A perspectiva cada vez mais forte de desidratação da PEC da Transição e acenos do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva à agenda de responsabilidade fiscal levaram o dólar a recuar na sessão desta segunda-feira, 21, na contramão da onda de fortalecimento da moeda americana no exterior. Segundo profissionais do mercado, investidores deram continuidade nesta segunda ao movimento de ajustes e realização de lucros iniciado na sexta-feira, aparando excessos cometidos nos pregões anteriores em meio à "reprecificação" da taxa de câmbio à percepção de aumento de risco fiscal.
Tirando uma alta pontual e bem limitada na abertura, a moeda trabalhou em baixa ao longo de toda a sessão, furando o piso de R$ 5,30 pela manhã, quando registrou mínima a R$ 5,2983. No início da tarde, a divisa chegou a ensaiar zerar a queda, tocando o patamar de R$ 5,36, com o Ibovespa nas mínimas do dia. Mas a virada da Bolsa para campo positivo ao longo da segunda etapa de negócios, na esteira da diminuição das perdas do petróleo, jogou a moeda mais para baixo novamente. No fim do dia, o dólar era cotado a R$ 5,3106, em queda de 1,19%, o que reduz a valorização acumulada em novembro para 2,80%.
"O dólar está descolado hoje da alta lá fora em função da possibilidade de a PEC ser menos pior do que se imaginava. Mas é um ajuste pontual, e não uma tendência", afirma o economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho, ressaltando que os ativos domésticos apresentam uma deterioração relevante em novembro. "O dólar passou a oscilar entre R$ 5,30 e R$ 5,40, a Bolsa está rateando e a curva de juros não prevê mais corte da Selic neste ano. O mercado ainda está cauteloso com a espera pelo tamanho da PEC e a definição do ministro da Fazenda".
Surgiram propostas de mudanças e versões paralelas para a PEC da Transição, cujo texto original prevê tirar desembolsos com o Bolsa Família do teto por tempo indeterminado e gastos extrateto de R$ 198 bilhões em 2023. O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), por exemplo, apresentou uma proposta que limita a R$ 70 bilhões o valor que ficaria fora do teto e propõe que um novo arcabouço fiscal seja instituído, por meio de lei complementar, até 17 de junho do ano que vem.
Já proposta do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), obtida com exclusividade pelo Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), eleva em R$ 80 bilhões de forma permanente o limite do teto de gastos a partir de 2023, o que manteria a atual âncora fiscal em vigor. Jereissati batizou o texto de "PEC da Sustentabilidade Social".
Ex-ministro da Fazenda e integrante da equipe de transição na área econômica, o economista Nelson Barbosa disse que, mesmo se o governo aumentar o gasto em R$ 136 bilhões em 2023, não haverá expansão fiscal. "A minha opinião é de que R$ 70 bilhões é pouco para a PEC, porque o orçamento que foi enviado para 2023 tem um gasto em proporção do PIB inferior ao de 2022", disse.
No exterior, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis moedas fortes – trabalhou em alta firme e chegou a ameaçar o teto dos 108,000 pontos, ao registrar máxima aos 107,933 pontos.
A moeda norte-americana ganhou terreno lá após dirigentes do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA) voltarem a falar duro, acenando com mais altas de juros para controlar a inflação. Na outra ponta da gangorra, as commodities metálicas recuaram diante da notícia da primeira morte por covid-19 na China em seis meses, o que pode levar a nova onda de <i>lockdowns</i> e, por tabela, abalar a demanda global.