na Justiça pelos votos, o maior temor dos investidores ontem era que uma vitória democrata signifique aumento dos impostos para as empresas, em sentido contrário à política tributária adotada por Trump. Na avaliação da estrategista-chefe da Rico Investimentos, Betina Roxo, o mercado continuará reagindo positivamente, caso não haja sinal de que o próximo governo pretende aprovar medidas impopulares, como o aumento de tributos.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>