Marcelo Antunez puxa a orelha do repórter. “Você nem deve se lembrar, mas o (jornal) Estado foi o primeiro a noticiar nosso filme. No lançamento de Até Que a Sorte nos Separe 3, você perguntou o que ia fazer a seguir e eu disse. Um filme sobre a operação Lava-Jato.” Polícia Federal – A Lei É para Todos estreia nesta quarta, 6, precedendo o feriado. Melhor seria dizer – o filme vai tomar de assalto centenas de salas de todo o País. O número ainda está sendo fechado, mas será grande. A produtora Downtown, a distribuidora Paris, todo mundo aposta num megassucesso.
Antunez é prudente. Diretor de comédias, Qualquer Gato Vira-Lata 2, Até Que a Sorte 3 (codireção de Roberto Santucci) e Um Suburbano Sortudo -, ele já ultrapassou com elas, somadas, a marca de 10 milhões de espectadores.
Pelo menos sob um aspecto, Polícia Federal é um óvni na produção brasileira atual. Sendo um filme sobre a má utilização de recursos públicos, Antunez e seu produtor pensaram que não seria ético utilizar as leis de patrocínio. Buscaram investidores privados, e eles aderiram, cobrindo, sem renúncia fiscal, os R$ 16 milhões da produção. Mas exigiram uma cláusula. No País polarizado por acusações de golpismo – e o choque entre “coxinhas” e “petralhas” -, os investidores deram dinheiro mas querem permanecer anônimos.
Isso já gerou polêmica – seriam de “direita”, como o filme. Antunez nega que tenha feito um filme ideológico, mas fez, e colocando na tela o ponto de vista dos federais. Em cena, a repórter engajada pergunta ao delegado Ivan por que ele está querendo destruir o PT? Ele retruca que investiga o que cai na rede. E Antunez: “Sempre votei no PT e até no PC do B. Não estou perseguindo ninguém. A história é boa e tem de ser contada. Quem roubou, tem de pagar”. Num momento de dúvida, o delegado Ivan (Antônio Calloni) pergunta-se a quem servem as investigações que os federais estão fazendo. “Quero crer que ao Brasil”, diz outro delegado.
Ivan é um personagem fictício, embora tenha traços que o aproximam do delegado Igor de Paula. “Os investigadores são sínteses de figuras reais. Essa foi uma solução de roteiro que, ao mesmo tempo, me deu liberdade criativa. O Igor não participou da condução coercitiva do Lula. Foi outro delegado, mas na ficção o Ivan pode.”
As coisas, de qualquer maneira, estão tão imbricadas no imaginário dos atores que, na coletiva de imprensa, Flávia Alessandra chamava de “Érika” sua personagem, e na ficção ela é Beatriz. “A Bia realmente se inspira na delegada Érika Marena, mas tentamos fazer com que ela representasse todas as mulheres que fazem diferença na polícia”, diz Antunez.
Calloni sabe dos riscos que corre – as redes sociais viraram campos de batalha -, mas na coletiva defendeu o filme como proposta para “um debate saudável”. Polícia Federal já nasce com a promessa de ser trilogia. “Um só filme não daria conta de tudo. E a história continua. O segundo vai ser mais sobre a divisão do Brasil, começando com o impeachment da Dilma e terminando com o Congresso que blinda o Temer. O segundo vai agradar mais à esquerda”, avalia o diretor.
Nesse primeiro, a curva dramática evolui para a caçada ao ex-presidente. Começa com referências a “ele” e o nome só aparece aos poucos. Vira uma espécie de confronto entre o juiz Sérgio Moro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É o aspecto mais polêmico do filme. Moro é Marcelo Serrado, mais apático que neutro, parecendo um boneco de cera. “Encontrei o juiz e ele é muito sério, muito reservado. Foi o que tentamos reproduzir”, diz o diretor.
E Lula? Antunez é entusiasmado por seu ator. Conta que Ary Fontoura o surpreendeu. Mas Lula, no filme, é ladino, senão velhaco, o que vale por um parti-pris. “Você acha?” Polícia Federal não quer apenas alimentar o debate. Sua vocação é a bilheteria. Afinal, os investidores não puseram dinheiro a fundo perdido, mas na expectativa de retorno, diz Antunez.