A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) aplicou penas de inabilitação temporária a um grupo de sete administradores e membros do conselho fiscal da fabricante de armas de fogo Forjas Taurus, atual Taurus Armas, por participarem de fraude na venda de sua controlada SM Metalurgia (SML) à Renill Participações, em 2012. A SML reunia os ativos do grupo no segmento de máquinas e foi vendida após enfrentar dificuldades financeiras.
As ações da Taurus Armas se destacaram na bolsa esta semana, em alta após a empresa assinar acordo definitivo com a siderúrgica Jindal Group – maior fabricante de aço da Índia e uma das maiores do mundo – para a criação de uma joint venture que permitirá a fabricação e comercialização de armas na Índia.
No julgamento da terça-feira, 28, o ex-diretores de finanças e administrativo, Felipe Saibro e Gilmar Rabaioli, foram condenados por unanimidade à inabilitação temporária de dez anos para o exercício do cargo de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta, por envolvimento na omissão fraudulenta das reais condições da operação.
O presidente da CVM, Marcelo Barbosa, se declarou impedido de participar do julgamento.
Já Dennis Braz Gonçalves (ex-presidente), Jorge Velloso (diretor vice-presidente sênior), Edair Deconto (diretor de auditoria), Amoreti Gibbon (conselheiro fiscal) e Marcelo Saweryn (conselheiro fiscal) receberam a mesma pena, mas pelo período de oito anos. Gibbon é o único que permanece na Taurus, ainda no conselho fiscal.
Além do grupo acusado de participação ativa na fraude, a diretora de relações com investidores, Doris França, foi multada em R$75 mil, por aprovar as demonstrações financeiras que registraram a operação, mesmo com falhas. Os condenados podem recorrer ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, o Conselhinho.
Em 2013, ano seguinte à operação de venda da SML, foram descobertos contratos de prestação de serviço pela Renill à Taurus omitidos dos conselhos de administração, fiscal e do auditor independente, que aprovaram a operação.
Um Comitê Especial Independente indicou que os serviços não foram prestados e que o objetivo dos contratos era "prover recursos para que a Renill pudesse pagar as duas primeiras parcelas do contrato (de compra da SML) sem efetivo desembolso".
A auditoria independente Ernest Young apurou que os contratos não declarados indicavam que o valor pactuado para a venda da SML era bem menor do que o registrado nos livros da companhia. Ainda segundo a EY, os eventos que levaram à redução do valor original da venda já estavam presentes na data da operação e a perda deveria ter sido reconhecida em 30 de junho de 2012.
Diante das suspeitas, a companhia contratou uma investigação externa da Control Risk, que vasculhou 577 e-mails. A consultoria concluiu ser clara a liderança do diretor Rabaioli nas negociações, inclusive formulando a proposta a ser enviada à Taurus.
Também apontou como envolvidos os diretores Saibro, Deconto e Gonçalves, copiados na grande maioria dos e-mails sobre a venda da TMFL. A empresa apurou que esses executivos, além de Saweryn e Gibbon, tinham pleno conhecimento dos termos e condições da transação, assim como da real situação de solvência da Renill.
Com base nos relatórios do comitê, da EY e da Control Risks a acusação da CVM concluiu que certos diretores e conselheiros fiscais da Taurus engendraram um esquema com representantes da Renill para que a venda da SML fosse formalmente contratada a um valor artificialmente inflado, muito embora o valor efetivamente acordado para fosse substancialmente menor. Os documentos não divulgados revelavam que a segunda parcela do preço de venda (R$ 51,3 milhões) não seria paga.
Por conta da fraude, as demonstrações financeiras da Taurus acabaram tendo que ser reapresentadas em 2014. O patrimônio líquido individual e consolidado da Taurus em 31 de dezembro de 2012 acabou reduzido em 44,09%, para R$201,8 milhões, e o resultado do exercício saiu de um lucro líquido para prejuízo de R$117,2 milhões. Os ajustes decorreram da alteração no preço de venda da SML, originalmente contabilizado por R$115,35 milhões e reduzido para R$ 57,52 milhões.
"O caso em análise envolve um grave episódio de fraude. Eventos dessa natureza têm o potencial de minar a confiança do público investidor na higidez de nosso mercado, desestimulando o investimento da poupança popular no mercado de capitais e, consequentemente, no financiamento direto da inovação e da atividade produtiva. Por esse motivo, a CVM precisa atuar de forma célere e incisiva em casos de fraude", disse em seu voto o relator do caso, diretor Gustavo Gonzalez.
O relator absolveu outros ex-membros do conselho de administração e fiscal acusados de atuar com falta de diligência na análise da situação de crédito da Renill e das demonstrações financeiras. Para Gonzalez, os conselheiros de administração analisaram a situação, mas decidiram correr riscos, assinalando esse ponto. "Em decisões negociais, a CVM somente pode rever o procedimento que levou à decisão e não questionar se a decisão tomada era de fato a melhor. O fato de o risco ter se concretizado não altera a conclusão", explicou.
Até o fechamento deste texto, a reportagem não havia obtido o posicionamento dos citados.