Quem tem prazer em ler não precisa esperar muito para ficar diante de algum texto no qual, de algum modo, apareça uma menção a Deus. Neste momento, por exemplo, as livrarias estão vendendo os livros do cientista Richard Dawkins, com sua obsessão pelo assunto. E o livro do jornalista Ricardo Carvalho, “O cardeal e o repórter”, no qual ele reconstitui uma parte da bela atuação de dom Evaristo Arns. Durante a vigência da ditadura militar no Brasil. o arcebispo de São Paulo, movido por sua fé em Deus, corajosamente procurou amparar prisioneiros políticos.
Já pelas bancas de jornal do país, a editora Nova Fronteira distribuiu, numa edição mais barata, “O primeiro homem”, de Albert Camus. A obra foi prefaciada por Manuel da Costa Pinto, para quem a abordagem da temática do absurdo, ligada à falta de sentido para a existência humana, feita por Camus, gira em volta de duas frases. A do absurdo como confrontação do desespero humano profundo com a indiferença secreta das belas paisagens do mundo. E a do absurdo como uma percepção – segundo o próprio Camus – “do homem lançado sobre uma terra cujo esplendor e cuja luz lhe falam sem trégua de um Deus que não existe”.
Até nos jornais, ocupados com a cobertura dos acontecimentos do dia a dia, o tema reaparece com freqüência, e, não somente nas notícias sobre o Papa ou o mundo muçulmano. Também nos textos de seus articulistas. Há poucos dias, o educador Rubem Alves respondeu a uma leitora que indagou se ele acreditava
O cientista, o repórter e o educador se dirigem a pessoas letradas, escolarizadas. Mas, de uma forma menos requintada, Deus aparece de modo avassalador nos textos orais dos pastores evangélicos que invadiram os horários das emissoras de rádio e de televisão, no Brasil.
No entanto, a visão mais sábia de Deus talvez seja aquela, muito antiga, segundo a qual nenhum texto deve ser gerado a respeito deste assunto. Pois, basta emitir qualquer palavra sobre ele, para, com isto, começar a fugir da natureza dele. Deus, portanto, é não-verbalizável, inominável.
Pensava-se, deste modo, antigamente, porque o tema parecia tão grandioso que texto algum poderia abordá-lo satisfatoriamente. Hoje, talvez se deva voltar a pensar deste modo por outro motivo. Porque Deus é um assunto ligado diretamente a intensas angústias humanas. E, quem tem o direito de revolver angústias que não sejam as suas próprias? Angústias perceptíveis no cientista Richard Dawkins, um apóstolo do ateísmo. Há naquilo que ele escreve o mesmo empenho de um pregador cristão. Com a diferença de que enquanto o pregador nos mostra a necessidade dele de nos fazer acreditar na existência de Deus, Richard exibe a sua necessidade de nos atrair para o seu ateísmo. Quem ouve a ambos não pode escapar da desconfiança de que tentam nos convencer para avaliar se aquilo em que acreditam é consistente. Parecem ter lá as suas próprias dúvidas, e, buscar paz interior para si mesmos. Que, evidentemente, não será alcançada. Ainda que convençam a Humanidade inteira.
Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP