Para muitos americanos de origem asiática, o massacre de Atlanta, que deixou oito mortos – entre eles seis mulheres asiáticas -, não foi surpreendente. Entre as comunidades espalhadas pelos Estados Unidos, o ataque foi visto como o exemplo mais recente da violência racial dirigida contra asiáticos durante a pandemia.
Entre 19 de março de 2020 e 28 de fevereiro de 2021, houve 3.795 relatos de incidentes que variam de comentários racistas a ataques violentos contra asiáticos. Segundo dados do Centro de Estudos do Extremismo da Universidade Estadual da Califórnia, no ano passado, os crimes de ódio contra asiáticos nas 16 das maiores cidades americanas aumentaram 150% em relação ao ano anterior – ainda que o total de crimes de ódio denunciados à polícia tenha diminuído durante a pandemia.
Entre as grandes cidades, Nova York foi a que registrou o maior aumento. Em 2020, houve 28 incidentes. Em 2019, apenas 3, de acordo com dados do departamento de polícia da cidade. Só no mês passado, vários ataques a vítimas asiáticas foram denunciados à polícia, incluindo a violência contra uma idosa que foi empurrada para fora de uma padaria no Queens. Mas nenhum dos incidentes foi registrado como crime de ódio. Na verdade, a única pessoa processada por crime de ódio contra um asiático em Nova York este ano foi um taiwanês, acusado de pichar mensagens contra a China.
No sudeste dos EUA, onde fica Atlanta, as comunidades asiáticas vêm denunciando o aumento dos crimes de ódio. Esta semana, flores foram colocadas diante dos spas onde Robert Aaron Long, homem branco de 21 anos, matou oito pessoas na terça-feira. "A supremacia branca está literalmente nos matando", disse Stephanie Cho, diretora da ONG Asian Americans Advancing Justice, de Atlanta. "A violência contra as comunidades asiáticas passou despercebida por muitos anos."
Long, autor confesso, foi acusado de homicídio após ser preso. A polícia diz que ele nega qualquer motivo racista e se apresenta como um "viciado em sexo" ansioso para acabar com "uma tentação". A justificativa aceita pelos investigadores, segundo líderes das comunidades asiáticas, apenas reforça a sensação de abandono.
Os ativistas culpam, em parte, o ex-presidente Donald Trump, que repetidamente se referiu ao coronavírus, registrado pela primeira vez na cidade chinesa de Wuhan, como o "vírus da China". "É assustador", disse Sam, chinês de 20 anos, que não quis revelar seu nome completo, em Atlanta, onde trabalha em uma lanchonete.
Para Sarah Park, presidente da Coalizão Coreano-Americana Metro Atlanta, o racismo envolvido nos ataques é evidente. "Sim, é um crime de ódio contra os americanos de origem asiática", disse Park, criticando a relutância das autoridades em processar a violência. "Temos o direito de proteger nossa comunidade e eles seriam protegidos se todos fizessem sua parte."
"Não somos realmente americanos. Somos perpetuamente estrangeiros. E essa ideia se aplica às mulheres como sendo excessivamente sexualizadas", disse Helen Kim Ho, uma coreana-americana e fundadora do grupo Asian Americans Advancing Justice, de Atlanta. "Tudo isso deve ter acontecido na própria mente deste homem. Além da noção tácita de que os asiáticos são alvos fáceis."
O massacre de oito pessoas na Geórgia fez o presidente dos EUA, Joe Biden, marcar uma reunião hoje em Atlanta com líderes e legisladores estaduais da comunidade asiática. Ele se disse preocupado com o recente aumento da violência contra asiáticos no país. "Sei que os americanos de origem asiática estão preocupados", afirmou. "Neste exato momento, muitos deles – nossos compatriotas – estão na linha de frente da pandemia, tentando salvar vidas, e ainda são forçados a viver com medo por suas vidas andando pelas ruas dos EUA. É errado, não é americano e deve parar."
Para as mulheres, o momento é ameaçador. Assim que Crystal Jin-kim soube do ataque, ela pediu aos pais, que vieram da Coreia, que tomassem cuidado. "Desde criança, ouço insultos raciais dirigidos a mim ou aos meus pais. Testemunhei meus pais serem tratados como estúpidos porque o inglês deles não é perfeito", disse Kim.
Mais de 68% dos casos documentados de assédio e violência contra asiáticos desde o início da pandemia foram contra mulheres. Jane Kim Coloseus ficou furiosa quando a polícia de Atlanta declarou que era cedo para dizer se o massacre tinha motivação racial. "Como mulher asiática, isso traz à tona experiências de assédio que vivenciamos, e isso foi invalidado pelo que o atirador disse", afirmou Coloseus, diretora da ONG Her Term, que recruta mulheres para concorrer a cargos públicos na Geórgia.
Há muito ela sente que precisa ser mais cautelosa no trabalho e nas ruas, em razão do racismo e da sexualização das mulheres asiáticas. "Os asiáticos há muito fazem parte da estrutura dos EUA, mas foram mantidos à margem como minoria-modelo e suas vozes foram ignoradas. Para mim, a equação é direta", disse, sobre a intenção do atirador. "Foi racismo." (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>