São 350 jogos como torcedor visitante, ou forasteiro, como prefere Rodrigo Barneschi. São 79 estádios, 49 cidades e 10 países visitados nessa condição e é uma parte dessa extensa experiência que o leitor encontra em Forasteiros – Crônicas, Vivências e Reflexões de um Torcedor Visitante. Inspirado por Nick Hornby, Eduardo Galeano e Bill Buford, o livro lançado pela editora Grande Área mostra o futebol pela percepção do torcedor que ocupa o espaço de visitante para apoiar o time do coração, apesar das dificuldades e do improvável, muitas vezes, sucesso da equipe.
Barneschi conta ter escrito Forasteiros entre abril e dezembro do ano passado, exceção feita ao capítulo em que conta sobre a última final da Libertadores, elaborado após o bicampeonato do Palmeiras. Sim, Barneschi é palmeirense, mas não, o livro não é para torcedores alviverdes apenas. É uma escrita que certamente agrada a todos que já levaram a sério uma partida de futebol no estádio – levar a sério significa saber que o seu grito na arquibancada vai fazer a diferença entre o triunfo e o fracasso, para escolher apenas uma definição. Mas é também um livro que pode ser lido por aqueles que não têm afinidade – ou afinidade nenhuma – com o esporte. Ou com a arquibancada.
Afinal, em uma das passagens mais saborosas, Barneschi conta como a torcida corintiana preparou uma pequena surpresa aos palmeirenses em um clássico entre Corinthians e Palmeiras, em 2011, no estádio do Pacaembu. Eis o trecho: "O que se tem, a seguir, é uma ladeira íngreme e sinuosa, até desembocar no isolado setor visitante. A recepção no declive derradeiro costuma variar (adesivos grudados em postes e pichações nos muros são recorrentes), mas a daquela tarde é caprichada: óleo diesel despejado nos paralelepípedos durante a madrugada transforma os últimos metros em um teste final de resistência. Mas, dado que os andarilhos esperam ser mal recebidos, os escorregões atestam que tudo vai bem com a rivalidade. Óleo diesel na ladeira: por que não pensamos nisso antes?".
Há outras passagens deliciosas, como a narrativa, quase minuto a minuto, da ida para acompanhar o time do coração no Uruguai, as visitas a um sem-número de estádios na Argentina, quando o autor é confundido com um policial por torcedores locais. E passagens sentimentais, por assim dizer. É nelas que Barneschi conta por que nunca mais acompanhou os jogos como visitante viajando nos ônibus alugados pela torcida organizada Mancha Verde, à qual é filiado até hoje apesar das "divergências e discordâncias em relação a muita coisa que acontece dentro da organizada". Ou quando relata a experiência do último título palmeirense em São Januário, na companhia do primeiro filho. "Já me habituei a olhares arregalados de pessoas do meu círculo de amizade ao saberem que eu faço parte de uma organizada: Mas você é da Mancha?. O tom assustado é revelador da imagem das torcidas perante a opinião pública, mas eu sempre faço questão de colocar o outro lado: as torcidas têm uma função social importantíssima, em especial para os jovens da periferia e, como qualquer organização da sociedade civil, reúnem todo tipo de gente", diz Barneschi, diretor de BI e do Innovation Hub de uma agência de relações públicas e comunicações.
Sim, o autor tem um lado e não o esconde. Mas isso não é importante. Ao se inspirar em Galeano, Hornby e Buford, Barneschi abre caminho para uma crônica difícil de encontrar no Brasil, mas muito presente na América Latina. A crônica futebolística. "Galeano sempre foi uma das vozes mais importantes do nosso continente e Futebol ao Sol e à Sombra é o que de melhor ele escreveu especificamente sobre futebol", analisa. Sobre Hornby e seu Febre de Bola, Rodrigo avalia ser o autor inglês capaz "de dialogar com o sentimento de qualquer torcedor em qualquer parte do mundo". Calcado em experiências brasileiras e sul-americanas, Barneschi consegue algo semelhante com seu Forasteiros.
FORASTEIROS
Autor: Rodrigo Barneschi
Editora: Grande Área
(272 págs.,R$ 59,90)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>