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CRÔNICA DA CIDADE – O velho chafariz faz o que pode

   A vida era diferente quando o chafariz da praça Getúlio Vargas foi inaugurado, no início dos anos 1950. O espetáculo da fonte luminosa, com as luzes coloridas e a coreografia das águas, atraia moradores encantados. A própria praça, seus jardins e o coreto, estavam recém construídos. O conjunto, incluindo o chafariz, era o habitual para cidades do interior, embora estejamos encostados à Capital. Para a população, pelo que se sabe, isso não tinha a menor importância.

    Na última sexta-feira, meio de tarde, o chafariz tinha uma atração de outro tipo: a obstinação de dois homens em vencer a sujeira que turvava a água. Evanildo Otacílio de Queiroz, e um colega, haviam esgotado quase inteiramente a lâmina d’água. Restara um líquido de cor muito feia, amarelada.

   Evanildo é supervisor no setor de Parques e Jardins da Prefeitura. Bem ao lado do chafariz há um coqueiro, com um esplêndido cacho do fruto. O supervisor olhava para ele. “Vai cair uma tonelada de coco aqui na água e sujar tudo” – dizia, humorado.

   Mas a involuntária intervenção da natureza é o menor dos problemas. O que pesa é a ação de pessoas que levam lâmpadas, fio, peças dos bicos de água. E de moradores de rua que “lavam cobertor, fazem xixi e tomam banho”.

   O supervisor diz que eles entram na água sem pensar que, se houver um fio descascado, podem levar um choque. Também não se preocupam com contaminação. “Vi um homem chegar aqui com um copo e tomar a água, e ela estava bem ruim”.

   Retirada toda a água suja, limpados os azulejos, começará o enchimento do chafariz. Água limpinha. Este momento, diz Evanildo, é aproveitado pelos moradores de rua, que, afinal, também sabem o que é melhor.

   Há 23 anos na Prefeitura, Evanildo não desanima. “Vou levando meu trabalho com muita honra de ser servidor público. O chafariz é de nós todos.”

   No começo da noite, ontem, o equipamento estava em seu momento de fonte luminosa. Um tanto alquebrada, é verdade. Os três jatos funcionavam, pouco, bem espaçadamente. Só um deles colorido, pelo vermelho de um holofote. Mas nenhum dos jatos laterais, vibrantes e de que grande efeito, se fazia presente.

   Se quisesse ver o chafariz, bastaria a Antonio de Souza sair à porta da papelaria Maxmídia, na praça, onde está há dezoito anos. Mas não vê por que fazer isso. Quando chegou à cidade, em 1971, assistir ao espetáculo do chafariz era um programa de sábados e domingos. “A praça ficava movimentada, vinha muita gente.”

    O passar dos anos trouxe a decadência. Em 2007, uma reforma recuperou o esplendor do chafariz e trouxe os moradores de volta à praça. Mas durou pouco, diz Antonio. “Funcionou bem durante uns seis meses, depois ficou precário, começou a falhar.” A situação só piorou. “Aos poucos foi abandonado, com longos períodos parado.”  

   Hoje, “mantém um ar de abandono”, o que aborrece Antonio. “Seria bom se tudo estivesse 100% organizado e conservado. É a praça principal da cidade, o cartão postal.”

   Sentado em um banco da praça, à espera de um amigo, o estagiário de química Lucas Gonçalves, 24 anos, olha para o chafariz, desolado. “Está sempre desse jeito, ou sem funcionar, que é o que mais acontece.”

    Apesar de tudo, na praça de iluminação antiga, as luzes fugazes do chafariz são um alento.
 

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