Dois meses após as delações da JBS virem à tona, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu o terceiro inquérito para apurar irregularidades envolvendo o frigorífico controlado pelos irmãos Joesley e Wesley Batista. Dessa vez, o órgão regulador do mercado de capitais vai aprofundar as apurações sobre a atuação da Eldorado Brasil Celulose e da Seara Alimentos em negociações com contratos de derivativos cambiais em maio, quando foi divulgada a colaboração premiada dos sócios e executivos. Ambas as empresas são da J&F, holding que controla a JBS.
A apuração começou em um processo aberto em 13 de junho na Superintendência de Relações com o Mercado, área técnica que monitora operações de agentes do mercado em mercados de bolsa e balcão. As duas empresas tiveram forte movimentação em operações cambiais no período, apurou o Broadcast. Na prática, isso quer dizer que há suspeitas de que tenham operado com base em informações privilegiadas sobre a delação iminente.
Desde 18 de maio já são 13 procedimentos entre inquéritos e processos administrativos abertos por iniciativa da autarquia envolvendo a JBS e outras empresas do grupo. Nessa lista há mais dois inquéritos administrativos que investigam operações da JBS no mercado de dólar futuro e da FB Participações, controladora da JBS, às vésperas da delação. A suspeita é que os negócios tenham sido realizados com uso de informação privilegiada, já que os controladores do grupo sabiam que a divulgação da delação mexeria com as cotações das ações e do câmbio.
A CVM informou em comunicado divulgado nesta quarta-feira, 19, que anexou o processo que analisa o programa de recompra de ações da JBS ao inquérito que apura se houve “insider trading” na negociação de papéis da empresa pela FB. Anunciado em 10 de fevereiro, o programa previa que a companhia compraria até 10% dos papéis em circulação no mercado, o que movimentaria R$ 1,8 bilhão em valores da época. O Broadcast apurou que também pode haver um desdobramento societário, com a análise da regularidade da aquisição de ações pertencentes ao controlador da JBS dentro desse tipo de programa.
Houve ainda uma movimentação no primeiro processo administrativo aberto em função da crise da JBS. Nele, a CVM busca esclarecimentos adicionais relativos às notícias e especulações envolvendo as delações. A tramitação interna mostra que o caso foi encaminhado à Gerência de Acompanhamento de Empresas – 4, geralmente responsável pela formulação de acusações. Isso indica que pode haver um processo sancionador por conta da não divulgação de Fato Relevante ao mercado sobre informações da delação que acabaram vazando.
Há ainda processos tratando da comunicação pela CVM de indícios de eventual prática do crime de insider trading ao Ministério Público Federal, análise da atuação do Banco Original S.A., controlado pela J&F Participações, no mercado de derivativos e outro que investiga notícias sobre eventual influência da JBS no conselho de administração da BRF. Um dos processos tem por objetivo checar a veracidade da divulgação dos controladores diretos e indiretos da Blessed Holdings, sociedade estrangeira sediada em Delaware (EUA) que faz parte do grupo de controle da JBS, a partir de notícias veiculadas na mídia.
A conduta de administradores e acionistas controladores da JBS à luz dos deveres fiduciários previstos na Lei das S.A. também está na mira da CVM. O órgão regulador do mercado de capitais quer saber se houve irregularidades diante dos fatos que ensejaram a celebração de acordo de colaboração premiada entre executivos da companhia e da sua controladora e o Ministério Público Federal (MPF). Há ainda apuração que questiona a veracidade de notícia divulgada a respeito do uso de aeronave da companhia por Joesley Batista.
Além disso, a CVM dá andamento a um par de processos de fiscalização externa com o objetivo de inspecionar o trabalho da BDO RCS Auditores Independentes e da KPMG Auditores Independentes, empresas que auditaram demonstrações financeiras da JBS entre 2009 e 2016.
Nos dois meses que se seguiram à delação em que o empresário Joesley Batista citou o presidente Michel Temer, dando início a uma nova crise política, investidores também procuraram a xerife do mercado com reclamações relativas à companhia. A Associação dos Investidores Minoritários (Aidmin) recorreu à CVM para ter acesso à lista de acionistas e número de ações de cada um deles na JBS. Os dados foram requeridos à companhia em 26 de maio, mas não houve resposta. Os minoritários pretendem reunir o maior número possível de acionistas para entrar com uma ação de ressarcimento contra os irmãos Joesley e Wesley Batista, controladores da companhia, e outros administradores que participaram de delação premiada.