Executivos do grupo J. Malucelli, em delações premiadas assinadas com o Ministério Público do Paraná (MP-PR), dizem que pagaram cerca de R$ 315 mil ao empresário Jorge Theodócio Atherino, apontado como operador de propina do ex-governador Beto Richa (PSDB). Segundo o relato, Atherino recebeu em maio de 2014 uma mochila com dinheiro vivo para retribuir a renovação de um contrato do programa estadual Patrulhas do Campo, no qual o governo contrata equipamentos e serviços para a manutenção de estradas rurais.
Richa é réu por corrupção passiva e fraude a licitação em uma ação penal no âmbito da Operação Rádio Patrulha, que investigou irregularidades no programa, outras 12 pessoas. O ex-governador não foi mencionado nas delações, mas os executivos da J. Malucelli dizem que discutiram pagamentos do programa com seu irmão e ex-secretário de Logística e Transportes, José Richa Filho, com o então diretor da pasta, Aldair Petry, e com o então chefe de gabinete do governador, Luiz Cláudio da Luz.
Petry e José Richa Filho também são réus na mesma ação com o governador desde 2018. As delações premiadas foram fechadas pelo dono do grupo, Joel Malucelli, seu sobrinho e diretor comercial Rafael Malucelli, e a diretora financeira Georgete Soares Bender.
Nas delações, eles contam que o dinheiro foi entregue por Georgete a Atherino. Ela admitiu, em seu depoimento, ter reunido os R$ 315 mil a partir de saques em caixas bancários e de vendas de equipamentos que haviam sido pagas em espécie.
Joel Malucelli relata ter ido em dezembro de 2011 a uma reunião de representantes de três empresas com Petry para discutir o programa Patrulhas do Campo. Ao saber que havia uma proposta de pagamento de propina de 8% sobre o valor dos contratos pelas empresas que ganhassem os certames, Malucelli conta que sugeriu dividir o pagamento, com um repasse mensal de 4% das faturas mensais, e outros 4% no ato da renovação dos contratos com o governo.
Poucos dias antes da entrega e abertura das propostas, em março de 2012, Joel e Rafael Malucelli dizem ter recebido um representante da empresa Terra Brasil, que não tinha participado das reuniões com os representantes do governo. O representante da Terra Brasil, que não é identificado no depoimento, teria dito que disputaria normalmente a licitação e que "teria compromissos com pessoas da Assembleia Legislativa". O depoimento não detalha quais seriam esses compromissos, pois os executivos que não perguntaram sobre o assunto.
A J. Malucelli esperava vencer a licitação no lote 3 do programa, pois tinha interesse comercial em um ponto de vendas na cidade de Cascavel. A empresa, no entanto, perdeu a disputa do lote para a Terra Brasil. A delação narra que o departamento jurídico da J. Malucelli chegou a elaborar um recurso para tentar desclassificar os concorrentes no lote 3, mas a empresa desistiu após abrir uma negociação com a Ouro Verde, empresa que havia ganhado a licitação de outro lote.
A empresa fechou um contrato de locação de quatro patrulhas à empresa Ouro Verde, para atender um lote do programa estadual. O contrato de aluguel firmado entre as duas empresas levava em conta "valor apresentado pela Ouro Verde na licitação, deduzidos impostos e os 4% referentes ao acordo ilícito de repasse de verbas firmado com os representantes do governo paranaense", diz a delação de Joel. Ademais, em caso de renovação do contrato entre DER-PR (Departamento de Estradas e rodagem do Paraná) e Ouro Verde, seria descontado pela J.Malucelli Rental o saldo de 4% sobre o valor faturado."
Rafael conta que, desde o começo do contrato com a Ouro Verde, a J. Malucelli teve problemas de recebimento dos valores de locação. Por causa disso, os representantes do grupo solicitaram uma reunião com o então secretário de Infraestrutura e Logística, Pepe Richa, irmão do ex-governador. Rafael diz ter conversado com o secretário e solicitado uma comprovação de que o governo estava pagando a Ouro Verde.
Pepe Richa teria orientado os Malucelli a conversar com o chefe de gabinete do governador, Luiz Cláudio da Luz, que por sua vez teria providenciado uma planilha com a comprovação dos pagamentos.
Ele conta que, em seguida, o executivo da Ouro Verde expulsou Atherino da empresa aos gritos, e teria dito: se o secretário quisesse dinheiro, que fosse pessoalmente ao escritório da Ouro Verde pedir.
As patrulhas da Ouro Verde teriam ficado paradas, sem ordens de serviço e sem faturamento, de fevereiro a abril de 2014. O contrato foi renovado em maio daquele ano, ocasião que teria desencadeado a obrigação de pagamento dos R$ 315 mil entregues a Atherino, segundo a delação. Eles contam que o pai de Rafael, Juarez Malucelli, presenciou a entrega do dinheiro, realizada na sede da empresa.
Atherino já foi condenado por corrupção em janeiro de 2020 na 23ª Vara Federal de Curitiba, no âmbito da Operação Piloto, que denunciou pagamento de propina pela Odebrecht referente a um contrato de R$ 7,2 bilhões para exploração e duplicação da PR-323, entre os municípios de Francisco Alves e Maringá. Além dele, também foi condenado nessa ação Deonilson Roldo, que também exerceu o cargo de chefe de gabinete de Beto Richa.
<b>Defesas</b>
"A defesa do ex-governador Carlos Alberto Richa segue acreditando na justiça. O processo apenas vêm demonstrando a inocência, sendo a versão dos delatores isolada de qualquer prova, o que demonstra a intenção, única, de receber benefícios da justiça para não esclarecer a verdade".
A reportagem entrou em contato com a defesa do ex-secretário Pepe Richa, mas não obteve resposta até a publicação desta matéria. Da mesma forma, busca contato com a defesa de Jorge Atherino. O espaço está aberto para manifestações de defesa.