Mundo das Palavras

Ditadura usou o Catolicismo

Coluna do jornalista Oswaldo Coimbra
Após 14 anos de regime ditatorial, implantado no Brasil com o Golpe Militar que derrubou João Goulart da presidência do país, em 1964, a Igreja Católica fez um balanço das falsas preocupações religiosas com as quais os golpistas haviam atraído o apoio da classe média católica, promovendo as famosas “Marchas da Família, com Deus, pela Propriedade”. Num documento intitulado “Repressão na Igreja do Brasil”, a Ditadura foi responsabilizada pelas mortes de seis padres e um seminarista, por ameaças de assassinato a treze religiosos, entre os quais padres e bispo, pelos sequestros a oito membros da Igreja (leigos, padres e bispos), por intimações policiais a outros setenta e cinco de seus membros, pela expulsão de dez padres do Brasil, pelos banimentos de mais dois, pela imposição de censura impiedosa a diversas rádios católicas, assim como  ao jornal “O São Paulo”, da arquidiocese paulistana, e, pela cassação da concessão da Rádio 9 de Julho que pertencia à mesma  arquidiocese.
 
Desmascarava-se, assim, por fim, o uso inescrupuloso do Catolicismo por parte pelos empresários e militares promotores do Golpe Militar, que, em 1964, haviam se apresentado em busca de apoio para a implantação da Ditadura diante da opinião pública brasileira como “salvadores da democracia cristã do Brasil”.
Este apelo à religião fora algo pensado friamente por eles, como mostraram os documentos que o pesquisador Armand Dreifuss localizou nas sedes do IBAD e do IPES. Os dois institutos funcionavam como fachada para o planejamento das ações dos golpistas. Mais tarde, Dreifuss inseriu a parte mais importante da enorme documentação encontrada por ele no seu livro “1964: a conquista do Estado”, não por acaso, publicado pela Editora Vozes, dos frades franciscanos.    
Os documentos revelam que o IPES/IBAD encomendou a Arlindo Correa, especialista em Comunicação de Massa, um estudo que pudesse orientar os empresários e militares golpistas na conquista de opinião pública favorável à derrubada de Jango e na subsequente implantação de um regime de força no Brasil.
 
Em seu estudo, Arlindo sustentou: “A conquista da classe média tem de ser feita através de propaganda que mescle argumentos racionais com argumentos emocionais”. O uso do sentimento religioso da população brasileira entrou na preparação deste segundo tipo de argumentação.
 
O IPES/IBAD passou, então, a fornecer gratuitamente informações e análises políticas a mais de 800 jornais e emissoras de rádio espalhados pelo país. Antes de chegar aos veículos de comunicação, porém, este material era editado pelas equipes de “manipuladores de notícias” coordenadas pelo general Golbery do Couto e Silva, especialista em guerra psicológica. Com o material, os golpistas provocaram pânico na população. Pois nele associaram de modo arbitrário e incoerente ideias relacionadas a Jango, ao Partido Comunista, a Cuba, às entidades estudantis, aos sindicatos, à reforma agrária, à corrupção política, à ineficiência administrativa, entre outros temas, numa completa miscelânea.
 
Nela, “a igreja das pregações sociais era mostrada como se fosse formada por apóstatas, portanto, a classe média deveria se mobilizar para defender o seu Cristianismo ameaçado”, afirma o líder leigo católico Paulo de Tarso Santos, em seu livro “1964 e outros anos”. Como tantos outros membros da sua igreja, Paulo também foi preso e obrigado a se exilar no Chile, depois do Golpe Militar. Ministro de Educação de Jango, mais tarde, ele serviria ao Governo Montoro como secretário de Educação de São Paulo.

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