Uma recuperação dos ativos de risco no exterior, com alta das Bolsas em Nova York e queda global da moeda americana, abriu espaço para que o dólar recuasse na sessão desta sexta-feira, 15, no mercado doméstico de câmbio. Afora uma alta leve e pontual pela manhã, a divisa operou em baixa ao longo de todo dia, registrando mínima a R$ 5,3756, no início da tarde. No fim da sessão, a moeda recuava 0,52%, cotada a R$ 5,4049. Apesar do refresco hoje, o dólar termina a semana com ganhos de 2,60%, o que leva a valorização acumulada no mês a 3,25%.
O alívio nos mercado hoje veio na esteira de redução, ainda que modesta, das expectativas de inflação nos EUA e da melhora do sentimento do consumidor americano. Trata-se de uma combinação que desautoriza apostas em alta de 100 pontos-base na taxa de juros – que haviam ganhando força após índices inflação ao consumidor (CPI) e ao produtor (PPI) em junho acima do esperado – e mitiga parcialmente os temores de recessão.
Dirigentes do Federal Reserve vieram a campo para pontuar que o ritmo de elevação dos Fed Funds em 75 pontos-base é apropriado e reforçar a tese de "pouso suave" da economia americana. O presidente da Fed de Atlanta, Raphael Bostic, disse hoje que subir os juros "muito dramaticamente" pode minar a tendência positiva da atividade. Maior falcão do BC dos EUA, o dirigente da distrital de St. Louis, James Bullard, disse que os dados de emprego "contrariam totalmente a ideia da recessão". A fala foi temperada com alerta sobre inflação disseminada e, por tabela, necessidade de que a taxa básica atinja uma faixa para 3,75% a 4% até o fim do ano.
No exterior, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes – recuava 0,47% quando o mercado local fechou, mas ainda se mantinha acima dos 108,000 pontos, nos maiores níveis em 20 anos. O dólar também perdeu força em relação a divisas emergentes e de exportadores de commodities, com destaque para as baixas de mais de 7% frente ao peso chileno, após o Banco Central do Chile anunciar um programa de intervenção no câmbio da ordem de US$ 25 bilhões.
O diretor de produtos de câmbio da Venice Investimentos, André Rolha, vê a movimentação dos mercados hoje como um ajuste após a forte rodada de deterioração dos ativos de risco nas sessões anteriores, em meio a índices de inflação "ainda muito salgados" nos EUA. "Houve uma busca forte por segurança. Basta olhar a curva do DXY ao longo da semana, superando os 108 pontos", diz Rolha, ressaltando que as falas de dirigentes do Fed foram "muito importantes" para "dar um norte" aos investidores. "Aqui, o dólar chegou a se aproximar dos R$ 5,50, com as commodities em baixa e a pacote de bondades fora do teto aprovação da PEC dos Benefícios".
Na quarta-feira (13), foi informado que o índice de preços ao consumidor nos EUA subiu 1,3%, acima do esperado (1,1%). O índice de inflação ao produtor, divulgado ontem (14), mostrou alta de 1,1%, também superando as estimativas (0,8%). Essa dobradinha levou as apostas em alta em 100 pontos-base da taxa básica americana – hoje na faixa entre 1,5% e 1,75% ao ano – superarem pontualmente os 80%. A perspectiva de nova alta de 75 pontos-base, que havia voltado a ser majoritária ontem à tarde, foi reforçada hoje.
Pela manhã, leitura preliminar da Universidade de Michigan mostrou que o índice de sentimento do consumidor americano subiu de 50 em junho para 51,1 em julho, enquanto o mercado esperava estabilidade. Já as expectativas para a inflação em 12 meses recuaram levemente, de 5,3% para 5,2%. No horizonte de 5 anos, as estimativas para o aumento de preços caíram de 3,1% para 2,8%. Dados do varejo nos EUA também surpreenderam positivamente ao mostrar alta de 1% em junho (na margem), quando o previsto era 0,9%.
"Os dados de hoje acalmaram um pouco os ânimos. Mas o fato é que nesta semana aumentaram as chances de um cenário recessivo leve nos Estados Unidos já no fim deste ano. Os índices de inflação vieram bem acima do esperado e o Fed vai ter que agir", afirma a economista Bruna Centeno, da Blue 3, lembrando que resultados corporativos de bancos americanos também decepcionaram.
O real também sofre com as dúvidas sobre o fôlego da economia chinesa e, por tabela, dos preços das commodities, diante do vaivém de medidas restritivas para combater a covid-19. Dados divulgados ontem à noite mostraram que a economia chinesa cresceu 0,4% no segundo trimestre (comparação anual), abaixo do esperado (0,9%). Na comparação com o primeiro trimestre, houve contração de 2,6%. Indicadores de vendas no varejo e produção industrial em junho chegaram a dar certo alento ao sugerir uma recuperação da atividade. Problemas no setor imobiliário chinês, contudo, deprimem as cotações do minério de ferro, um dos carros-chefe da pauta de exportação brasileira.