O dólar disparou no mercado doméstico de câmbio nesta segunda-feira, 26, ultrapassou o teto de R$ 5,40 nos momentos de mais estresse e fechou no maior nível desde fins de julho, em meio a um ambiente global de liquidação de ativos de risco e busca por proteção na moeda norte-americana. Crescem os temores de que o mundo amargue uma recessão na esteira do aperto monetário nos países desenvolvidos e da crise de energia na Europa em razão de sanções à Rússia, que ameaça escalar a guerra na Ucrânia com uso de armas nucleares.
O caldo entornou ao longo da tarde à medida que investidores assimilavam declarações de dirigentes do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA) e a decisão do Banco da Inglaterra (BoE) de não intervir no mercado de câmbio ou promover alta extraordinária dos juros para conter a queda livre da libra esterlina. Em nota, o BoE disse que "fará uma avaliação completa em sua próxima reunião".
Presidente do Fed de Atlanta, Raphael Bostic afirmou que a reação negativa dos mercados ao plano fiscal no Reino Unido "aumenta a incerteza". Mesmo sem voto nas decisões de política monetária do Fed neste ano, ele engrossou o tom duro adotado recentemente por dirigentes do BC americano e disse que ainda há um "longo caminho" no processo de alta de juros.
Taxas dos Treasuries escalaram, com a T-note de 10 anos, o ativo livre de risco do mundo, superando 3,90% na máxima. O índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes – superou a linha dos 114,000 pontos e registrou máxima 114,527 pontos, com ganhos de mais de 1,5% da moeda americana frente a libra. Na outra ponta da gangorra, as commodities tombaram. O contrato do petróleo tipo Brent para dezembro, referência para a Petrobras, fechou em baixa de 2,55%, a US$ 82,86 o barril.
Por aqui, o dólar emendou sucessivas máximas e chegou a ser negociado pontualmente acima de R$ 5,41, tocando R$ 5,4171 (+3,21%). No fim do dia, a moeda avançava 2,53%, a R$ 5,3814 – maior valor de fechamento desde 22 de julho. Com isso, o dólar passa a apresentar ganhos de 3,46% em setembro, o que reduz a desvalorização acumulada neste ano a 3,49%.
Entre as divisas emergentes, o real foi o que mais apanhou, seguido pelo peso chileno. Operadores e analistas ressaltam que a moeda brasileira vem de um período de desempenho relativo superior a seus pares e que chegou até a se descolar, ao longo da semana passada, da tendência de valorização global do dólar – movimento atribuído à diminuição de risco fiscal após apoio formal do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na corrida presidencial. Havia, portanto, espaço para recomposição de posições defensivas. Embora não tenha havido mudança no quadro eleitoral, analistas dizem que o clima de incertezas às vésperas do pleito aumenta a demanda por proteção no mercado de câmbio.
O economista-chefe da Integral Group, Daniel Miraglia, observa que o tom duro do Federal Reserve, na semana passada, na esteira de uma leitura muito ruim da inflação ao consumidor nos EUA em agosto, deflagrou um novo episódio de aversão ao risco que castiga emergentes. A escalada das taxas dos títulos de longo prazo nos Estados Unidos e na Europa provoca a maior destruição de riqueza nos mercados de renda fixa de países desenvolvidos dos últimos 50 anos e detona um rearranjo global de portfólios, avalia Miraglia.
"Esses episódios de aversão ao risco vêm em ondas. O ambiente deve ser desafiador e volátil talvez até o primeiro trimestre do ano que vem", afirma o economista, que vê o plano do governo do Reino Unido de corte de impostos e aumento de gastos como um dos gatilhos para a degringolada dos últimos dias. "É uma receita que já vimos em mercados emergentes e que não dá certo. Temos também o recrudescimento da guerra na Ucrânia, com ameaça de uso de armas nucleares pela Rússia."