Recentes pesquisas indicam que é alto o número de aposentados brasileiros que continuam no mercado de trabalho. Crise financeira, valores de benefícios insuficientes e o alto custo de vida com remédios, plano de saúde e outros são os principais motivos para os idosos continuarem na ativa. Segundo pesquisa realizada pelo SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) Brasil, 42,3% dos brasileiros continuam a trabalhar depois de conseguir a aposentadoria, ou seja, quase metade não abre mão de exercer uma atividade profissional.
E o trabalhador que se aposenta não é obrigado a deixar o mercado de trabalho. Especialistas ressaltam que a pessoa que se aposenta pode continuar com o vínculo de emprego; os direitos trabalhistas são os mesmos dos demais empregados. Já os direitos previdenciários ficam mais restritos.
Antonio Carlos Aguiar, doutor em Direito do Trabalho pela PUC-SP, professor da Fundação Santo André e diretor do Instituto Mundo do Trabalho destaca que o simples fato de se aposentar em nada muda o contrato de trabalho, que continua vigente. “Não é necessário informar ao empregador que você se aposentou. Não existe qualquer reflexo jurídico, ou seja, a aposentadoria não tem qualquer influência junto ao contrato de trabalho. E a reforma trabalhista não alterou em nada essa relação”.
O advogado Vitor Carrara, do escritório Stuchi Advogados, observa que o trabalhador não está obrigado a informar o empregador que se aposentou. “Entretanto, ele deve respeitar os casos específicos em convenções coletivas que pontuam sobre estabilidade pré-aposentadoria e cláusula específica falando sobre a comunicação ao empregador quando se aposentar”, diz
Carrara informa que o empregado só não pode continuar na empresa em caso de aposentadoria por invalidez, “pois esse tipo de benefício é concedido para trabalhadores que não têm condições de continuar trabalhando por causa de lesão ou enfermidade”.
Os especialistas ressaltam que a concessão de aposentadoria por idade ou por tempo de contribuição não resulta em qualquer impedimento legal para continuidade do exercício de atividade remunerada.
Outra exceção é relativa ao trabalhador aposentado com o aproveitamento do tempo especial de serviço – tempo de serviço no qual permaneceu exposto a condições de trabalho que prejudicaram a sua saúde ou integridade física. De acordo com o advogado de Direito do Trabalho Pedro Mahin, do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, este empregado deverá ser afastado das atividades ou operações que que ensejaram a sua aposentadoria especial, sob pena de ter a aposentadoria automaticamente cancelada.
“Ele poderá continuar a trabalhar em outras atividades ou em operações que não causem danos a sua saúde ou a sua integridade física”, afirma.
Mahin alerta que os trabalhadores que forem aposentados por invalidez ou com o aproveitamento do tempo especial de serviço devem comunicar ao empregador sua aposentadoria, “para fins de adoção das medidas necessárias, respectivamente, ao seu afastamento do emprego e à suspensão do seu contrato de trabalho, e de seu afastamento das atividades ou operações nocivas a sua saúde e a sua integridade física”.
Demissão
Os especialistas ressaltam que a empresa não pode dispensar o trabalhador, nem exonerá-lo de cargo que ocupe ou, de função de maior responsabilidade que eventualmente exerça, em virtude apenas de sua aposentadoria.
O professor Antonio Carlos Aguiar explica que o empregador poderá demitir o trabalhador, já que ele pode rescindir o contrato de qualquer funcionário que não tenha estabilidade sem justa causa, desde que pague as verbas rescisórias pertinentes. “Todavia, se a rescisão se der única e exclusivamente em razão da aposentadoria (e houver prova desse fato), isso poderá ser caracterizado como um ato discriminatório, com os desdobramentos pertinentes: indenização por dano moral; reintegração no emprego”.
Pedro Mahin reforça que a empresa que comete este tipo de ato discriminatório está sujeita às penalidades legais. “Entretanto, caso essa prática se concretize, o trabalhador deverá receber a integralidade das verbas rescisórias, como, por exemplo, saldo de salário, aviso prévio indenizado, proporcional ao tempo de serviço, décimo terceiro salário proporcional, férias proporcionais, acrescidas de um terço, e multa de 40% sobre os depósitos do FGTS”, esclarece.
