Depois da queda de 3,52% na semana passada, o dólar até ensaiou um movimento de alta nas primeiras horas de negócios espelhando cautela com os problemas locais, mas acabou perdendo fôlego ainda pela manhã e, após oscilar entre margens estreitas ao longo da tarde, encerrou a sessão com leve recuo, abaixo de R$ 5,19.
Segundo operadores, ajustes técnicos no mercado de câmbio, com agentes se preparando para a formação da Ptax de agosto na terça-feira, fluxos de exportadores e o ambiente externo favorável a divisas emergentes jogaram o dólar para baixo por aqui, apesar das preocupações em torno do ambiente político-institucional e das contas públicas.
Lá fora, o DXY – que mede o desempenho da moeda americana em relação a seis divisas fortes – operou entre estabilidade e ligeira queda ao longo da tarde, na casa de 92,600 pontos. O dólar perdia mais de 0,30% em relação ao peso mexicano e ao rand sul-africano, considerados pares do real.
Ainda ecoa no mercado o tom ameno do discurso de sexta-feira do presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), Jerome Powell. Embora tenha sinalizado o início da redução do volume mensal de bônus neste ano, Powell afirmou não há ligação direta entre o tapering e o processo de alta de juros.
Por aqui, após rodar entre mínima R$ 5,1826 e máxima a R$ 5,2266, o dólar à vista encerrou a sessão desta segunda-feira a R$ 5,1893, baixa de 0,12%. No acumulado de agosto, a moeda norte-americana acumula desvalorização de 0,40%. Na B3, o dólar futuro para setembro apresentava giro reduzido, na casa de US$ 11 bilhões, refletindo o apetite reduzido por negócios.
O real poderia até ter se fortalecido de forma mais acentuada não fosse o clima de cautela com o Orçamento de 2022 (o prazo final para o Executivo enviar a lei ao Congresso é a terça-feira, 31), em meio à busca de soluções para compatibilizar o pagamento de precatórios e o Auxílio Brasil (ex-Bolsa Família) como respeito ao teto de gastos.
Não por acaso, operadores atribuíram parte da alta da moeda norte-americana no início do dia às tensões fiscais e política, na esteira do anúncio de que Banco do Brasil e Caixa estavam deixando a Febraban, por discordarem de teor de comunicado assinado pela entidade que supostamente traria críticas ao governo Jair Bolsonaro. Também se comentava sobre a apreensão com uma escalada retórica do presidente na semana que antecede os protestos de 7 de setembro.
Ao longo da tarde, o resultado melhor do que o esperado das contas do Governo Central em julho (déficit de R$ 19,829 bilhões, abaixo da mediada de Projeções Broadcast, de R$ 25,750 bilhões) e nota de esclarecimento da Febraban teriam contribuído para desanuviar o ambiente. Na nota, a entidade afirma que o texto "A Praça é dos Três Poderes", articulado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e "elaborado por representantes de diversos setores, inclusive o financeiro", buscava harmonia e não atacar o governo ou fazer oposição à política econômica.
Mais cedo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), haviam dado declarações a favor de uma solução negociada com o Judiciário para os precatórios (no lugar da PEC enviada pelo Executivo) e reforçado o compromisso com o teto de gastos. Pacheco e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) devem se reunir na terça com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, para discutir o tema.
Para o head de mesa específica para câmbio e operações PJ, da Wise Investimentos, Gustavo Gomiero, a notícia do encontro entre Pacheco, Lira e Fux contribuiu para a perda de fôlego do dólar. "Se conseguir uma solução para adiar os pagamentos para o ano que vem, vai dar um alívio fiscal", afirma Gomiero, que vê um cenário propício para apreciação do real e afirma que o "dólar já estaria abaixo de R$ 5" não fossem as tensões políticas locais.
Na avaliação economista chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, os problemas fiscais e políticos continuam a prejudicar o desempenho do real, a despeito da percepção de fluxo de recursos de investidores estrangeiros, provavelmente para a renda fixa.
"Ainda tem essa equação a ser resolvida em torno de Auxílio Brasil, Precatórios e reforma do Imposto de Renda com a LOA (Lei Orçamentária Anual), que deve ser apresentada amanhã. Isso acaba atrapalhando a formação da taxa de câmbio", afirma Camila Abdelmalack, acrescentando que, como na terça tem formação da Ptax de agosto, o mercado já carrega um componente mais técnico, com movimento de exportadores no pré-fechamento do mês.