Variedades

Dior na terra da rainha

Mais de 71 anos se passaram desde que Christian Dior, ao lado do industrial Marcel Boussac, abriu no número 30 da avenue Montaigne, em Paris, o QG do que seria uma das mais poderosas grifes de luxo mundial: a Dior.

Membro inconteste de uma espécie de santíssima trindade fashion, o criador do New Look e sua maison ganham a partir do próximo sábado, 2 de fevereiro, uma monumental exposição no Victoria & Albert Museum (V&A), em Londres.

Christian Dior: Designer of Dreams (Christian Dior: Desenhista de Sonhos, em tradução livre) fica em cartaz até 14 de julho e é a maior e mais completa mostra já realizada sobre a maison no Reino Unido.

Baseada numa montagem apresentada há dois anos no Museu de Artes Decorativas de Paris, a versão que chega agora à capital inglesa tem 60% de conteúdo inédito, reunindo mais de 500 objetos.

Entre eles estão fotografias, filmes, perfumes, ilustrações, revistas, itens de uso pessoal do fundador da grife e, claro, muitos acessórios e mais de 200 trajes de alta-costura desenhados por monsieur Dior e por seus sucessores. Morto aos 52, menos de 11 anos depois da fundação da marca que eternizaria seu nome, ele foi sucedido por seu braço direito, o argelino Yves Saint Laurent (que ficou por lá entre 1957 e 1960), seguindo pelo francês Marc Bohan (de 1960 a 1989), pelo italiano Gianfranco Ferrè (de 1989 a 1996), pelo britânico John Galliano (de 1996 a 2011), pelo belga Raf Simons (de 2012 a 2015) e, desde 2016, pela italiana Maria Grazia Chiuri, primeira mulher a assumir o comando da maison.

“É um material impactante, que oferece um depoimento muito forte, tanto esteticamente quanto economicamente, da alta-costura, de seu peso criativo, artesanal e industrial”, afirma a consultora de moda Gloria Kalil, que visitou a versão parisiense da mostra.

O visitante da edição britânica tem, assim, uma nova chance de conhecer melhor o superexclusivo universo da couture, apresentado por uma das mais tradicionais e conhecidas maisons do mundo. Comumente confundida com roupa sob medida, a alta-costura se revela no trabalho precioso de criação e execução, que envolve a mão de obra de artesãos especializados dedicados à confecção de chapéus, de bordados e de aplicações de plumas, por exemplo, além, claro, de estilistas geniais (e, muitas vezes, geniosos).

“Dior combinava perspicácia para os negócios e oportunismo comercial com espantoso talento criativo”, avalia a curadora Oriole Cullen. “A exposição mostra como cada diretor artístico manteve-se fiel à visão de Dior, enquanto trazia sua própria sensibilidade criativa garantindo que a casa continuasse na dianteira da moda.”

Cullen dividiu a montagem do V&A em 11 módulos. Eles abarcam a infância do fundador e os primórdios de sua carreira como ilustrador de moda e galerista, passam pelos fundamentos estéticos da maison (história, viagens e jardins), por sua joalheria, perfumaria e produção de acessórios, além dos ateliês e criações da alta-costura.

Destacam-se ainda outros dois segmentos. Um deles: o que se debruça sobre o New Look, a mais célebre criação do estilista, o visual mais romântico e menos sisudo de mulher que marcou o vestir feminino do pós-guerra. “Ele foi genial no que diz respeito a um novo paradigma da moda. Ele resgatou a feminilidade, com a cintura marcada e a saia rodada numa época em que a moda estava muito austera devido às penúrias da Segunda Guerra Mundial”, conta o professor e pesquisador de história da moda João Braga.

Uma outra seção foca no fascínio e na relação de (e da) Dior com o Reino Unido. Ele amava a grandiosidade das casas e jardins britânicos, assim como seus transatlânticos e os ternos dos alfaiates da Savile Row. Chegou a realizar vários desfiles em território britânico e desenhou o suntuoso vestido da foto acima, especialmente para a ocasião do 21º aniversário da princesa Margareth, irmã da rainha Elizabeth II. A peça é uma das joias desse segmento.

Outra conexão entre a história da Dior e a Inglaterra está nos exemplares da alta-costura da era John Galliano, uma das mais celebradas por especialistas, especialmente pela exuberância e força das roupas e das imagens que criava na passarela. “É o que mais representa a maison e esse espírito de criatividade, de audácia e impacto, apesar de num certo sentido ser o oposto da proposta do Christian Dior, que era um conservador”, fala Gloria. “Galliano consegue resgatar uma premissa imaterial da maison que foi o romantismo”, fala João. “Ele fez com que o mundo da moda voltasse a sonhar com aquelas elucubrações incríveis que não eram tão usáveis, mas que trouxeram uma nova clientela”, aponta o pesquisador.

Uma mistura de fantasia e realidade que é bem couture e bem Dior. E que, ao menos aqui, pode ser experimentada por todos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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