O advogado também pontua que, caso seja alvo de discriminação, o trabalhador poderá optar entre a reintegração no emprego, com o ressarcimento integral de todo o período de afastamento, com juros e correção monetária, e o recebimento, em dobro, da remuneração de todo o período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida de juros legais. “Por fim, o trabalhador terá direito à indenização pelos danos morais sofridos”.
Outro direito do trabalhador aposentado que for demitido é que ele poderá sacar os valores existentes na conta do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Cotribuição para o INSS
Os especialistas afirmam que não incide contribuição previdenciária sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Entretanto, o trabalhador aposentado que permanecer em atividade continua a receber salário, sobre o qual haverá a incidência da contribuição para a Previdência Social (INSS).
Entretanto, alguns aposentados que continuam trabalhando com carteira assinada já estão conseguindo a isenção da contribuição na Justiça. Recente decisão da 2ª Vara do Juizado Especial Federal de Campinas (SP) determinou a suspensão do desconto do contracheque do segurado o valor da contribuição. Além disso, o juiz também determinou que a empresa deixe de recolher a parte patronal.
O advogado responsável pelo caso João Badari, sócio do escritório Aith Badari e Luchin Advogados, afirma que é uma decisão que privilegia o princípio contributivo-retributivo da Previdência Social. “Trata-se de um princípio no qual toda contribuição deve reverter em retribuição. E como o aposentado não terá mais o direito de reverter essa contribuição em seu benefício e nem uma revisão da sua atual aposentadoria, nada mais justo do que não precisar mais contribuir”, defende Badari.
Badari destaca que o juiz Fábio Kaiut Nunes aceitou o pedido em favor do aposentado ao deferir tutela provisória para suspender a cobrança da contribuição. Na decisão, foi determinado ainda que caso o segurado mude de emprego, tanto ele quanto o novo patrão não terão que descontar para o INSS.
O juiz também decidiu que os valores da contribuição previdenciária sejam depositados em conta judicial remunerada a ser aberta pelo empregador a partir da ciência da decisão. Segundo o juiz, devem ser mantidos na conta até o julgamento definitivo da ação.
A decisão é de primeira instância, ou seja, o INSS poderá recorrer. Na sentença, o juiz não determinou que o INSS devolva o que foi cobrado até o momento
O advogado Murilo Aith pontua que “esta decisão é acertada, pois entendo que o aposentado que tenha contribuído após a concessão de sua aposentadoria teria de ter um aproveitamento dessas contribuições para melhorar sua condição de vida. Não é moral exigir que ele seja solidário com o sistema e não lhe dar retorno condizente. Espero que mais decisões como essa se multipliquem por todo o Brasil e que, ao final desta luta, seja reconhecido esse direito. Isso seria reconhecer a dignidade humana reconhecida de quem tanto contribui para o sistema previdenciário”.
Benefícios restritos
O trabalhador aposentado tem acesso restritos aos benefícios do INSS. Segundo o professor da Universidade Federal do Paraná e diretor científico do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Marco Aurélio Serau Junior, mesmo com a obrigação de ter que contribuir normalmente, este empregado perde o direito à maioria dos benefícios garantidos para os trabalhadores não aposentados.
“O aposentado que continua a trabalhar é obrigado a contribuir normalmente com a Previdência Social. Porém, a lei garante ao aposentado que volta a trabalhar apenas o salário-família e a reabilitação profissional. Ele não terá acesso aos benefícios mais vantajosos e importantes, como auxílio-doença e auxílio-acidente, por exemplo”, afirma o professor.
Ou seja, um empregado que já se aposentou e continua suas atividades não receberá nada além de sua aposentadoria caso sofra um acidente de trabalho. “Se o trabalhador adoecer, também não terá direito ao auxílio-doença. Realmente, restam benefícios que não são muito úteis. O salário-família é só para os trabalhadores de baixa renda e normalmente não se aplica ao idoso. E a reabilitação profissional que é quase inexistente no Brasil para o empregado aposentado”, conclui.
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