Diogo Silva foi um dos grandes nomes do tae kwon do nacional. Em duas edições dos Jogos Olímpicos, em Atenas-2004 e Londres-2012, ele quase voltou para casa com medalha – em ambas, ficou a uma vitória do pódio. Foi campeão no Pan do Rio, em 2007, e teve outros importantes resultados. Além de brilhar no esporte, ele sempre foi protagonista fora dele, por denunciar o racismo no País, as más gestões e a corrupção.
Aos 38 anos, é representante dos atletas na Confederação Brasileira de Taekwondo. E conversou com o Estadão sobre as recentes manifestações de jogadores da NBA, que paralisaram a liga profissional de basquete dos Estados Unidos em protesto contra a violência policial – Jacob Blake, um homem negro, foi baleado com sete disparos pelas costas em Kenosha, no Wisconsin. Depois disso, outras competições esportivas também pararam.
Confira a entrevista:
<b>Como você viu as manifestações nos Estados Unidos paralisando competições esportivas por causa de um ataque policial contra um homem negro?</b>
Não foram as manifestações que paralisaram a NBA, a WNBA, a NFL, entre outros, foram os atletas. A NBA, assim como a NFL, são duas grandes ligas esportivas que têm o negro como protagonista. Os atletas dessas modalidades são organizados, têm sindicato, defendem seus direitos, são unidos e cobram respostas das organizações esportivas e também da sociedade. As pessoas gostam de assistir aos jogos, comer seu amendoim e tomar sua cerveja. Os atletas estão dando uma respostas a essas pessoas: se continuarem nos matando nós vamos ferrar sua diversão, você não terá mais como relaxar; se estiver ruim para nós também estará ruim para você. Nós estamos falando que os negros milionários que enriqueceram pelo esporte resolveram unir forças e desafiar o sistema. O sistema detesta perder dinheiro e quando um jogo é adiado, é isso que acontece, ele perde dinheiro. O dono do time perde, o torcedor perde, o patrocinador perde.
<b>Você acredita que o esporte tem um potencial de levar reflexões importantes para a sociedade?</b>
Nesse momento é o esporte que está enfrentando o racismo de forma pública. Os atletas negros não estão deixando as manifestações e as cobranças serem uma onda, nós transformamos a onda em tsunami e queremos ver tudo embaixo dágua. Não desejamos mais reflexão, queremos ação.
<b>Você já sofreu com discriminação? Como reagiu?</b>
O racismo no Brasil está em tudo. Somos um país que enriqueceu vendendo café e minérios com trabalho escravo. O racismo estrutural não nos emprega, não permite nosso avanço. Somos um país com democracia e economia instável por causa do racismo. A minha defesa é não querer ser aceito, não desejo me mutilar para ter oportunidade de trabalho, não me curvo e não olho para baixo. Busco conhecimento afrocentrado, a Europa não é a fonte de conhecimento universal. Busco ensinar o que aprendi para meus pares, é dessa forma que me defendo do racismo.
<b>O que os atletas brasileiros poderiam fazer para ajudar a melhorar o ambiente esportivo e a sociedade como um todo?</b>
Se cada atleta que sofreu racismo, assim como cada atleta que foi assediada, fizesse um boletim de ocorrência e entrasse na Justiça contra seu agressor, nós provocaríamos um colapso no esporte brasileiro. Obrigaríamos uma mudança de regras e normas. É isto que eu espero dos outros atletas: conhecimento, união e ação.
<b>Você acha que essa postura dos atletas nos Estados Unidos pode provocar mudanças na sociedade no futuro?</b>
O futuro de ontem é hoje e já vejo as mudanças. Tempos atrás chamavam nossa causa de "mimimi". Onde essas pessoas estão agora? Estão apavoradas, perceberam que não vamos recuar. O esporte pode modificar a sociedade, mas é necessário coragem.